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GRUPOTERAPIA EM SAÚDE PÚBLICA:

"RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA"

 

 

"Temos de concluir que a psicologia dos grupos é a mais antiga psicologia humana..."

S. Freud

 

 

· Introdução

· História do grupo

· A Psicoterapia de grupo para alcoólicos

· Conclusão

 

  

 

Introdução

 

Este trabalho pretende relatar uma experiência de grupoterapia com alcoólicos na saúde pública.

O alcoolismo representa actualmente, na nossa realidade, um dos mais sérios problemas de saúde pública contribuindo para graves prejuízos económicos, familiares e sociais.

Sendo assim, a utilização dos grupos como terapêutica nas instituições públicas, poderá amenizar os estragos do álcool e trazer a solução para a demanda do tratamento.

O grupo que inspirou este trabalho possui as suas próprias particularidades e mantêm-se ainda desde há longos anos, tendo sido criado na Psiquiatria do Hospital Central da Praia. Com o passar do tempo, foram vários os terapêutas e diferentes os espaços de encontro do grupo, e apesar desses obstáculos ainda o grupo não se dissolveu. Pode-se dizer que retrata a eficácia da terapia de grupo tendo em conta os anos de abstinência de vários dos seus elementos.

Sem seguir um modelo teórico específico mas sim os objectivos gerais da grupoterapia, o tratamento do grupo aparece como uma experiência social continente perante a ambígua sociedade que estimula o uso do álcool e depois nega ou marginaliza o alcoólico. O grupo surge assim como promotor da interacção com o outro onde emergem sujeitos que interagem de forma criativa com o mundo e adoptam estilos de vida saudáveis.

 

História do grupo

 

O grupo que inspirou este trabalho, foi criado na Psiquiatria do Hospital Central da Praia, desde 1988, sendo seguido na época por um grupo de técnicos. Com o passar do tempo, por questões diversas, houve á necessidade de mudanças de espaços, vários foram os terapêutas que acompanharam o grupo e existiram períodos em que as impossibilidades impediram as sessões. No entanto prevaleceu a firme vontade da realização desses encontros tanto pelo lado dos intervenientes da saúde afectos á problemática do alcoolismo como pela demanda dos elementos mais antigos do grupo.

Nesse âmbito, o grupo passou a ser atendido nos serviços de saúde pública mais concretamente na Delegacia de Saúde da Praia, onde actualmente existe a tentativa de lutar contra o alcoolismo.

É de realçar que devido á indisponibilidade de alguns elementos em participar da sessão semanal nasceu um grupo de Alcoólicos Anónimos realizado nos fins de semana sob a orientação de um elemento de origem estrangeira com experiência nesse tipo de grupo de auto-ajuda .

Presentemente, a maioria dos membros frequentam ambos os grupos onde é evidente a busca do suporte para manter o estado de abstinência.

 

A psicoterapia de grupo para alcoólicos

 

O alcoolismo representa actualmente um dos mais sérios problemas de saúde pública e pode-se constatar que aumentam as vítimas desse mal na nossa sociedade e onde são evidentes os graves prejuízos económicos, familiares e sociais. Portanto, qualquer intervenção nesse sentido ameniza o sofrimento de muitas pessoas e motiva apostas nesse sentido.

O citado grupo é composto por aproximadamente dez elementos, participa uma única mulher, e estão incluídos numa faixa etária que vai de 30 a 60 anos. A maioria possui escolaridade mínima e exerce alguma actividade que gera rendimentos relativamente baixos para o suporte de agregados familiares. Na história pessoal de cada um existem antecedentes familiares de alcoolismo e o início da dependência ocorreu na fase de adolescência onde a luta com a timidez, o movimento para a auto-afirmação e a aceitação em grupos são apontados como factores que contribuíram para o uso incontrolável do álcool.

A busca de tratamento geralmente ocorreu em momentos de sofrimento extremo, onde problemas orgânicos, conflitos laborais e familiares teriam levados á tomada de consciência e opção pela abstinência total.

É tendo em conta esse ser humano acima descrito, em sua singularidade que esse trabalho vem sendo desenvolvido. Ou seja, o atendimento do grupo visa o interesse pelo indivíduo em sua totalidade e respeito pelas dificuldades que esse apresenta na busca de solução para seus problemas. Pois entende-se que o álcool muitas vezes ocupa os espaços das frustrações, das angústias, complementa o indivíduo e mascara sua fragilidade para se confrontar com a realidade, além de lhe proporcionar prazer.

O tratamento do grupo é realizado semanalmente, com uma hora de duração e tem inicialmente um papel de suporte no sentido do paciente poder expressar suas experiências dramáticas de modo a dividi-las com outros. O grupo constitui-se assim num espaço onde os pacientes que passaram pelas mesmas desventuras, mesmos problemas familiares e sociais, podem compartilhar suas expectativas, ansiedades e conquistas.

Objectiva-se a não relação com o álcool e relação com o outro na medida em que criam-se novos vínculos. A interacção entre as pessoas e a possibilidade de identificação que o grupo promove parece ser um índice de saúde grupal.

O paciente do grupo passa por um processo de auto-análise, em que se estimula uma atitude de auto-avaliação e crítica em relação ao próprio comportamento, o que aumenta seu campo de consciência que se encontrava muito estreito.

A grupoterapia contribui assim para a estruturação de uma identidade para o alcoólico que se identifica com um grupo voltado para a cura.

Esse tipo de intervenção atinge um maior alcance fora dos encontros do grupo, na medida em que propícia mudanças na dinâmica familiar e possibilita inserções desses sujeitos na sociedade.

 

Conclusão

 

Lidar com a problemática do alcoolismo nos leva a confrontar com algo muito mais amplo e complexo que é a sociedade. A vertente sociocultural usada por alguns autores para explicar a dependência do álcool nos dá conta da motivação que o indivíduo recebe para usar bebidas alcoólicas. Além de constituir uma possibilidade de diversão na hora do lazer, a bebida alcoólica é usada para a aceitação social. A nível social, as pessoas bebem para serem "normais" pois ser abstêmio significa fugir aos padrões da normalidade.

Neste âmbito, a sociedade se revela ambígua pois na medida em que estimula o uso do álcool, depois nega ou marginaliza o alcoólico. Sendo assim a nossa luta no combate ao alcoolismo se torna muito mais difícil.

Na nossa realidade, jamais teve tanta publicidade em torno do álcool com a colocação de gigantescos "outdoors" que inclusive tentam criar uma imagem de grandes homens através da escolher de uma marca de cerveja.

A problemática do alcoolismo carece de ampla reflexão e intervenção das autoridades e um dos maiores agravantes da questão é a falta de conhecimento da população.

Voltando á abordagem da questão dentro dos limites dos centros de saúde, consideramos importante a aposta nas psicoterapias de grupo onde se pode prestar ajuda a um maior número de indivíduos com baixo poder económico, no sentido de solucionar a demanda de tratamento. Também diminuem os custos que o alcoolismo acarreta.

A vivência no grupo aparece assim como uma experiência social continente que estimula o indivíduo a adaptar estilos de vida saudáveis e interagir de forma criativa com o mundo.

Com este relato não tivemos a pretensão de divulgar um modelo de trabalho mas simplesmente partilhar a nossa experiência que se transforma com o tempo e busca a melhoria da qualidade de vida das pessoas.

 

Bibliografia

Mônica Gorgulho

  • Psicoterapia: Uma abordagem dinâmica - Paul Dewald
  • Psiquiatria e Psicopatologia - A. Fernandes da Fonseca