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A política de redução de danos como fator de risco na infância e adolescência*.

Gilberto Lucio da Silva**

 

A estratégia de Redução de Danos é um dos resultados possíveis obtidos no tratamento da drogadicção. Esta estratégia, contudo, não pode ser estipulada como principal política de atenção aos transtornos devidos ao abuso de substâncias psicoativas. Ainda mais quando o atendimento é voltado para indivíduos em fase de desenvolvimento cognitivo, emocional e social. Como a maioria dos tratamentos disponíveis na área de dependência de drogas foram construídos e implementados na população adulta, o adolescente é, de certo modo, forçado a se adaptar aos programas pré-existentes.

Sabe-se que a formação da personalidade, propiciada pela experimentação de novas posturas sociais e novas maneiras de se relacionar, com a vivência dos sentimentos correlatos a cada uma destas situações novas, pode revelar-se inconsistente ou deficiente em função do uso regular e a eventual dependência de álcool e drogas. A avaliação pelo jovem do que é bom ou ruim tende a ser realizada de forma distorcida, bem como a percepção do retorno recebido do meio circundante. Estas deficiências implicam diretamente em uma maior dificuldade no processo de escolhas, em especial na área vocacional, e até mesmo no amadurecimento emocional, no qual se verifica, em muitos casos, uma interrupção no processo maturacional.

Diferente do adulto, o jovem usuário de drogas não vivenciou papéis na sociedade em um período anterior a disfunção causada pelo abuso de álcool e outras drogas. Antes do uso o que existiu foi, no máximo, uma infância sem o uso de drogas. Como, naturalmente, nenhum adolescente quer “voltar” para a infância, e o futuro, para eles, é um “lugar desconhecido”, o imediatismo próprio desta fase da vida e o medo de enfrentar sozinho (sem o apoio da droga) o mundo, “empurram” o jovem para o objeto “droga”, que nunca o deixa sozinho.

O imperativo da liberdade de opção quanto ao uso de drogas em uma sociedade que cada vez mais tende a negar qualquer norma disciplinar, e que afirma o risco como aventura, impõe mais uma modalidade de exclusão ao indivíduo. Somente aqueles capazes de gerir os riscos de suas ações e atitudes, a partir das informações disponíveis, poderão contar com uma real capacidade de escolha.

Uma vez que a Não Maleficência, um dos quatros princípios fundamentais da Bioética, que diz respeito ao não fazer mal ao paciente de maneira alguma, deve reger as ações do profissional de saúde, este se encontra impedido eticamente de defender a adoção do Princípio da Autonomia para justificar a autodeterminação do sujeito quando este sabidamente carece de informação e capacidade de gerir os riscos a que está exposto.

Recife, novembro de 2004.

*Resumo do trabalho apresentado no I Seminário no Eixo de Prevenção e Tratamento ao uso de drogas, Recife, Pernambuco, novembro de 2004.Voltar

**Pesquisador, Psicólogo Clínico e Jurídico, Pós-Graduação/Especialização em Antropologia das Sociedades Complexas.Voltar