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A conciliação e a composição dos danos civis nos juizados especiais criminais *.

Luiz Alfredo Moraes Pinto Ferreira **

“PALAVRAS–CHAVE: Juizado Especial Criminal; Conciliação; Composição dos Danos Civis”


RESUMO

O presente artigo aborda de forma sucinta a instalação do Juizado Especial Criminal em Pernambuco, a chegada do Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) nos Juizados Especiais Criminais e a Conciliação e a Composição dos Danos Civis.

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A Lei n.º 7.244, de 7 de novembro de 1984 deu origem na esfera civil, aos Juizados Especiais de Pequenas Causas, objetivando inovar e estabelecer um novo tratamento nos conflitos de interesse, onde logo no art. 1º da referida Lei trazia a denominação: “Juizado Especial de Pequenas Causas”.

Posteriormente a Constituição Federal tratou dos Juizados em dois dispositivos: art. 24, inciso X e art. 98, inciso I, sendo este último dispositivo regulamentado pela a Lei n.º 9.099, de 26 de setembro de 1995, que estabeleceu a sua face atual, denominando-os de Juizados Especiais Cíveis e Criminais.

Com o art. 98, inciso I da Constituição Federal houve o entendimento de que as infrações penais de menor potencial ofensivo “(...) são as mesmas pequenas causas a que se refere o art. 24, inciso X, CF, a atribuição constitucional da competência concorrente à União autorizaria, e recomendaria mesmo, que a lei federal estabelecesse as normas gerais de processo e procedimento para conciliação, julgamento e execução das referidas infrações.

Após a edição da lei federal é que competiria aos Estados, no uso de sua competência constitucional, não apenas criar os Juizados Especiais, mediante regras de organização judiciária, como ainda suplementar a legislação federal por intermédio de normas específicas de procedimento, que atendessem às suas peculiaridades, e até mesmo de processo, se se entendessem que a regra do art. 98, I, há de ser conjugada com a do art. 24, X, da Constituição Federal.” (GRINOVER , 1999:32)

Ainda segundo GRINOVER (1999:32): “Mas, antes da edição da Lei 9.099/95, alguns Estados (como Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Paraíba) criaram os Juizados Especiais Criminais por intermédio de leis estaduais, que foram instalados e vêm funcionando regularmente.

Pairavam dúvidas sobre a constitucionalidade das leis estaduais que os haviam instituído. Até que o Supremo Tribunal Federal finalmente decidiu que a criação dos Juizados Criminais pelos Estados dependia de lei federal, sendo inconstitucional a norma estadual que outorgará competência penal a Juizados Especiais (HC 71713-PB). O entendimento foi reiterado no HC 72.582-1-PB (DJU 2.10.95, p.35.258).”

Com relação aos Juizados Especiais Criminais em Pernambuco, a Lei nº 11.279, de 28 de novembro de 1995 , criou os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e através da Resolução n° 85/95, de 21 de dezembro de 1995 , do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, regulou-se o funcionamento, a estrutura organizacional e a competência dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais no Estado e em 1996, iniciou-se as atividades do Juizado Especial Criminal, com a sua instalação e funcionamento no Fórum Paula Baptista.

No Fórum, os Juizados Especiais Criminais dividiam os seus espaços com as extintas Varas de Delitos de Trânsito e Contravenções Penais. Na 1ª, na 2ª e na 3ª Varas de Delitos de Trânsito e Contravenções Penais funcionavam, respectivamente, em dois Turnos, o 1º, o 2º e o 3º Juizados Especiais Criminais.

Em novembro de 1996, o Tribunal de Justiça unificou os três Juizados Especiais Criminais em um só, o 1º Juizado Especial Criminal do Recife, instalando-o na Ilha do Leite e em 2002, transferiu-o para o Fórum Thomas de Aquino, dando-lhe sua feição atual.

A idéia básica dos Juizados é a facilidade do acesso da população à Justiça, objetivando a celeridade processual, procurando afastar a crença generalizada da Sociedade, de que a Justiça é lenta, cara e complicada, sendo difícil e inútil ir ao Judiciário em busca da tutela do seu direito.

Na realidade, o Poder Judiciário procura superar a sua morosidade, que se deve principalmente ao pequeno número de juízes para os feitos em andamento e o número de jurisdicionados. Convém registrar a realidade do Poder Judiciário: Na Justiça Federal de primeira instância, de 1967 a 1986, foram distribuídos 1.832.868 (hum milhão, oitocentos e trinta e dois mil, oitocentos e sessenta e oito) processos, julgados 900.101 (novecentos mil, cento e um).

Dentro deste período, a Associação Paulista do Ministério Público informou que seria preciso realizar sessões diárias durante dezenove anos e oito meses para esgotar os processos pendentes para julgamento nos tribunais do júri, só na cidade de São Paulo.

Dados fornecidos pelo Tribunal Superior do Trabalho mostravam, neste período, que 45% dos processos que tramitavam pela Procuradoria-Geral da Justiça do Trabalho demoravam de três meses a um ano para que recebessem os pareceres da dita Procuradoria-Geral.

Na Justiça Estadual de São Paulo havia 2.138.632 (dois milhões, cento e trinta e oito mil, seiscentos e trinta e dois) feitos em andamento (processos cíveis, processos-crimes e de menores). Existiam na época, 951 juízes proferindo ao todo oitenta mil sentenças por mês. Tal número é excessivo, tendo em vista o tempo e o trabalho das audiências e os despachos de expediente. Admitindo-se a entrada de novos feitos, e mantendo-se estável o número de juízes, a Justiça Estadual de São Paulo levaria trinta anos para colocar-se em dia com seus julgamentos.

Desta forma, uma das intenções de criação dos Juizados é reverter à mentalidade da Sociedade de morosidade da Justiça, resgatando ao Judiciário a credibilidade popular, de que ele é merecedor e fazendo renascer na população, a confiança na Justiça, evitando-se a crença de que a “Justiça tardia é Justiça desmoralizada”, e de que, é no Judiciário o local próprio para a solução dos seus problemas.

Assim, de acordo com a Lei n.º 9.099/95, em seu art. 1º, in verbis:

“Art. 1º Os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, órgãos da justiça Ordinária, serão criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para conciliação, processo, julgamento e execução, nas causas de sua competência.”

Nos Juizados Especiais Criminais o processo, geralmente, inicia-se através da noticia crime do ofendido ou seu representante legal, dirigindo-se a Delegacia mais próxima onde ocorreu o fato, ou na Delegacia Especializada, para a lavratura, pela autoridade policial, do Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO).

Na Delegacia de Polícia, o ofendido, mesmo menor e acompanhado de seu representante legal, relatará o fato ocorrido, a data e o local do fato, será qualificado, informará o endereço de sua residência, inclusive com pontos de referência, os seus telefones de residência, de trabalho ou de contato, fornecerá a qualificação e o endereço, de contra quem quer reclamar (autor do fato), os nomes e endereços de testemunhas, que presenciaram o fato ocorrido, assinará Termo de Representação e o Autor do fato assinará o Termo de Compromisso, para comparecimento a Audiência no Juizado.

O autor do fato que for encaminhado ao Juizado Especial Criminal ou assumir o compromisso de comparecer ao Juizado, não se imporá à prisão em flagrante, nem se exigirá fiança. Com a chegada do TCO no Juizado Criminal, a Secretaria (Cartório dos Juizados) autua o Processo (coloca capa, numera as páginas) e encaminha ao Ministério Público para enquadramento do crime.

Sendo o Crime de Competência do Juizado, o Ministério Público solicita a designação de Audiência Preliminar à Secretaria. Não sendo de competência dos Juizados Criminais, o Ministério Público emite Parecer e o Juiz despacha para que a Secretaria redistribua o Processo a Vara competente. Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 (dois) anos (o parágrafo único do art. 2º da Lei nº 10.259, de 21 de julho de 2001 alterou o art. 61 da Lei nº 9.099/95).

Vale salientar que, tanto no art. 61 da Lei nº 9.099/95, como no parágrafo único do art. 2º da Lei nº 10.259/01, o conceito de infração penal de menor potencial ofensivo é aplicável no âmbito da Lei do Juizado Especial Criminal, facultando o legislador, em outros diplomas legais expandir o rol.

Neste sentido podemos observar a aplicabilidade da Lei do Juizado Especial Criminal nos fatos típicos existentes no Código de Defesa do Consumidor (CDC), no Código de Trânsito Brasileiro (CTB), na Lei n.º 9.605/98, também conhecida como a Lei da Natureza e na Lei n.º 10.741/03 (Estatuto do Idoso).

Tratando-se de Ação Penal Pública Condicionada ou de Ação Penal Privada há a atuação direta dos Conciliadores na Audiência Preliminar, objetivando a tentativa de conciliação.

Conciliação significa, ajuste, acordo, entendimento entre as partes em litígio, devendo ser sempre proposta e nunca imposta. O conciliador deve evitar emitir qualquer opinião sobre o mérito da causa e objetivar sempre aconselhar, orientar e pacificar, indicando as vantagens da conciliação, para que as partes cheguem a um entendimento e encerrem a controvérsia.

Nos Juizados Especiais Criminais, a conciliação pode ser obtida quando a vítima não manifesta interesse em Representar ou apresentar Queixa-Crime contra o Autor do fato, mediante o compromisso do Autor do fato, de não mais importunar o ofendido, deixando-o a paz e a tranqüilidade, podendo acarretar com isto, a Renúncia, o sobrestamento do feito ou a decadência.

Inviabilizada a tentativa de conciliação, o Ofendido manifestará a sua vontade em prosseguir com o procedimento através da Representação Criminal, que é a autorização dada pela vítima para que o representante do Ministério Público ofereça a proposta de Transação Penal ou conforme o caso, ofereça a Denúncia contra o Autor do fato, nas Ações Penais Públicas Condicionadas, em razão do ilícito penal imputado.

Frustrada a tentativa de conciliação nas ações penais privadas, o Ofendido deverá apresentar Queixa-Crime, que é a exposição escrita circunstanciada e formal, peça inicial nos crimes de Ação Penal Privada, que deve ser apresentada por Advogado ou Defensor Público do ofendido, na própria Audiência Preliminar ou dentro do prazo decadencial, sob pena de decadência. Nos Juizados Especiais Criminais a Queixa-Crime também pode ser apresentada oralmente na Audiência Preliminar, por Advogado ou Defensor Público.

O Conciliador poderá viabilizar o entendimento entre as partes possibilitando que o ofendido não manifeste a sua intenção em prosseguir com a demanda, desde que o Autor do fato não mais o importune ou mesmo se retratando pelos fatos ocorridos, renunciando ao seu direito de ação ou, então, por vontade do ofendido, este pode abdicar do seu direito, acarretando a renúncia, que pode ser expressa ou tácita. É expressa, quando feita pelo ofendido ou por seu representante legal; e tácita, quando resulta da prática de ato que não se compatibiliza com o propósito de iniciar a ação penal.

Para que as partes cheguem a um entendimento e encerrem a controvérsia, pode o Conciliador viabilizar o compromisso do autor do fato com o ofendido na Audiência Preliminar propondo o sobrestamento do feito, ficando assim os autos aguardando a manifestação da parte interessada até o decurso do prazo decadencial para oferecimento de Representação Criminal ou Queixa-Crime contra o Autor do fato, de acordo com o tipo penal.

O sobrestamento do feito pode ocorrer também, quando o ofendido devidamente intimado, não comparece a Audiência Preliminar, por sua própria vontade, ocasionando o sobrestamento do feito, na Secretaria do Juizado, do restante do lapso decadencial para que o ofendido ofereça, conforme o caso, a Representação Criminal ou apresente a Queixa-Crime contra o Autor do fato. O não oferecimento da Representação Criminal ou da Queixa-Crime no prazo legal acarretará a Decadência.

A Decadência é pois, a perda do direito, em razão do decurso do tempo, por não ter o ofendido o exercido durante o prazo que a lei estipula, que é de 6 (seis) meses, contado da data que ocorreu o fato ou do dia em que veio a saber quem é o autor do crime.

Tanto na renúncia, como na decadência enseja a extinção da punibilidade do autor do fato, enquanto no sobrestamento do feito, aguarda-se o decurso do prazo decadencial na Secretaria do Juizado, para que o ofendido manifeste-se contra o autor do fato, através da Representação Criminal ou da Queixa-Crime, no prazo de 6 meses, sob pena de ensejar a extinção da punibilidade do autor do fato, pela Decadência.

Na Composição dos danos civis há a reparação dos danos financeiros causados à vítima em razão do ilícito penal imputado ao autor do fato e uma vez homologado o acordo de composição dos danos civis, terá eficácia de título a ser executado no juízo civil competente, acarretando a renúncia ao direito de queixa ou representação.

Tanto na conciliação, como na composição dos danos civis são formas de acordo entre as partes, buscando-se por fim a controvérsia entre os envolvidos, sendo que na primeira pode ser alcançada com o compromisso do autor do fato e na segunda, há de ter a reparação financeira causados à vítima em razão do ilícito penal imputado ao autor do fato.

Com relação aos Procedimentos dos Conciliadores na Audiência Preliminar, sugerem-se os seguintes procedimentos por parte do Conciliador:

1 - Receber da Secretaria a pauta do dia, juntamente com os processos que a compõem, conferindo-os;

2 – Verificar, se o Processo é de competência do Juizado Criminal (a competência do Juizado será determinada pelo lugar em que foi praticada a infração penal);

3 – Verificar a data do fato da infração Penal;

4 – Verificar o tipo da Ação Penal (Pública Condicionada, Pública Incondicionada ou Privada);

5 – Verificar, se houve a representação e se ocorreu a Decadência e a Prescrição;

6 – Verificar a capacidade das partes, e em caso de incapacidade absoluta ou relativa, se o representante legal foi devidamente intimado e se as partes estão acompanhados de representantes legais ou Advogados ou se o fato típico envolve Empresa, será necessário na Audiência a presença do Responsável Cível;

7 – Verificar, se as partes foram intimadas;

8 – Verificar o histórico e a Cota do Ministério Público, a existência: do rol de testemunhas dos Antecedentes Criminais, da Perícia Traumatólogica e se já houve Transação Penal;

9 – Observar, se a Secretaria anexou: as Certidões do Oficial de Justiça, ofícios e a numeração das folhas dos autos;

10 – Determinar o pregão e o ingresso das partes na Sala de Conciliação (Ofendido e seu Advogado, a direita do conciliador e, autor do fato e seu Advogado, a esquerda do Conciliador);

11 – Na hipótese de remarcação, consignar o seu motivo;

Em caso de Representação do ofendido na Ação Penal Pública Condicionada, verificar a existência de Antecedentes Criminais (essencial para a proposta de Transação Penal) e da Perícia Traumatológica, em caso de Lesão Corporal Leve.

12 – Identificar e consignar na Ata, as partes presentes e seus Advogados ou Defensores Públicos, com os números, respectivamente, de suas identidades e O.A.B(s), bem como consignar os estagiários presentes;

13 – Proceder a abertura da Audiência com a leitura do Histórico, constante do T.C.O;

14 – Esclarecer as partes sobre as vantagens da Conciliação;

15 – Havendo acordo, consignará em ata o acordo firmado;

- O ofendido poderá optar ainda, por aguardar a decadência ou renunciar a ação.

16 – Não havendo acordo o ofendido poderá:

a) ratificar a representação constante nos autos ou oferecer representação criminal contra o autor do fato, nas Ações Penais Públicas Condicionadas. O Conciliador solicitará a presença do Ministério Público para a proposta de Transação Penal ou oferecimento da denúncia;

b) oferecer Queixa-Crime, em caso de ação privada, por seu Advogado ou Defensor Público, contra o autor do fato.

- Não realizada a composição, o ofendido poderá procurar ressarcir seus direitos no Juizado Cível, ou na Justiça comum, dependendo do caso.

17 – As partes e seus advogados assinam os termos de audiência e cada uma recebe uma via, ficando uma via nos autos.

É inegável o avanço no sistema penal e processual penal brasileiro com o advento da Lei nº 9.099/95, criando os Juizados Especiais Criminais possibilitando uma rápida solução dos litígios nas infrações penais de menor potencial ofensivo, permitindo entre as partes a composição civil e penal, além de criar novos institutos como a transação penal e a suspensão condicional do processo.

A celeridade processual nos Juizados Especiais Criminais e a efetividade das soluções dos seus conflitos resgatam o respeito da população na Justiça, seja conciliando as partes, seja ofertando a proposta de transação penal ao Autor do fato ou, então, aplicando a lei ao caso concreto, restabelecendo assim a paz entre os particulares e mantendo a ordem na Sociedade, aumentando a credibilidade da população no Poder Judiciário.

BIBLIOGRAFIA

GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Juizados especiais criminais: comentários à lei 9.099 de 26.09.1995. 3 ed. rev. e atual. São Paulo: RT, 1999.

*Este artigo faz parte da publicação "O Tratamento da Drogadicção como medida jurídica alternativa".Voltar

**Especialista em Direito Administrativo e Constitucional pela Faculdade de Direito do Recife/UFPE. Conciliador do 1º Juizado Especial Criminal do Recife. .Voltar