Diabetes gestacional
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ENDOCRINOLOGIA - JOSIVAN LIMA



DIABETES E GESTAÇÃO

Josivan Gomes de Lima - Centro de Endocrinologia de Natal

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      ETIOLOGIA

      A gestação é um período de stress fisiológico, onde se exige muito das células b pancreáticas para contrabalançar as ações dos hormônios contra-reguladores 2,4 (progesterona, cortisol, hormônio somatotrófico coriônico [lactogênio placentário humano], prolactina e estrógeno)4. Durante este período, o desenvolvimento de diabetes vai depender da presença de uma adequada reserva funcional destas células pancreáticas: se a secreção de insulina não aumenta suficientemente para compensar a diminuição fisiológica da sensibilidade à mesma, a gestante irá desenvolver um quadro de diabetes mellitus.2

      As alterações próprias da gravidez provoca uma diminuição na glicemia de jejum e um aumento na pós-prandial.2

      Devemos diferenciar os casos de diabetes gestacional daqueles já existentes antes da gravidez, pois aqueles habitualmente restringem-se à gestação (apesar de haver maior tendência a desenvolver futuramente um quadro franco de diabetes), enquanto que estes se continuam após o parto.2 Os casos diagnosticados antes da 20a semana de gestação muito provavelmente não se tratam de diabetes gestacional, mas sim de casos de diabetes não diagnosticados previamente.

      Raramente, pode ocorrer ainda a destruição autoimune precoce das células b pancreáticas, evoluindo a paciente para um quadro de diabetes mellitus tipo I.2

      DIAGNÓSTICO

      Naqueles locais onde a prevalência de intolerância à glicose e de diabetes mellitus tipo II é elevada, uma avaliação já no primeiro trimestre seguida, se necessário, por um teste diagnóstico é importante.

      Tal avaliação também é recomendada naquelas pacientes de risco: história familiar de diabetes; recém nascido de parto anterior com peso superior a 4,1kg; peso da mãe superior a 90 kg e/ou idade maior que 28 anos; morte fetal intra-uterina prévia não esclarecida; história prévia de diabetes gestacional.1, 4

      Estes fatores identificam aproximadamente 50% das mulheres com diabetes gestacional.4 A confirmação do diagnóstico requer um screening no final do segundo trimestre (entre 24 e 28 semanas)4, porém se houver suspeita de haver diabetes pré-gestacional, já se deve fazer a investigação na primeira visita.

      O quadro clínico, quando presente, não difere daquele do diabetes mellitus pré-gestacional, apresentando a paciente poliúria e polidipsia, entre outros sintomas. Entretanto, o diagnóstico de diabetes gestacional freqüentemente requer testes orais de tolerância à glicose, não havendo no entanto um consenso a respeito de qual dose de glicose deve ser administrada.1, 2

      Os estudos destes testes utilizaram o peso da criança ao nascer e a hipoglicemia neonatal como critérios diagnósticos observados a curto tempo, enquanto que o desenvolvimento de diabetes materno no futuro foi um critério a longo tempo.2 O teste de 50g de glicose com dosagem da glicemia após 60 minutos tem sido recomendado pela American Diabetes Association como screening entre a 24 e 28 semanas: caso a glicemia seja maior que 140 mg%, indica-se o teste de 100g utilizando os critérios de O'Sullivan.

      O teste com 75g é o recomendado pela Organização Mundial de Saúde.2 Dosa-se a glicemia basal e 2 horas após a administração de 75g de glicose, considerando-se como tendo diabetes gestacional aquelas pacientes que apresentam uma glicemia de jejum maior que 140 mg% e/ou que preencherem os critérios de intolerância à glicose na não grávida (glicemia após 2 horas entre 140 e 200 mg%). Porém, pelas alterações próprias da gravidez, torna-se difícil aceitar uma glicemia de jejum de 140 mg% para uma grávida como sendo normal.1 Os critérios da OMS são, atualmente os mais utilizados.

      A Associação Européia para o estudo do diabetes também preconiza a utilização do teste com 75g de glicose, porém utiliza os seguintes valores da glicemia: 94 mg% (jejum); 162 mg% (2 horas).

      O teste com 100g de glicose, com dosagens da glicemia após 1, 2 e 3 horas utiliza os critérios de O'Sullivan e Mahan: 105 mg% (jejum); 190 mg% (1h); 165 mg% (2h); 145 mg% (3h).

      Apesar de não ter sua reprodutibilidade testada, utilizar critérios obtidos na década de 50 (com métodos de dosagem de glicemias diferentes dos atuais), acrescentando 2 desvios padrão à média de forma estatisticamente arbitrária, com mulheres predominantemente no final da gravidez 1, o 3O International Workshop Conference On Gestational Diabetes Mellitus (1990) ainda recomenda estes critérios diagnósticos.

      TRATAMENTO

      Deve-se manter uma supervisão materna e fetal com a finalidade de detectar precocemente alterações na hemostasia da glicemia que possam acarretar riscos para a mãe ou para o feto.

      A monitorização da glicemia deve ser realizada em jejum e 1 hora após cada refeição, considerando como metas uma glicemia capilar de jejum de 90 mg% (equivalente a 105 mg% no plasma) e uma pós-prandial de 120mg% (140mg% no plasma).2, 5

      Comparando glicemias pré e pós-prandiais, observa-se que o ajuste glicêmico baseando-se na glicemia pós-prandial proporciona melhor controle glicêmico, diminuindo o risco de macrossomia3,8, hipoglicemia neonatal, e partos cesários.3 Devido as alterações hemodinâmicas (aumento do débito cardíaco com conseqüente aumento da taxa de filtração glomerular e diminuição da reabsorção tubular de glicose) o controle através da glicosúria não é adequado e nem suficiente. Cerca de menos de 1% das mulheres com glicosúria positiva tem alteração glicêmica.

      O regime terapêutico consiste no manuseio adequado da dieta, na monitorização das glicemias e na administração de insulina se o controle glicêmico não for obtido só com a dieta. Cerca de 15% das gestantes com diabetes gestacional requerem insulinoterapia.5 Os hipoglicemiantes orais não devem ser prescritos durante a gestação.

      A ingesta calórica diária deve ser calculada de acordo com o peso: 40 kcal/kg para as gestantes com menos de 80% do peso ideal; 30 kcal/kg para aquelas com peso entre 81-120% do ideal; 24 kcal/kg se o peso está 121-150% do ideal e 12-15 kcal/kg se a paciente tem obesidade mórbida (>150% do peso ideal).5 Apenas 10% das calorias devem ser ingeridas no desjejum, pois na gestação a resistência à insulina pela manhã é maior devido à potencialização da hipercotisolemia que naturalmente ocorre.5

      A composição dietética recomendada é de 55% de carboidratos, 20% de proteínas e 25% de gorduras, com menos de 10% de gordura saturada.6 Outros autores recomendam uma menor ingesta de carboidratos (40%) e mais gordura (40%), justificando que a glicemia pós-prandial é diretamente dependente da ingesta de carboidratos.5, 7 Devendo-se substituir os carboidratos refinados pelos complexos.

      Se o controle glicêmico não é alcançado com a dieta sozinha (glicemia de jejum maior que 90mg% e glicemia pós-prandial maior que 120mg% em duas ou mais ocasiões com um intervalo de uma semana), a insulinoterapia (insulina humana) deve ser iniciada.2, 5

      A dose, o tipo de insulina e o horário de administração depende de qual glicemia está elevada. Se a glicemia de jejum é maior que 90mg%, insulina NPH bedtime é administrada na dose de 0,15U/Kg. Se glicemia pós-prandiais são elevados, insulina regular é dada antes da refeição, na dose de 1,5U para cada 10g de carboidrato no desjejum e 1,0U/10g de carboidrato no almoço e no jantar. Se as glicemias de jejum e as pós-prandiais estão elevadas então 4 injeções são dadas, com as doses de 0,7U/Kg (6 a 18 semanas de gestação), 0,8U/Kg (18-26semans) ou 0,9U/Kg (26-36 semanas), sendo 45% como insulina NPH (30% antes do desjejum e 15% bedtime) e 55% como insulina regular (22% antes do desjejum, 16,5% antes do almoço e 16,5% antes do jantar).5 As doses são modificadas de acordo com os resultados das glicemias subseqüentes.

      Alguns autores acreditam que o diabetes gestacional seria um diabetes mellitus não insulino dependente (DMNID) que foi desencadeado pela gestação5, 9, de modo que exercícios físicos diminuiriam a resistência à insulina, melhorando o controle.10,12 Entretanto, episódios de bradicardia fetal têm sido descritos durante o exercício materno.11 A gestante deve ser orientada a palpar seu útero durante os exercícios para tentar detectar contrações e, se estas ocorrerem, parar os exercícios. As contra-indicações incluem sangramento vaginal, placenta prévia, doença cardíaca, hipertensão, retardo do crescimento intra-uterino e obesidade extrema.5

      Exercícios usando os membros e evitando o estresse mecânico do tronco parecem apropriados, sem danos para o feto.5 A grande maioria das gestantes voltam à normoglicemia após o parto, sendo que 2/3 apresentarão novamente diabetes em uma gestação subseqüente;13 20% terão intolerância à glicose no período pós parto e cerca de 50% terão DMNID após 5 anos do parto.5

      Logo após o parto, deve-se assegurar que a glicemia voltou ao normal e, após 6 a 8 semanas, realizar um teste de tolerância à glicose com 75g.5,6 Aquelas pacientes que não apresentam DMNID devem ser orientadas a respeito do risco de desenvolvê-lo futuramente e aconselhadas para manter um peso próximo do ideal e fazer exercícios. Uma glicemia de jejum anual deve ser realizada.


      Bibliografia recomendada:

      1 - Vaisman M, Tendrich M. Gravidez e diabetes. In: Diabetes mellitus na prática clínica, Editora Cultura Médica. Rio de Janeiro, 1994, pp. 137- 149.

      2 - Dornhorst A, Girling JC. Management of gestational diabetes mellitus. Não Engl J Med. 1995; 333: 1281-2.

      3 - de Vecinia M, Major CA, Morgan MA, et al. Postprandial versus preprandial blood glucose monitoring in women with gestational diabetes mellitus

      requiring insulin therapy. N Engl J Med. 1995; 333:1237-41.

      4 - Jovanovic-Peterson L, Peterson CM. Screening and diagnosis of gestational diabetes mellitus. UpToDate in Medicine 1996.

      5 - Jovanovic-Peterson L, Peterson CM. Treatment and course of gestational diabetes mellitus. UpToDate in Medicine 1996.

      6 - Metzger, BE. Organizing Commitee: Summary and recommendations of the Third International Workshop-Conference on Gestational Diabetes. Diabetes 1991; 40 (suppl 2):197.

      7 - Peterson, CM, Jovanovic-Peterson, L. Percentage of carbohydrate and glycemia response to breakfast, lunch, and dinner in women with gestational diabetes. Diabetes 1991: 40 (Suppl 2):172.

      8 - Jovanovic-Peterson L, Peterson CM, Reed GF, Metzger BE, Mells JL, Knopp RH, Aarons JH. Post prandial blood glucose levels predict birth weight: the diabetes in early pregnancy Study. Am J Obstet Gynecol 1991; 164:103-11.

      9 - Harris, MI. Gestational diabetes may represent discovery of preexisting glucose intolerance. Diabetes Care 1988; 11:402-11.

      10 - Pedersen O,Beck-Nielson H,Hending L. Increased insulin receptor after exercise in patients with insulin-dependent diabetes mellitus. N Engl J Med 1980; 303:886-92.

      11 - Artal R, Romen Y, Paul RH, Wiswell R. Fetal bradycardia induced by maternal exercise. Lancet 1984; 2:258-60.

      12 - Horton ES. Exercise in the treatment of NIDDM. Applications for GDM ? Diabetes 1991; 40 (suppl 2):175-8.

      13 - Phillipson EH, Super DM. Gestational diabetes mellitus: does it reoccur in subsequent pregnancy ? Am J Obstet Gyneccol 1989; 160:1324.