1.3- O II PND E A SUSTENTAÇÃO DA ESTRATÉGIA DE CRESCIMENTO COM ENDIVIDAMENTO (1974 - 1978).
O período 1974-1978 já começa com algumas crises que afetam a economia mundial e que abalam diretamente a economia brasileira. Esse período foi marcado por fortes desequilíbrios da balança comercial.
Os desequilíbrios da balança comercial foram experimentados por um lado em virtude do menor crescimento das exportações brasileiras, por causa das taxas negativas de crescimento das economias capitalistas desenvolvidas, agravada ainda mais pelas medidas protecionistas realizadas em alguns dos países que eram compradores das exportações brasileiras. E por outro lado, em virtude do aumento considerável das importações, devido basicamente à desproporção inter-setorial e à 1ª crise do petróleo. Na tabela 7 pode-se observar como o preço do petróleo influenciou grandemente no aumento do nível das importações. Enquanto as importações (em mil toneladas) que eram de 49.769 em 1973, passam para 54.898 em 1974 ( um aumento em cerca de 10%), as despesas de importação que era de 6.192 milhões de dólares em 1973 passam para 12.641 milhões de dólares em 1974 (mais que o dobro do valor). Contudo, a partir de 1974 houve uma certa estabilidade nas importações brasileiras. Observa-se também, no mesmo período, que o preço da tonelada de petróleo importado chegou a quadruplicar.
TABELA 7
Evolução das importações, 1973-1978
|
Ano |
Import. US$ milhões |
Mil ton. |
Preço ton. Petróleo US$ |
Import. Petróleo US$ milhões |
|
1973 |
6.192 |
49.769 |
20,1 |
711 |
|
1974 |
12.641 |
54.898 |
81,2 |
2.840 |
|
1975 |
12.210 |
53.056 |
80.0 |
2.875 |
|
1976 |
12.347 |
61.652 |
85,2 |
3.612 |
|
1977 |
12.023 |
62.062 |
91,1 |
3.814 |
|
1978 |
13.639 |
69.790 |
91,9 |
4.196 |
Fonte: BACEN.
Extraído: GOLDENSTEIN, Sérgio. A dívida externa brasileira - 1964/1983: evolução e crise. Rio de Janeiro, 1986. Ed. Guanabara. Quadro 25, pp.101.
A tabela 8 mostra como a balança comercial passou de superavitária em 1973 à grande deficitária a partir de 1974, em virtude da crise do petróleo. Observa-se que em 1973 as exportações foram de US$ 6.199 milhões e as importações foram de US$ 6.192 milhões, e em 74 (depois do 1° choque do petróleo) as exportações foram de US$ 7.951 milhões enquanto as importações dobraram, ficando em US$ 12.641 milhões, então a balança comercial, que tinha um superávit de US$ 7 milhões no ano de 1973, passou a amargar um déficit de US$ 4.690 milhões em 1974 e assim por diante.
TABELA 8
Balança comercial, 1974 - 1978
US$ milhões
|
Ano |
Exportação |
Importação |
Bal. Comercial |
|
1973 |
6.199 |
6.192 |
+7 |
|
1974 |
7.951 |
12.641 |
-4.690 |
|
1975 |
8.670 |
12.210 |
-3.540 |
|
1976 |
10.128 |
12.383 |
-2.254 |
|
1977 |
12.120 |
12.023 |
+97 |
|
1978 |
12.658 |
13.683 |
-1.024 |
Fonte: BACEN.
Extraído: GOLDENSTEIN, Sérgio. A dívida externa brasileira - 1964/1983: evolução e crise. Rio de Janeiro, 1986. Ed. Guanabara. Quadro 27, pp.114.
Com base no que estava acontecendo na balança comercial brasileira, foi elaborado o II PND (Plano Nacional de Desenvolvimento), com o objetivo principal de expandir o setor de bens de capital e ampliar a oferta interna de insumos básicos.
O II PND foi o responsável por um programa de exportação muito bem elaborado que resultou em um aumento em mais de 60% das exportações no período de 1974 a 1978, sem permitir que as importações avançassem, permanecendo praticamente no mesmo patamar (ver tabela 8).
Para dar sustentação ao II PND era de vital importância que o país continuasse a se endividar externamente. "Para garantir o crescimento acelerado da economia, o governo Geisel estimulou ainda mais a captação de recursos externos em moeda" através da suspensão do depósito compulsório de 40% que incidia sobre o contravalor em cruzeiros dos empréstimos externos (em fevereiro de 1974), da redução de 10 para 5 anos o prazo mínimo de amortização de empréstimos em moeda com seis meses de carência (setembro de 1974), e através da circular n° 205 que reduzia de 25% para 5% o imposto de renda incidente sobre juros, comissões e demais despesas decorrentes de operações de empréstimos externos (em outubro de 1974).
De acordo com a tabela 9, a dívida externa bruta brasileira apresentou um constante aumento, que já vinha se mantendo em patamares altos herdados do período anterior (o período do "milagre"). Observa-se também que com relação ao PIB, a dívida externa também estava aumentando, e a participação da dívida em moeda sobre a dívida total também aumenta chegando a 68% em 1978. Outro ponto que merece destaque é o fato de que nesse período as reservas internacionais continuavam aumentando cada vez mais (ver tabela 1), revelando, com isso, que os empréstimos que eram contraídos no exterior estavam sendo além do necessário para o pagamento do déficit comercial e para o investimento no país.
TABELA 9
Dívida externa, 1974-1978 - US$ milhões
|
Ano |
Dív. bruta |
Dív./PIB(%) |
Dív. moeda % |
|
1974 |
17.165 |
17,9 |
65 |
|
1975 |
21.171 |
17,0 |
69 |
|
1976 |
25.985 |
18,2 |
70 |
|
1977 |
32.037 |
19,3 |
67 |
|
1978 |
43.511 |
22,8 |
68 |
Fonte: BACEN.
Extraído: GOLDENSTEIN, Sérgio. A dívida externa brasileira - 1964/1983: evolução e crise. Rio de Janeiro, 1986. Ed. Guanabara. Quadro 30. pp. 116.
Nesse período (1974-1978) os empréstimos que eram contraídos no exterior tinham um certo planejamento de utilização, tanto no setor público como no setor privado. "Com relação ao setor público, os empréstimos que foram contraídos nos três primeiros anos do período foram destinados basicamente às áreas de transporte, telecomunicações, energia e à administração central", enquanto no setor privado os empréstimos eram destinados "principalmente à indústria de transformação, nos ramos da metalurgia, material de transporte, química e material elétrico". Esse planejamento de utilização dos empréstimos contraídos no exterior já fazia parte da estratégia do II PND.
O que mais marcou esse período foi a "estatização" da dívida, ou seja, o setor privado, com intuito de se defender dos riscos cambiais e da elevação das taxas de juros internacionais, transferiu uma significativa parcela de sua dívida externa para o setor público com base na circular n° 230 e na resolução 432. Com isto a participação da dívida pública sobre a dívida total estava aumentando cada vez mais. A tabela 10 mostra que a dívida pública que era de 50% em 1974 passou para 63% em 1978, e mostra também que a dívida pública em moeda que era de 30% em 74 saltou para 52% em 78, o que refletia a eficiência da política de estímulo a captação de recursos externos em moeda via empresas públicas.
TABELA 10
Relação dívida pública / dívida privada, 1974-1978
|
Ano |
Dív. total pública % |
Dív. Total privada % |
Dív. Pública em moeda % |
Dív. Privada em moeda % |
|
1974 |
50 |
50 |
30 |
70 |
|
1975 |
54 |
46 |
42 |
58 |
|
1976 |
58 |
42 |
46 |
54 |
|
1977 |
60 |
40 |
48 |
52 |
|
1978 |
63 |
37 |
52 |
48 |
Fonte: BACEN.
Extraído: GOLDENSTEIN, Sérgio. A dívida externa brasileira - 1964/1983: evolução e crise. Rio de Janeiro, 1986. Ed. Guanabara. Quadro 34. pp. 118.
A inflação nesse período, de acordo com o IGP da fundação Getúlio Vargas (ver tabela 6, pp. 21), foi crescente. Com relação à inflação do último ano do período anterior (a inflação do ano de 1973 foi de 13,7%), a inflação de 1974 aumentou mais que o dobro, ficando em 34,5%, chegando a atingir em 1976 46,4%, e fechando a 40,8% em 1978.