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A Cor da Verdade - REPORTAGEM
Droga, negligência consciente.
Bruno Barros
"(...)a economia global da droga ultrapassa
já a economia global do petróleo. Os fabulosos lucros
ilícitos de todos aqueles tráficos, após cuidadosas
operações de branqueamento, são canalizados para
o sector económico legal, de cujas alavancas se vão assenhoreando,
bem como do correspondente poder.(...)"
Almeida Santos (ex-Presidente da AR e reconhecido
crítico desta matéria).
Do sonho à realidade...
Todos almejam a cura para os seus males, a alienação dos
problemas que os rodeiam, quebrar barreiras ou simplesmente criar asas
para voar rumo ao idílio e ao prazer.
A droga pode representar uma forma de encurtar distâncias, dar
o tudo em muito pouco tempo. Porém, este caminho mais rápido
não passa de uma mera ilusão. A própria expectativa
de se obter a plenitude recorrendo a estupefacientes é artificial.
A juventude é, e sempre será, o resultado de uma determinada
sociedade. O produto de um contexto e a constante personificação
da evolução humana.
Os dados referentes ao binómio droga/juventude representam, sem
sombra de duvida, um importante indicador da nosso mundo actual.
Conhecer e compreender o conceito de droga torna-se fundamental, estabelecer
fronteiras entre o comum consumidor e aquele que já está
numa fase problemática também.
Esta reportagem propõem-se a dar uma visão dos comportamentos
dos jovens estudantes face a esta realidade, compreender os seus hábitos
e a forma como a encaram.
A
Droga é...
O conceito de droga não é linear e pode variar por entre
diversas substâncias, licitas ou ilícitas, químicas
ou naturais. Por vezes, não é a substancia em si que se
vai definir como droga, mas a intenção e os comportamentos
que os indivíduos têm perante ela.
Os ingleses utilizam a expressão “drug” tanto para
os medicamentos com fins terapêuticos, como com o sentido do correlativo
linguistico em Português “droga”, enquanto substancia
psicoactiva.
A droga pode abarcar um universo que se estende desde os canabinoides,
anfetaminas, alucinogénios, cocaína, heroina, passando
pelo comum álcool, nicotina, cafeína, até aos anti-depressivos
não receitados, entre outras substancias menos suspeitas como
os solventes (colas, vernizes, diluentes).
Padrões de consumo.
Em Portugal, ao contrário do que se passa noutros países,
não existe uma base de dados sobre a evolução do
consumo. Enquanto que os EUA têm dados relativos ao consumo de
drogas nos últimos 25 anos, apenas há 3 anos se iniciou
uma recolha fidedigna no nosso país.
Desta forma, segundo o prof. Jorge Negreiros, docente da Faculdade de
Psicologia da Universidade do Porto, torna-se extremamente difícil
avaliar a evolução do consumo em Portugal, deve-se, no
entanto, realçar um aumento generalizado num certo tipo de drogas
sintéticas (como o ecstasy).
No que diz respeito à heroína, os dados disponíveis
parecem apontar para uma estabilização do consumo. Quanto
aos canabinoides, há um uma percentagem cada vez maior de jovens
a consumir haxixe e marijuana entre os 12 e os 18 anos.
No ensino superior, sem considerar o álcool e
o tabaco, os produtos derivados da canabis representam os valores mais
elevados de experimentação e consumo (28%), revelando-se
também como a principal droga de iniciação (84%).
Maioritariamente o consumo inicia-se com ou mais de 16 anos.
O sexo masculino apresenta-se, geralmente, mais predisposto ao consumo
de drogas que o sexo feminino, no entanto, esta situação
inverte-se no que diz respeito aos tranquilizantes tomados sem prescrição
médica. A experimentação de drogas como a heroina,
a cocaína e o ecstasy é relativamente baixa, não
ultrapassando os 2,6% em nenhum destes casos .
Curiosamente, é com o consumo de uma substância
completamente legal, o álcool, que ocorrem os casos mais preocupantes.
No meio universitário 20% dos estudantes poderiam ser considerados
consumidores problemáticos.
No ensino Básico e Secundário 8% dos estudantes
revelam já ter consumido canabinoides, sendo que esta percentagem
ascende aos 17% e 15% nos alunos do 10º e 11º ano respectivamente.
Os alunos do ensino superior estão, regra geral, mais
conscientes dos efeitos da droga, porém, deve-se referir que
estes têm uma atitude mais displicente perante o álcool
e a canabis que os alunos do ensino básico e secundário.
O sexo feminino revela-se, em todas as faixas etárias, o mais
prudente.
Quanto à acessibilidade dos estupefacientes, os alunos universitários
consideram todas as drogas mais acessíveis, sendo que a canabis,
os tranquilizantes e o ecstasy as substâncias mais fáceis
de obter.
A heroina e a cocaína são “fáceis”
ou “muito fáceis” de obter para 19.6% e 17%
dos estudantes do ensino superior, respectivamente, o que indicia uma
relativa proximidade desses narcóticos para estes alunos.
Outro dado importante prende-se com o facto de 34% dos alunos do ensino
básico e secundário terem sido convidados a consumir drogas
ilícitas, 57% dos quais aceitaram.
Estes dados baseiam-se num estudo realizado em 2001 à população
estudantil do concelho de Matosinhos. Com este estudo não se
pretende estabelecer um padrão ao nível nacional, no entanto,
dada a falta de elementos disponíveis para análise, representa
um forte indicativo social das substancias consumidas pelos jovens em
Portugal.
Os caminhos da droga...
Contactado pelo ES, o professor Jorge Negreiros, autor do estudo supracitado
e representante de Portugal na União Europeia nas matérias
relacionadas com a toxicodependência, traçou um perfil
das situações que podem levar os jovens a consumir estupefacientes.
“As causas são biopsicosociais. A sociedade actual faz
um apelo constante ao consumo, à procura de novas sensações
e à busca de prazer.
A desagregação da família, a falta de supervisão
dos pais (...) e a baixa auto-estima também se apresentam como
razões importantes, no entanto, o relacionamento que o jovem
tem com o seu grupo de amigos revela-se fundamental.
Independentemente dos mais diversos factores, a decisão
de consumir está sempre nas mãos do indivíduo.
“
O prof. Jorge Negreiros considera que a falta de literatura relacionada
com o haxixe e a facilidade com que se pode adquirir este produto ajudam
a criar uma falsa noção de que as “drogas leves”
não comportam riscos consideráveis para a saúde,
daí resulta uma utilização tão alargada.
Torna-se fundamental diferenciar o consumidor ocasional daquele
que já poderemos considerar problemático.
“(...) Quando se instala uma dependência surgem
psicopatologias como a depressão e reacções psicóticas
(despersonalização e sensações estranhas
do corpo).
Os estudantes universitários têm tendência
para considerar que conseguem regular o consumo pensam que sabem até
onde podem ir e nunca prevêem essas consequências extremas.
O haxixe pode levar a um síndroma amotivacional ( falta de motivação).
(...)"
“(...)De
repente dei conta que metade dos meus amigos tinham começado
a consumir heroina ! (...)
Num dia em que eu estava muito mal não resisti e fui ter com
um deles pedindo para me dar um pouco.
Gostei logo e desde então passei a consumir de vez em quando...
Passado alguns meses já andava a consumir quase todos os dias...
(...)"
Anónimo
Quadro Informativo
Droga |
Constituição / Tipologia |
Efeitos |
Abuso e Dependência |
Canabis |
Obtida através de uma planta, a “cannabis sativa”,
de fácil cultivo.
O tetrahidrocannabinol (THC) resina obtida do arbusto pode ser comprimida
em blocos
(haxixe).
A marijuana deriva da mistura da planta depois de seca. |
Manifesta-se durante 1 a 4 horas ou mais, dependendo das expectativas,
das motivações, da quantidade consumida e da situação
envolvente.
Normalmente procura-se a hilariedade, a relaxação
e a capacidade de melhor apreciar o som e a cor. Concentração
ou destreza manual e intelectual reduzidas. A sensação
de depressão e ansiedade anteriores podem ser aumentadas
com o consumo. Um “charro” equivale a um maço
de tabaco em termos de risco pulmonar.
O organismo retém a canibais até a um mês. |
São predominantes as reacções do foro psicológico.
Como a ansiedade, intranquilidade, delírio e alucinação.
Podem ocorrer reacções delirantes, mesmo quando não
se consome, em indivíduos com personalidade psicótica.
Riscos especiais para pessoas com doenças respiratórias,
pulmonares ou do coração. Pode precipitar doenças
psiquiátricas em pessoas com personalidades perturbadas.
Pode diminuir a produção de esperma e influenciar
o ciclo menstrual. Afecta a produção de glóbulos
brancos. |
Opiáceos
(heroina)
|
A heroina deriva da papoila “Papaver Somniferum” .
Tem um aspecto de um granulado acastanhado.
Os opiáceos são os analgésicos mais potentes,
usados terapeuticamente em doentes com limitada esperança
de vida ou com dores crónicas.
A morfina, a codeína e a metadona são outros exemplos
destas drogas de administração,
tendencialmente, intravenosa. |
Provoca analgesia e sensação intensa de prazer,
calor, euforia, apagamento da angústia, estimulação
da vigília e um comportamento eufórico. .Por outro
lado pode provocar também incapacidade de concentração,
náuseas, vómitos, ansiedade e atordoamento. Diminui
as actividades do sistema nervoso incluindo funções
reflexas como a tosse, a respiração e o ritmo cardíaco.
Dilatam os vasos sanguíneos. |
Conduz à dependência tanto física como psicológica.
A privação repentina produz o que se chama de síndroma
de abstinência. Manifesta-se por agitação ansiosa,
irritabilidade, suores, tremores, náuseas e insónias,
mais tarde em dores abdominais toráxicas, vómitos
e hipertermia. Conduz também a um desinteresse da sua própria
pessoa: desleixo, má nutrição, fracas condições
de higiene e de habitação, isolamento ou restrição
ao grupo de pares consumidores. |
Cocaína |
Deriva das folhas de arbusto de Coca do qual se obtém um
pó branco. Pode ser tomada por via oral, endovenosa ou inalada.
“free base”- quando fumada em base pura. “speed-ball”-
injectada com a heroina. “crack”- aquecimento
e posterior arrefecimento de cocaína com bicarbonato de sódio
ou amoníaco e água, obtendo-se cristais por filtragem. |
Em doses reduzidas produz taquicardia, hipertensão arterial,
midríase, palidez, indiferença à dor e à
fadiga. Sensações de bem-estar, euforia, grande capacidade
mental e efeitos afrodisíacos. Algumas vezes, ansiedade e
pânico. As sensações perduram 1-2 horas, diminuindo
a seguir, para se manter o efeito é necessário consumir
novamente passadas essas 2 horas. Doses repetidas podem levar a
um estado extremo de agitação, ansiedade, paranóia,
alucinações e estereotopias gestuais, provoca também
cefaleias, suores, tremores e necessidade imperiosa de defecar e
urinar. Fumar ou inalar “crack” é mais perigoso
que a cocaína pura dá-se uma súbita e intensa
euforia que se prolonga até 20 minutos, sendo a dependência
mais rápida. |
O uso repetitivo provoca os mesmos efeitos do início do
consumo. A dependência é sobretudo psicológica.
O consumo continuado acarreta o risco de psicose alucinatória,
nervosismo, excitação e paranóia. Pode levar
á exaustão por falta de sono. A inalação
repetida danifica as membranas internas do nariz e septo nasal (estrutura
que separa as narinas). O consumidor habitual pode inalar de 0,25
a 0,5 g/ 2 ou 3 dias, o dependente de 1 a 2 g/dia. “Crack”-
frequência de consumo e dores físicas aumentam vertiginosamente.
Leva a comportamentos agressivos e tendências suicidas. |
Ecstasy |
Substância proveniente de uma mistura sintética
de anfetaminas e alucinogénios. Enquanto que os primeiros
fazem parte do grupo dos estimulantes, como a cocaína, a
cafeína e a nicotina. Os alucinogénios fazem parte
do grupo de drogas como o LSD.
Podem ainda sofrer mais ou menos alterações, o que
torna extremamente difícil prever os efeitos de uma única
pastilha. |
Enquanto que os alucinogénios distorcem a percepção
da realidade, das cores, da distância, do tempo. Provocam
excitação, euforia, depressão., delírio
e alucinações. As anfetaminas excitam e activam de
forma muito semelhante à adrenalina normalmente produzida
pelo corpo. A respiração e o ritmo cardíaco
são acelerados, as pupilas dilatam-se e o apetite diminui.
Sente-se mais energia, sentimentos de autoconfiança e euforia.
Têm efeitos que podem durar até 12 horas. A recuperação
física pode levar 2 dias. |
Alucinogénios - Dependência principalmente psicológica
sem efeitos físicos provocados pelas privações
da substância. Ansiedades breves e agravamento de dificuldades
psicológicas preexistentes. Anfetaminas - As doses mais fortes,
especialmente se forem repetidas dias seguidos podem produzir delírio,
pânico, alucinações e sentimentos de perseguição.
Algumas vezes desenvolvem-se estados psicóticos que levam
vários meses a ultrapassar. Podem levar á morte com
o consumo de álcool. A intoxicação aguda manifesta-se
por coma, colapso cardiovascular e hipotermia ou morte por paragem
cardio-respiratória e falência renal. |
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