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O Estado de S. Paulo, terça-feira, 19 de outubro de 1999

Lang é um Leonardo DiCaprio endemoniado

      Jovem guitarrista de apenas 18 anos mostrou que conhece os meandros do blues

      (Escrito por Jotabê Medeiros)

      Buddy Guy e B.B. King tinham razão: o garoto é mesmo bom. Jonny Lang não só convenceu em sua
 performance no palco do Jockey Club, como foi além, mostrando que é um fenômeno real de um gênero que
 já andou à beira do esgotamento.

      Destaque da derradeira noite do Free Jazz Festival, a apresentação de Lang era aguardada com
 ansiedade. Um bluesman de 18 anos com o estilo babyface de Leonardo DiCaprio? Que ainda por cima canta
 como se tivesse um calo na garganta? Parecia ser apenas mais uma fraude da prodigiosa indústria fonográfica.
 Mas não era.

      Lang fez sua apresentação com base no seu disco mais recente, Wander This World, um amálgama de
 canções que mistura do mais recôndito rhythm'n'blues a baboseiras pop do tipo Bon Jovi (e até imitações de
 Prince). Mas, no palco, tomou outra direção: armou-se da mais genuína verve blueseira, maltratou a guitarra e
 botou a platéia na palma da mão. Era como se Leonardo DiCaprio tivesse passado por um ralador de queijo,
 o rosto deformado por uma careta e movimentos nervosos com o pescoço para frente e para trás.

      Além de tudo, Lang arrumou um tecladista (o maravilhoso Bruce McCabe) que tocava com uma caixa
 de amplificação valvulada ao fundo, o que dava um tom meio sixties ao som. Lang abriu o show com a melhor
 canção de seu último disco, Still Rainin, que serviu como cartão de apresentações para o que viria em seguida.

      De Wander This World, ele tocou a cortante The Levee (com solos de guitarra que pareciam não ter
 fim), Walkin' Away, Second Guessing, Leavin' To Stay e Breakin' Me. Exige muito da garganta, que alterna
 momentos de pura fúria rocker com lamentos que não parecem saídos do seu corpo franzino. Das duas uma:
 ou Lang entra para o panteão dos grandes mestres do blues ou ganha um câncer na garganta. É impressionante
 seu esforço vocal.

      Ovacionado pela platéia, ele manteve também uma atitude de bluesman: falou pouco, um "yeah" aqui e
 ali, outro "thank you" acolá. Tem um baixista fraco (Douglas Nelson) e um baterista barulhento demais (William
 Thomes), mas no restante seu show é um petardo.

      Lang fechou a noite de domingo no palco New Directions, noite que foi aberta pelo grupo nova-iorquino
 Medeski, Martin & Wood. O grupo, liderado pelo tecladista John Medeski, é de uma modernidade a toda
 prova. Com ele, tocam o baterista Chris Wood e o baixista William Martin.

      Medeski, Martin & Wood afrontam as convenções do trio clássico de jazz, brincando com ruídos,
 dissonâncias e incorporando recursos do DJ de club. O resultado é mais ou menos como um cruzamento de
 Beck com Ron Carter (creiam, não se trata de uma heresia: o baixista Chris Wood é uma grande promessa do
 instrumento).

      Pena que tocaram quase nada do seu mais recente disco, Combustication, que é ótimo. Eles abriram
 com Macha, do CD Bubblehouse, um verdadeiro cruzamento da dance music com o jazz. Depois, veio Buster
 Rides again e Wiggly's Way, essa última de um CD antigo, It's a Jungle in here (1993). O baterista e
 percussionista Billy Martin, que já tocou samba em casas de brasileiros de Nova York, esforçava-se para dizer
 algo em português à platéia. Mas o tom do Medeski não era de amadorismo: tocaram muito e não era uma
 música fácil. No final, saíram com as toalhas nas costas. Missão cumprida.

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