Site hosted by Angelfire.com: Build your free website today!

A “insustentável leveza” da Maconha

Ana Cecília Marques e Gilberto Lucio da Silva**

 

Ao contrário do que costumam pensar alguns políticos, e mesmo profissionais de saúde, a maconha não pode ser ainda indicada para fins terapêuticos, em sua forma fumada, e tão pouco como terapia de substituição ao crack. O uso medicinal da maconha ainda carece de comprovação científica.

A violência relacionada à droga, que é sustentada pelo “crime organizado”, só confere a droga uma pequena parte da responsabilidade. Se o jovem que se envolve nesta “organização”, se tornar também um usuário, conseqüentemente, além de empregado, ele será mais uma vítima e não o agente da violência.

O que está induzindo os jovens (e não apenas os da periferia) ao tráfico, aos assaltos e mortes, comprometendo as suas vidas, não é uma droga em específico, mas a rede do narcotráfico que busca arregimentar cada vez mais cedo os seus “soldados” para usufruir certo modo da legislação penal mais branda a que está sujeito o adolescente em conflito com a lei. Pensar que o crack é que torna o sujeito violento é estender a esta droga o mesmo raciocínio que atribui ao álcool a violência doméstica, sem contextualizar a situação de agressão e os múltiplos fatores que a determinam.

Estudo publicado este ano no periódico de maior impacto na área (Addiction) mostrou que jovens que foram usuários pesados de maconha na adolescência, acompanhados por 10 anos, apresentaram muito mais problemas mentais e de relacionamento social e laboral, do que aqueles que foram consumidores de bebidas alcoólicas. Pensar que o crack é uma droga mais “pesada” significa desconsiderar os estudos mais recentes na área, que apontam para um crescimento do número de usuários de maconha entre os mais jovens, bem como o fato de que o uso de qualquer droga psicotrópica, isto sim, deixa o adolescente exposto e com uma chance muito maior de consumir qualquer uma delas.

O produto vendido hoje no Brasil não pode ser equiparado ao mesmo produto oferecido há pouco mais de dez anos. Drogas mais concentradas, como o skunk, a chamada “supermaconha”, têm sido adotadas pelo tráfico visando aumentar a possibilidade de desenvolver a dependência e estão estreitamente associadas ao surgimento de danos psicológicos e físicos em adolescentes. Este procedimento também tem sido adotado indústria das drogas lícitas. Presa fácil deste método é o adolescente, que vulnerável, poderá sofrer um impacto mental, físico e social imponderável. Segundo dados publicados no site da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), o efeito de uma “dose” de maconha pode variar intensamente de acordo com a procedência da droga e a forma como é consumida e fundamentalmente, do consumidor com suas características individuais. Nos últimos 20 anos, a sofisticação do cultivo da maconha com técnicas hidropônicas tem aumentado muito a potência de todos os derivados da Cannabis. Nos anos 60 e 70 um cigarro comum de maconha continha cerca de 0,5 a 1% de THC, atualmente um cigarro pode conter cerca de 20-30%. Assim, o usuário contemporâneo de maconha na forma fumada, pode estar exposto a doses cerca de 15 vezes mais fortes de THC que os jovens dos anos 60 e 70.

De modo diverso do que se pensava com base nos estudos das drogas usadas nas décadas passadas, a síndrome de abstinência de maconha em humanos tem sido descrita por sintomas que se iniciam já nas primeiras 24 horas após a cessação do uso, apresentando-se por meio de sintomas inicialmente emocionais e depois comportamentais. São eles: irritabilidade, ansiedade, agressividade, angústia, agitação psicomotora, diminuição do apetite e perda de peso; alterações do sono como insônia e pesadelos; cansaço; desconforto generalizado com dores musculares, cefaléia, taquicardia e “fissura”. A gravidade da síndrome é maior naqueles que têm também outros transtornos psiquiátricos e uma freqüência grande de consumo.

No ano passado, foram reportados na Inglaterra mais de 22.000 usuários de maconha com necessidade de tratamento, dos quais metade tinha menos de 18 anos. O número de admissões em emergências hospitalares devidas ao abuso de maconha quase dobrou em cinco anos (de 581 em 2001 para aproximadamente 1000 em 2006).

Pesquisas realizadas pelo Centro Universitário para Saúde do Adolescente, de Melbourne, Austrália, sinalizam que usuários que fizeram uso intenso de maconha na adolescência estão mais sujeitos que usuários de álcool à ocorrência de distúrbios mentais, problemas de relacionamento e dificuldade para obter empregos. No Reino Unido, um estudo com 1.900 jovens com idade entre 15 e 25 anos, revelou que o grupo que fazia uso intenso de maconha apresentou seis vezes mais propensão ao uso de outras drogas que os usuários de álcool, e três vezes mais dificuldades em concluir os estudos e obter trabalho.

No Brasil, estudo realizado pelo CEBRID – Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas, que abrangeu 107 cidades com mais de 200 mil habitantes, informa que a dependência de maconha apareceu em 1,0% dos entrevistados, o que equivale a uma população estimada de 451.000 pessoas. A comparação do uso na vida de maconha entre meninos em situação de rua cresceu em São Paulo de 43,7% em 1987 para 73,8% em 2003. No Rio de Janeiro também houve crescimento de 20% em 1993 para 59,3% em 2003 e em Brasília foi de 21,9% (1997) para 52,3% no ano de 2003. No levantamento domiciliar realizado em 2006 evidenciou-se que os adolescentes têm experimentado a substância com maior freqüência que há 4 anos atrás. O uso ocorre já em idades de 12 a 17 anos (4,1%), atinge um pico para os dois sexos entre 18 a 24 anos (17%), diminuindo na faixa de mais de 35 anos (5,6%).

Há poucos dias, no 2º Simpósio Estadual sobre Drogas, Redução de Danos, Gravidez na Adolescência e Hepatites Virais, em Colombo, na Região Metropolitana de Curitiba, dados apresentados pelo Núcleo Integrado de Apoio e Prevenção as DSTs/Drogas/Aids (Niapa) indicam que pessoas que iniciam a experimentação de drogas antes dos 14 anos de idade são 47% mais vulneráveis a, no futuro, desenvolverem algum tipo de dependência química. Já a experimentação a partir dos 21 anos faz com que a vulnerabilidade diminua para 9%. O dado demonstra o perigo que as drogas, sejam elas lícitas ou ilícitas, representam na vida das crianças e adolescentes.

É preciso que a ética ande de braços dados com a Ciência e portanto, toda a sociedade civil e científica deve participar do debate, buscar as pesquisas nacionais e internacionais e enfrentar o problema. Garantir o cumprimento das leis que proíbem o acesso de crianças e adolescentes ao consumo de álcool e outras drogas psicotrópicas, como o tabaco, a cola de sapateiro, a maconha, a cocaína, entre outras, é dever de todos. O fortalecimento do trabalho preventivo desenvolvido com as famílias, escolas e igrejas, com ênfase nas políticas públicas que incluam medidas de controle social, informação para a comunidade, educação nas escolas e tratamento efetivo tem produzido nos países desenvolvidos a redução da prevalência dos problemas.

Descriminalizar drogas proibidas ainda é uma medida muito precipitada, pois nada temos de evidências consistentes que esta ação pode dar certo no Brasil. Os políticos precisam fazer uma aliança com os pesquisadores para produzir um programa adequado que respeito o cidadão e toda a sociedade.

Maconha, Droga leve?

Quem experimenta maconha tem até 66,7 vezes mais riscos de consumir outras drogas! O uso crônico aumenta em seis vezes o risco de evasão escolar. Em média, usuários de maconha têm duas vezes mais risco de depressão. O uso da maconha altera a condução eletroquímica dos neurônios em certas áreas do sistema nervoso central.

O governo brasileiro gasta ao menos R$ 82 milhões ao ano para tratar problemas ligados ao uso de drogas! exposição do feto à maconha levou a disfunções na atenção, na prontidão e no autocontrole destas crianças durante a infância.

II Jornada preparatória para o XIX Congresso Nacional da ABEAD em Pernambuco

Buscando colaborar com este debate, o Ministério Público de Pernambuco, em parceria com a Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas, realizará em Recife a II Jornada preparatória para o XIX Congresso Nacional da ABEAD. Com o tema “Adolescência, drogas e violência: proteger é preciso”, o evento reunirá juízes, promotores, entidades governamentais e não governamentais, profissionais da saúde e assistência social, todos aqueles que lidam diretamente com esta problemática e que se interessam pelo tema no dia 06/07/07, no auditório do Banco Central. As inscrições devem ser realizadas com a Escola Superior do Ministério Público, pelo fone: 33031145 ou pelo email: escola@mp.pe.gov.br.

**Ana Cecília Marques: Médica, pesquisadora, consultora da ABEAD (Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas) Gilberto Lucio da Silva: Pesquisador, psicólogo jurídico, especialista em Antropologia das Sociedades Complexas.Voltar