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AS RELAÇÕES HÍDRICAS DAS PLANTAS VASCULARES

 

(5ª Parte)

 

 

Alexandra Rosa da Costa,

PhD (Stirling, U.K.)

 

Departamento de Biologia

Universidade de Évora

Portugal

 

Novembro de 2001

 

          2. O MOVIMENTO DA ÁGUA NO SPAC (Cont.):

 

            2.3. O MOVIMENTO DA ÀGUA NO SOLO:

 

            A água proveniente da precipitação penetra no solo e infiltra-se gradualmente até chegar à toalha freática. Em solos altamente permeáveis a taxa de percolação é de vários metros por ano, em solos argilosos é de cerca de 1 – 2 m e, em solos muito compactos, pode ser de apenas alguns centímetros por ano. Uma parte da água infiltrada, a chamada água capilar, é retida e armazenada nos poros do solo. A quantidade de água retida como água capilar e aquela que se infiltra como água gravitacional depende da natureza do solo e das dimensões e distribuição dos seus poros (figura 15). Poros com menos de 10 mm de diâmetro retêm a água por capilaridade, enquanto que os poros maiores (> 60 mm de diâmetro) deixam a água infiltrar-se mais rapidamente (Larcher, 1995).

            A capacidade de armazenamento da água num solo, isto é, o conteúdo em água em saturação depois da água gravitacional se ter infiltrado para camadas mais profundas, constitui a  chamada  capacidade de  campo  dum  solo e é expressa em  g de H2O por 100 g de solo (% peso seco) ou por 100 ml de solo. Os solos de granulado mais fino e os que são mais ricos em substâncias orgânicas armazenam mais água que os que têm um granulado mais grosso (Larcher, 1995).

Figura 15: O estado da água em solos saturados (a parte esquerda do esquema) e em solos bem arejados (parte direita).

Retirado de Larcher (1995), fig. 4.6, pag. 225

 

 

            A água que permanece num solo depois da passagem da água gravitacional é retida nos poros por capilaridade; pode ficar presa aos colóides do solo e, no caso dos solos salinos, pode ficar osmoticamente ligada a iões. Assim, a energia livre da água no solo, tal como acontece no interior das plantas, é reduzida por certos factores. Na maioria dos solos as contribuições para o potencial hídrico total dadas pelo potencial osmótico, assim como pelo potencial de pressão, podem ser desprezadas. No potencial hídrico dos solos a componente crucial é o potencial mátrico ou “capilar” que é a energia com que a água capilar é retida por forças superficiais. Este potencial pode ter valores bastante consideráveis para solos com poros muito finos. A componente capilar do potencial mátrico pode ser descrito pela fórmula (Larcher, 1995):

                       

em que s é a tensão de superfície da água e d é o diâmetro do poro (em mm). A força com que a água é retida aumenta gradualmente à medida que o solo seca, uma vez que os poros maiores vão ficando vazios e a água capilar permanece apenas nos mais finos (menos de 0,2 mm). Em solos arenosos com uma estrutura granular mais larga a  transição é particularmente abrupta, enquanto que em solos argilosos, em que os poros são mais pequenos, o potencial hídrico varia mais gradualmente (Larcher, 1995).

 

            2.4. O MOVIMENTO DA ÁGUA DO SOLO PARA O XILEMA DA RAIZ:

 

            2.4.1. A ENTRADA DA ÁGUA NA RAIZ:

            A planta pode retirar água do solo desde que o potencial hídrico das suas raízes mais finas seja mais negativo que o da solução do solo na rizosfera. A taxa de entrada de água na planta pode ser descrita pela equação (Larcher, 1995):

                       

em que Wabs é a quantidade de água que as raízes absorvem por unidade de tempo e é proporcional à area de absorção A ou área activa; ao gradiente de potencial hídrico entre a raiz e o solo (Ysolo - Yraiz) e é inversamente proporcional ao somatório das resistências ao movimento da água no solo e à passagem do solo para o interior da raiz (Sr).

            Embora durante o período de crescimento as zonas mais velhas (proximais) fiquem com uma superfície suberizada (periderme), a area activa vai sempre aumentando devido ao crescimento contínuo no ápice radicular.

            As raízes normalmente apresentam potenciais hídricos de alguns décimos de MPa, o que é suficiente para absorver a maior parte da água capilar da maioria dos solos. Isto pode ser visto na figura 16: um valor de apenas –0,2 MPa nas raízes permite-lhes retirar dois terços da água armazenada num solo arenoso; já um solo argiloso que consegue reter a água com mais firmeza devido aos seus poros serem finos, perde metade da sua água capilar para as raízes com um potencial hídrico de apenas –0,6 MPa. Até um certo ponto as plantas conseguem obter mais água dos solos diminuindo activamente o potencial hídrico das suas raízes.  As hidrófitas, isto é, as espécies que vivem em locais de grande humidade podem diminuir o seu potencial hídrico para valores na ordem de –1 MPa; as plantas de interesse agrícola de zonas húmidas podem baixá-lo até –1 ou –2 MPa; as mesófitas podem chegar aos –4 MPa e as plantas de regiões secas (xerófitas) podem chegar aos –6 MPa (Larcher, 1995).

            Devido à extracção da água do rizosfera pelas raízes a água vai movimentando-se a partir de zonas de maior humidade. Este movimento ocorre apenas ao longo de alguns mm por capilaridade e é muito lento.

 

Figura 16: Diagrama onde se pode ver as relações entre o potencial hídrico do solo e o seu conteúdo em água para um solo arenoso e outro argiloso. O valor convencional para a capacidade de campo é de –0,015 MPa, e para o ponto de emurchecimento permanente (PEP) é de –1,5 MPa. Abaixo dos –5 MPa toda a água está ligada higroscopicamente. Os valores médios para os vários tipos de plantas dependem do tipo de solo (textura, dimensões dos poros) e da vegetação. Estes valores podem ser menores devido ao ajustamento das plantas a situações de deficiência hídrica. As setas indicam os valores de potencial hídrico radicular que permitem retirar dois terços da água dum solo arenoso e metade da água num solo argiloso.

Retirado de Larcher (1995), fig.4.7, pag. 226

 

 

            2.4.2. O MOVIMENTO RADIAL RADICULAR DA ÁGUA:

 

            No solo o movimento da água faz-se essencialmente por fluxo em massa. No entanto, assim que a água fica em contacto com a rizoderme o seu movimento torna-se mais complexo (Taiz & Zeiger, 1998). Para se poder perceber a complexidade do movimento da água na raiz há que conhecer um pouco melhor a sua anatomia (figura 17)

Figura 17: Esquema dum corte transversal duma raiz primária de trigo (Triticum aestivum), na zona pilosa, mostrando as três vias para o movimento radial radicular da água.

Adaptado de Salisbury e Ross (1992), fig.7.7, pag. 140

 

            Assim, teremos do exterior para o interior:

¨       O sistema dérmico constituido, em raízes jovens, por uma epiderme, em que algumas células têm um formato diferente, constituindo projecções para o solo, e que são os pêlos radiculares;

¨        O sistema fundamental, constituido por várias camadas de células - o cortex, e a camada mais interna que é a endoderme com características especiais de que falaremos mais adiante.

¨       O sistema vascular em que a camada mais externa é o periciclo, e em que o floema e o xilema se dispõem alternadamente ao longo dos raios.

           Nas plantas sujeitas a um regime hídrico adequado ao seu bom desenvolvimento o movimento da água da rizoderme até à endoderme ocorre segundo três vias: a apolplástica; a simplástica e a transcelular. Em termos experimentais as duas últimas são difíceis de distrinçar e consideram-se como um movimento de célula a célula (Steudle, 2001).

           Como vimos anteriormente a água movimenta-se sempre segundo um gradiente decrescente de potencial hídrico (do menos negativo para o mais negativo). De acordo com a estrutura radicular o fluxo da água através da raiz tanto pode ser hidráulico (diferenças de pressão) como osmótico (diferenças de potencial osmótico). A contribuição relativa destas duas componentes do potencial hídrico para o movimento da água varia com as condições.

           Como não há membranas através da via aploplástica o fluxo hidráulico domina nesta via. O fluxo pelo apoplasto é realizado através dum meio poroso sem qualquer capacidade selectiva, isto é, o seu coeficiente de reflecção é igual ou perto de zero. Consequentemente diferenças de potencial osmótico das células não causam praticamente nenhum movimento da água (Steudle, 2001). Já na via célula a célula, têm de ser considerados os gradientes osmóticos para além dos hidráulicos. Ao contrário das paredes, as membranas têm capacidade selectiva e o seu coeficiente de reflecção é próximo de um (Steudle, 2001).

           As respostas das raízes a vários factores diferem dependendo de se estabelecer, entre a solução do solo e o xilema, uma  diferença de pressão hidrostática ou uma diferença de potencial osmótico. As diferenças desaparecem na presença de barreiras apoplásticas que interrompem completamente o fluxo apoplástico, ou então na presença de membranas totalmente permeáveis à água. Ambas as situações extremas existem nas raízes das plantas (Steudle, 2001).

           Devido às características das suas paredes a endoderme é considerada como sendo a barreira principal ao movimento apoplástico da água e sais minerais provenientes da solução do solo (figura 18). No entanto, há muitos dados que indicam que em certas situações de stresse, abaixo da epiderme se forma uma camada de células com características semelhantes à endoderme e que é a exoderme (Schreiber et al., 1999). Esta também pode desempenhar um papel muito importante enquanto barreira ao movimento apoplástico (figura 19).

           As barreiras ao movimento célula a célula são dadas pela maior ou menor abertura das aquaporinas que dependen muito do metabolismo (Zimmerman et al., 2000)

 

            2.4.3. FACTORES QUE AFECTAM A ABSORÇÃO DA ÁGUA:

             

            A taxa de absorção da água pelo sistema radicular depende de factores quer endógenos, quer exógenos. Dos endógenos é importante salientar o desenvolvimento dos pêlos radiculares e o seu potencial hídrico. Dos exógenos, os mais importantes são a temperatura, a presença de O2 e CO2, a humidade do solo, e as propriedades do perfil da vegetação.

 

Figura 18: Maturação da endoderme numa plântula de milho (Zea mays L.). Secções transversais foram examinadas ao microscópio óptico após coloração com Vermelho Sudão III (corante lipofílico). (a) Secção a 4 cm do ápice, onde se pode observar a endoderme primária com Bandas de Caspary (setas brancas); (b) Secção a 12 cm do ápice. transição entre a endoderme primária (setas) e secundária com lamelas de suberina (coradas a vermelho); (c) Secção a 20 cm do ápice, o desenvolvimento secundário já se completou e cada célula da endoderme apresenta uma lamela de suberina; (d) Início do desenvolvimento terciário com paredes secundárias em forma de U sobre a lamela de suberina; (e) Estado avançado do desenvolvimento terciário com uma deposição de material de parede secundária em U mais desenvolvida.

Retirado de Schreiber et al. (1999), fig. 1, pag. 1269

 

Figura 19: Secções transversais de raízes de milho (Zea mays L.) com 8 dias de vida desenvolvidas aeropónicamente (sem meio líquido ou sólido, em elevada humidade relativa, “mist”) de forma a desenvolver uma exoderme. (A) Secção a 50 mm do ápice coradas com berberine-aniline observada em UV/violeta (390-420 nm): ex exoderme madura (estado secundário) com bandas de Caspary (setas); en endoderme (estado primário) com bandas de Caspary (setas); emx xilema inicial maduro; lmx metaxilema tardio imaturo; (B) células da endoderme a 80 mm do ápice com bandas de Caspary (setas); (C) células da exoderme a 80 mm do ápice com lamela de suberina (ex); (D) células da endoderme a 200 mm do ápice com lamela de suberina (setas); (E) células da exoderme a 200 mm do ápice com lamela de suberina (ex).

Retirado de Zimmermen et al. (2000), fig. 1, pag. 306

 

 

            2.4.3.1. Desenvolvimento dos pêlos radiculares:

 

            O crescimento dos pêlos radiculares é aproximadamente de 0.2 a 0.4 mm por hora, isto é, 5 a 10 mm por dia (Sebanek,1992). Pensa-se que a causa principal do grande crescimento dos pêlos radiculares é a imobilidade da água num solo parcialmente seco. A superfície total dos pêlos radiculares representa uma enorme área de absorção da água do solo (figura 20).

 

 

Figura 20: Os pêlos radiculares e a absorção da água. (A) Pêlos radiculares do rabanete (Raphanus sativus ); (B) Os pêlos radiculares aumentam a absorção da água pela capacidade de penetrar nos espaços capilares cheios de água entre as partículas de solo; (C) Os pêlos radiculares aumentam várias vezes o volume do solo a partir no qual uma raiz pode extrair água.

Hopkins (1995), Fig. 3.17, pag. 61

 

            2.4.3.2. Potencial hídrico dos pêlos radiculares:

 

            Se o potencial hídrico dos pêlos radiculares for mais baixo que o da água do solo, então, entrará água para o seu interior. Se o potencial hídrico dos pêlos aumentar (ficar menos negativo), a água pode deixar de entrar para o seu interior, o crescimento das plantas é inibido ou pode mesmo parar, as plantas murcham e diminui a produção (Sebanek, 1992).

 

            2.4.3.3. Temperatura:

 

            O efeito de baixas temperaturas na absorção da água pelo sistema radicular das plantas é muito importante. Por exemplo, em pepino (Cucumber sativus), em tabaco (Nicotiana tabacum), e noutras espécies ocorre uma diminuição acentuada da absorção da água a temperaturas de 5 a 10 ºC, que pode mesmo parar completamente a temperaturas abaixo dos 4 ºC levando à paragem do crescimento e à morte da planta (Sebanek,1992).

 

            2.4.3.4. Oxigénio e dióxido de carbono:

 

            A falta de oxigénio pode parar a absorção de água pelo sistema radicular levando à paragem do crescimento. No solo o conteúdo óptimo em oxigénio é da ordem dos 10 a 12 %. Do mesmo modo um nível demasiado elevado ou demasiado baixo em CO2 inibe, ou pode mesmo parar, a absorção de água pelas plantas. O conteúdo óptimo em CO2 do solo é de cerca de 5 a 15 % (Sebanek, 1992).

 

            2.4.3.5. Humidade do solo:

 

            A absorção óptima de água pelas plantas ocorre de 60 a 70 % da capacidade máxima do solo. Para prados, plantas hortícolas e plântulas de espécies lenhosas em viveiros, este valor pode atingir os 80 % (Sebanek, 1992)

 

            2.4.3.6. Perfil da vegetação:

 

            Em condições óptimas, o chamado perfil da vegetação, isto é, a camada radicular da maior parte das plantas cultivadas, situa-se entre 1.7 a 3.0 m de profundidade. No entanto, existem plantas com sistemas radiculares mais superficiais e outras com sistemas radiculares mais profundos. Por exemplo, a batata (Solanum tuberosum) e a alfafa (Medicago sativa) apresentam sistemas radiculares que se estendem a 0.6 e 16.0 m, respectivamente. A grandeza do sistema radicular pode ser definida em função da profundidade pela largura do sistema radicular. Normalmente, a extensão em largura das raízes é proporcional à sua extensão em profundidade (figura21 A e B). As raízes podem desenvolver-se extensivamente, quando há poucas raízes para um grande volume de solo: é o caso das espécies em que são colhidas as raízes; ou de certas árvores como o pinheiro ou a bétula. As raízes também se podem desenvolver intensivamente, quando o número de raízes por volume de solo é elevado, como é o caso dos cereais (Sebanek, 1992).

 

 

Figura 21: Sistema radicular de uma macieira (Malus sp. ) (A) Extensão em largura e (B) Extensão em profundidade

Retirado de Peréz (1999), pag. 125 e 126

 

 

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