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Sob o olhar da Lei:
encaminhamentos de usuários de drogas pela Justiça de Pernambuco*
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Gilberto Lucio da Silva**

 

Ainda que seja objeto cada vez mais freqüente de debates, o encaminhamento de adultos e jovens, que respondem a processo judicial, para acompanhamento clínico e psicológico especializado no abuso de drogas psicoativas não é algo novo na trajetória do Centro Eulâmpio Cordeiro de Recuperação Humana (CECRH), instituição pública que atende a este público há quase duas décadas no Estado de Pernambuco. A partir dos ofícios de encaminhamento do Poder Judiciário do Estado de Pernambuco, que se encontram no arquivo do CECRH, podemos identificar as modalidades e procedimentos utilizados neste processo, caracterizando um modus operandi desta parceria, a qual tem lugar há mais de uma década, e que vem sofrendo o peso da maior demanda existente na atualidade por este tipo de medida.

Em relação aos pacientes adultos, fica evidente o estreitamento das relações com o Poder Judiciário após o ano de 2001. De abril de 2002 a junho de 2004, cerca de 260 adultos foram encaminhados para avaliação (59,5% dos casos) ou com medida de tratamento já determinada pelo juiz (40,5%%).

A questão da determinação de tratamento clínico e psicológico para o abuso de drogas pelo juiz tem sido amplamente debatida no âmbito da Saúde e da Justiça. No que tange à interação do CECRH com o Poder Judiciário Estadual verificamos, no biênio 2002-2004, uma modificação significativa nos trâmites processuais da Vara de Execução das Penas Alternativas (VEPA) e do 1º Juizado Especial Criminal da Capital (1º JECrim). Em 2002, 52% dos casos encaminhados já tinham medida de tratamento determinada pelo juiz, sendo a maioria (71%) oriundos do 1º JECrim. No ano seguinte, 81% dos casos recebidos pertenciam ao 1º Juizado, e 56% eram encaminhados para avaliação clínica e psicossocial antes da aplicação de medida pelo juiz. Esta tendência se mantém no 1º semestre de 2004, e atinge 66% dos casos, dos quais 65% foram remetidos pelo 1º JECrim.

A maioria dos trabalhos que versam sobre o tema tratam do mesmo a partir de discussões sobre conceitos legais, éticos ou terapêuticos, sem avaliar de fato o que efetivamente ocorre nas vidas destas pessoas que iniciam uma abordagem terapêutica, que se revela a primeira na maioria dos casos, quando a ela são impelidas no contexto de um processo judicial. Este trabalho procurou mostrar os caminhos que o judiciário pode e deve tomar na resolução dos problemas que lhe competem e que estão incursos nos crimes previstos em lei. A reação do beneficiário, autor do fato, sentenciado ou apenado, a estes procedimentos há que ser observada, registrada e descrita, para que as medidas despenalizadoras aplicadas ao usuário de drogas ilícitas possam atingir os objetivos sócio-educativos e ressocializadores a que se propõem.

*Resumo do artigo incluso na obra "Coação ou co-ação: diálogo entre Justiça e Saúde no contato com usuários de drogas".Voltar

**Pesquisador, Psicólogo Clínico e Jurídico, Pós-graduação/Especialização em Antropologia das Sociedades Complexas.Voltar