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2.3.1 - A CONSTITUIÇÃO DE POUPANÇA PÚBLICA E O AUMENTO DO ENDIVIDAMENTO INTERNO.

A poupança pública, na década de setenta, foi constituída quase que exclusivamente da poupança externa, principalmente devido à inexistência de um sistema interno de financiamento a longo prazo que proporcionasse fontes alternativas de financiamento.

A tabela 19 mostra como se comportou a poupança pública, a poupança privada e a poupança externa na década de oitenta. Em 79 a poupança pública era de 4,21% do PIB, em 81 diminuiu para 2,74%, em 83 (momento em que se deu a ruptura dos créditos voluntários) a poupança pública passou para 1,28% do PIB, em 87 passou para -0,38%, chegando a atingir -5,27% em 89. A poupança externa foi reduzida neste mesmo período, enquanto a poupança privada foi consistente (chegando a aumentar de 14,13% em 79, para 30,37% em 89). Isto mostra que o governo brasileiro se nutriu da poupança privada via emissão de títulos públicos de alta rentabilidade. A tabela 19 também mostra como se deu a diminuição da taxa total de investimento: em 79 era de 22,9% do PIB, diminuindo para 19,5% em 82, em 86 ficou em 18,7% do PIB, diminuindo ainda mais para 17,0% em 88, chegando a 16,7% do PIB em 89.

TABELA 19

Poupança pública, privada, externa e taxa de investimento (% do PIB) 1979-1989

Ano

(s)privada

(s)pública

(s)externa

invest./PIB

1979

14,13

4,21

4,80

22,9

1980

15,15

2,74

5,45

22,9

1981

15,58

3,06

4,44

21,0

1982

13,41

1,89

5,79

19,5

1983

12,03

1,28

3,37

16,9

1984

15,42

0,34

-0,02

16,3

1985

19,07

0,02

0,11

16,4

1986

14,43

2,70

1,97

18,7

1987

22,20

-0,38

0,49

17,9

1988

26,51

-2,42

-1,28

17,0

1989

30,37

-5,27

-0,23

16,7

Fonte: Banco Central.

Notas:(s)privada = poupança do setor privado.

(S) pública = poupança do setor público.

Extraído: REIS VELLOSO, J. P. (Org.). Combate à inflação e reforma fiscal. Rio de Janeiro, 1992. Ed. José Olympio. pp.153.

Última coluna:fonte:IBGE, Conjuntura Econômica, n° 42, set. 1988 & Banco Central - relatório de 1991.

Extraído: OLIVEIRA. A. J. P. O impacto da transferência financeira para o exterior no desequilíbrio fiscal brasileiro: uma análise das políticas fiscais na década de oitenta. Dissertação de mestrado. Fortaleza, 1993. pp.117.

 

Portanto, o Estado sem o apoio financeiro dos credores internacionais, possui quatro maneiras clássicas para reforçar a sua poupança pública, e assim conseguir comprar as divisas dos exportadores e saldar seus compromissos externos.

A primeira maneira clássica é a privatização de empresas estatais deficitárias. Porém o que se observou na década de oitenta foi um processo de privatização pouco eficiente em que o Estado basicamente devolvia para o setor privado as empresas que antes estavam em poder desse setor, além de ser um processo complexo devido ao tamanho das empresas (as empresas estatais eram bastante grandes em relação ao capital privado nacional, tornando-se necessário a fusão de capitais ou até mesmo a participação de capitais internacionais para adquiri-las) e ao corporativismo ( uma forte burocracia funcionalista se opõe à retirada do Estado da economia).

O resultado disso foi que no período compreendido entre 1981 e 1989 as privatizações somaram US$ 720 milhões, sendo mais da metade desse montante adquiridos em 1988.

A segunda maneira para reforçar a poupança pública, é a redução das despesas públicas, principalmente, os encargos financeiros relativos às dívidas interna e externa, pois os encargos não financeiros (despesa com pessoal, encargos sociais, custeio da máquina administrativa, investimento, etc.) são bastante difíceis de diminuir por causa da existência de despesas rígidas. Mas sem a implementação de políticas que possam viabilizar a redução dos encargos financeiros da dívida e a racionalização administrativa, essa redução das despesas se torna muito difícil. De acordo com a tabela 20 observa-se que a despesa com pessoal é sempre ascendente (tendo um pequena queda em 83 e 84), e os encargos financeiros (juros da dívida interna e externa) também não conseguiram ser reduzidos justamente porque a preocupação do governo na década de oitenta foi pagar em dia os juros da dívida externa.

A terceira é o aumento das receitas do governo. Contudo a inexistência de uma política fiscal e tributária de combate à sonegação, e de eliminação de subsídios (com o intuito de ampliar a base tributável), impossibilitou o aumento das receitas do governo. A tabela 20 mostra como o aumento da receita, através da elevação da carga tributária e a diminuição das despesas como maneira de reforçar a poupança pública são muito limitados. Pode ser visto que na década de oitenta a carga tributária ficou entre 22 e 24% do PIB.

A quarta maneira é a emissão de títulos públicos. Essa emissão de títulos permite que o governo reforce a sua poupança capacitando-o a comprar divisas junto aos exportadores afim de saldar os seus compromissos externos.

TABELA 20

Contas do setor público (% PIB) 1980-1989

Ano

carga trib. bruta

Desp. Pess.

Desp. Bens e serv.

juros dív. interna

juros dív. externa

encarg. financ.

1980

24,20

6,20

2,89

1,5

2,0

2,4

1981

24,60

6,50

2,86

1,7

2,3

4,0

1982

26,20

7,30

2,95

2,6

2,7

5,3

1983

24,70

6,50

2,98

2,6

3,3

5,9

1984

21,60

5,60

2,55

3,1

3,6

6,7

1985

22,00

6,80

2,81

3,4

3,5

6,9

1986

24,30

7,00

3,30

2,1

2,6

4,7

1987

22,60

7,70

4,93

1,8

2,3

4,1

1988

22,70*

7,80*

5,10

2,2

2,3

4,5

1989

21,94**

 

 

10,4*

1,9*

12,3*

Fonte: Instituto de Pesquisas Econômicas.

*Estimado.

**Extraído:REIS VELLOSO, J. P. (Org.) - Combate à inflação e reforma fiscal. Rio de Janeiro, 1992. Ed. José Olympio. pp. 44.

-Duas primeiras colunas: OLIVEIRA. A. J. P. O impacto da transferência financeira para o exterior no desequilíbrio fiscal brasileiro: uma análise de políticas fiscais na década de oitenta. Dissertação de mestrado. Fortaleza, 1993. pp.113.

-Terceira coluna: GIAMBIAGI, F. & GOMES, J. C. - Consumo do governo, juros externos e inversão reprimida: o problema da dívida externa revisitado. Revista de Economia Brasileira São Paulo, 1992. Ed. Brasiliense. Vol.12. n°13. pp.37.

-Três últimas colunas: SIMOENS SILVA, L. A. - Endogeneidade da moeda, instabilidade e política monetária. Revista de Economia Brasileira. São Paulo, 1991. Ed. Brasiliense. Vol.11. n°1. pp. 120.

 

Como se pode observar, as três primeiras maneiras clássicas de reforçar a poupança pública não surtiram muito efeito. Por isso o governo foi obrigado a utilizar, em grande escala, a emissão de títulos públicos para ter condições de saldar o serviço da dívida externa.

Para que os títulos públicos tivessem uma boa aceitação junto aos poupadores privados, era necessário que o Estado oferecesse taxas de juros mais vantajosas que as do mercado financeiro privado, dando boa rentabilidade e uma considerável liquidez aos títulos públicos que funcionavam como quase moeda e/ou moeda indexada.

O incentivo à aceitação dos títulos públicos para com os poupadores privados acarretou um aumento considerável da Dívida Mobiliária Federal (DMF). De acordo com a tabela 21, a DMF era de 4,20% do PIB em 1980, passando para 6,60 em 1984, chegando a atingir 14,10% do PIB em 1989.

Esse mecanismo de incentivo à aceitação dos títulos públicos por intermédio do aumento das taxas de juros acima do mercado, provocou uma alta dos custos financeiros das empresas, que por sua vez, provocou um aumento nos preços relativos em geral, ou seja, esse processo vicioso torna-se parâmetro para a taxa de lucro.

TABELA 21

Dívida mobiliária federal (em % do PIB) 1980-1989

Ano

DMF (% PIB)

DMF (Ncz$ bilhões)

1980

4,20

4,09

1981

5,60

7,64

1982

7,60

9,75

1983

6,00

10,14

1984

6,60

11,11

1985

10,40

14,78

1986

9,30

20,15

1987

10,10

16,84

1988

12,10

73,94

1989

14,10

164,01

Fonte: BACEN.

Obs: de 1980-87 (2ª coluna) exclui Letras do Banco Central.

Extraído: OLIVEIRA. A. J. P. O impacto da transferência financeira para o exterior no desequilíbrio fiscal brasileiro: uma análise de políticas fiscais na década de oitenta. Dissertação de mestrado. Fortaleza, 1993. pp.176.

 

Esse processo ficou conhecido como a "ciranda financeira" que tinha o Estado como o grande garantidor do processo de especulação baseado em títulos públicos, ou seja, os empresários financeiros (e não financeiros), iriam cada vez mais realizar seus investimentos na compra de títulos públicos, ou seja, num circuito diferenciado do produtivo.

Com o intuito de evitar a fuga de capitais e também de continuar atraindo investimentos especulativos, o Estado manteve as taxas de juros dos títulos públicos altas e positivas, chegando a compensar folgadamente a aceleração da inflação.

A emissão de títulos gerava um aumento na dívida pública interna que, por sua vez, aumentava a necessidade do Estado em emitir mais títulos para financiar a sua dívida interna, aumentando mais ainda esta dívida interna.

Como pode ser visto na tabela 20 (pp 57), os juros da dívida interna brasileira cresceram assustadoramente na primeira metade da década de oitenta. Em 1981 os juros da dívida interna, com relação ao PIB, eram de 1,7%, passando para 3,1% em 1984, e chegando a 10,4% em 1989. Os juros da dívida externa também se elevaram. Em 1981 esses juros com relação ao PIB eram de 2,0% e passaram para 3,6% em 1984.

Quanto mais aumentavam as dívidas externa e interna, mais se tornava necessário para o Estado emitir títulos para conseguir saldar os seus compromissos.


CONTINUAÇÃO...




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CAPÍTULO 2 - A CRISE DOS ANOS 80

2.1 - Introdução

2.2 - A Crise do Endividamento Externo

2.3 - Transferência de Recursos para o Exterior: A Contituição de Poupança Pública e o Agravamento do Endividamento Externo

2.3.1 - A Constituição de Poupança Pública e o Agravamento do Endividamento Interno

2.4 - Conclusão




| CAPA |
| SUMÁRIO | | RESUMO | | INTRODUÇÃO GERAL | | CAPÍTULO 1 |
| CAPÍTULO 2 | | CAPÍTULO 3 | | CONCLUSÃO GERAL | | BIBLIOGRAFIA |