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Textos Barrocos

Prosopopéia
Bento Teixeira

Prólogo

Dirigido a Jorge d’Albuquerque Coelho, Capitão e Governador da Capitania de Paranambuco, das partes do Brasil da Nova Lusitânia, etc.

Se é verdade o que diz Horácio que Poetas e Pintores estão no mesmo predicamento; e estes pera pintarem perfeitamente uma Imagem, primeiro na lisa távoa fazem riscunho, pera depois irem pintando os membros dela extensamente, até realçarem as tintas, e ela ficar na fineza de sua perfeição; assim eu, querendo dibuxar com obstardo pinzel de meu engenho a viva Imagem da vida e feitos memoráveis de vossa mercê, quis primeiro fazer este riscunho, pera depois, sendo-me concedido por vossa mercê, ir mui particularmente pintando os membros desta Imagem, se não me faltar a tinta do favor de vossa mercê, a quem peço, humildemente, receba minhas Rimas, por serem as primícias com que tento servi-lo. E porque entendo que as aceitará  com aquela benevolência e brandura natural, que custuma, respeitando mais a pureza do ânimo que a vileza do presente, não me fica mais que desejar, se não ver a vida de vossa mercê augmentada e estado prosperado, como todos os seus súbditos desejamos.

Beija as mãos de vossa mercê: (Bento Teixeira)

Seu vassalo.
 
 
 

Cantem Poetas o Poder Romano, 
Sobmetendo Nações ao jugo duro; 
O Mantuano pinte o Rei Troiano, 
Descendo à confusão do Reino escuro; 
Que eu canto um Albuquerque soberano, 
Da Fé, da cara Pátria firme muro, 
Cujo valor e ser, que o Ceo lhe inspira, 
Pode estancar a Lácia e Grega lira. 

II 
As Délficas irmãs chamar não quero, 
que tal invocação é vão estudo; 
Aquele chamo só, de quem espero 
A vida que se espera em fim de tudo. 
Ele fará meu Verso tão sincero, 
Quanto fora sem ele tosco e rudo, 
Que per rezão negar não deve o menos 
Quem deu o mais a míseros terrenos. 

  III 
E vós, sublime Jorge, em quem se esmalta 
A Estirpe d'Albuquerques excelente, 
E cujo eco da fama corre e salta 
Do Cauro Glacial à Zona ardente, 
Suspendei por agora a mente alta 
Dos casos vários da Olindesa gente, 
E vereis vosso irmão e vós supremo 
No valor abater Querino e Remo. 


IV 
Vereis um sinil ânimo arriscado 
A trances e conflictos temerosos, 
E seu raro valor executado 
Em corpos Luteranos vigurosos. 
Vereis seu Estandarte derribado 
Aos Católicos pés victoriosos, 
Vereis em fim o garbo e alto brio 
Do famoso Albuquerque vosso Tio. 


Mas em quanto Talia no se atreve, 
No Mar do valor vosso, abrir entrada, 
Aspirai com favor a Barca leve 
De minha Musa inculta e mal limada. 
Invocar vossa graça mais se deve 
Que toda a dos antigos celebrada, 
Porque ela me fará que participe 
Doutro licor milhor que o de Aganipe. 

VI 
O marchetado Carro do seu Febo 
Celebre o Sulmonês, com falsa pompa, 
E a ruína cantando do mancebo, 
Com importuna voz, os ares rompa. 
Que, posto que do seu licor não bebo, 
À fama espero dar tão viva trompa, 
Que a grandeza de vossos feitos cante, 
Com som que Ar, Fogo, Mar e Terra espante 

Ilha da maré
Manuel Botelho de Oliveira

Quando vejo de Arnada o rosto amado,
Vejo ao céu e ao jardim ser parecido;
Porque no assombro do primor luzido
Tem o Sol em seus olhos duplicado."

"Tem o primeiro A nos arvoredos
sempre verdes aos olhos, sempre ledos;
tem o segundo A, nos ares puros
na tempérie agradáveis e seguros;
tem o terceiro A nas águas frias,
que refrescam o peito, e são sadias;
o quarto A, no açúcar deleitoso,
que é do Mundo o regalo mais mimoso.
 
 

Poema
Gregório de Matos Guerra

Buscando a Cristo 

A vós correndo vou, braços sagrados, 
Nessa cruz sacrossanta descobertos, 
Que, para receber-me, estais abertos, 
E, por não castigar-me, estais cravados. 

A vós, divinos olhos, eclipsados 
De tanto sangue e lagrimas abertos, 
Pois, para perdoar-me, estais despertos, 
E, por não condenar-me, estais fechados,

A vós, pregados pés, por não deixar-me, 
A vós, sangue vertido, para ungir-me, 
A vós, cabeça baixa, p'ra chamar-me.

A vós, lado patente, quero unir-me, 
A vós, cravos preciosos, quero atar-me, 
Para ficar unido, atado e firme. 

 A Inconstância dos Bens do mundo. 

Nasce o Sol, e não dura mais que um dia,
Depois da Luz se segue a noite escura,
Em tristes sombras morre a formosura,
Em contínuas tristezas a alegria. 

Porém se acaba o Sol, por que nascia?
Se formosa a Luz é, por que não dura?
Como a beleza assim se transfigura?
Como o gosto da pena assim se fia? 

Mas no Sol, e na Luz, falte a firmeza,
Na formosura não se dê constância,
E na alegria sinta-se tristeza. 

Começa o mundo enfim pela ignorância,
E tem qualquer dos bens por natureza
A firmeza somente na inconstância.