A Carruagem de Ana Jansen
Esta lenda corresponde a severa pena que o inconsciente coletivo aplicou
à
memória de Dona Ana Jansen, poderosa e discutida matrona maranhense,
de
marcante presença na vida econômica, social e política
da São Luís do século
XIX.
Senhora de grande fortuna pessoal, dizem que mal tratava até à
desumanidade
seus numerosos escra vos. A lenda do pervagar penado de Donana pelas ruas
da Cidade, às noites de sexta-feira (há uma variante que
dá essa sinistra
aparição como ocorrendo às quintas feiras), teve larga
difusão na primeira
metade deste século, quan do eram comuns as ruas mal-iluminadas
ou
completainente às escuras, pelos constantes cortes de energia elétrica,
e
também por causa dos desiúandos policialescos da ditadura
estadonovista,
que traziam medo e maus presságios às noites de São
Luís.
Reza a radição que os notívagos da Cidade, ao pressentirem
a aproximação do
horrendo coche, fugiam aterrorizados, à procura de um lugar em que
pudessem
abrigar-se com segurança. Se assim não fizessem, estariam
sujeitos a receber
da alma penada de Dona Ana Jansen ou Donana, como popularmente
chamada, uma vela acesa que amanheceria transformada em osso de defunto.
A carruagem, puxada por cavalos decapitados e tendo na fun ção
de cocheiro
um escravo igualmente decapitado e com o corpo sangrando de monstruosas
sevícias, produz, por onde passa, horri pilantes sons, combinação
do atrito de
velhas e gastas ferragens com o coro de lamentações de escravos
em estertor.
A lenda da carruagem de Dona Ana Jansen, pavor; principalmente, dos
meninos são-luisenses de outrora, deu às belas noites enluaradas
da Cidade a
contraface tétrica de negros em agonia e cavalos pavorosos que,
ao toque de
seus cascos no calçamento das ruas, arrancavam faíscas de
fogo, nesse
longo e aterrorizante suplício de Donana.