C.L. |
(Clarice Lispector - Trecho de Água Viva) "...tenho que interromper para dizer que "X" é o que existe dentro de mim. "X" _ eu me banho neste isto. É impronunciável. Tudo que não sei está em "X". A morte? a morte é "X" Mas muita vida também pois a vida é impronunciável. "X" que estremece em mim e tenho medo de seu diapasão: vibra como uma corda de violoncelo, corda tensa que quando é tangida emite eletricidade pura, sem melodia. O instante é impronunciável. Uma sensibilidade outra é que se apercebe de "X" Espero que você viva "X" para experimentar a espécie de sono criador que se espreguiça através das veias. "X" não é bom nem ruim. Sempre independe. Mas só acontece para o que tem corpo. Embora imaterial, precisa do corpo nosso e do corpo da coisa. Há objetos que são esse mistério total do "X". Como o que vibra mudo. Os instantes são estilhaços de "x" espocando sem parar. O excesso de mim chega a doer. E quando estou excessiva tenho que dar de mim. Como o leite que se não fluir rebenta o seio Livro-me da pressão e volto ao tamanho natural A elasticidade exata Elasticidade de uma pantera macia Uma pantera negra enjaulada Uma vez olhei bem nos olhos de uma pantera e ela me olhou bem nos meus olhos Transmutamo-nos Aquele medo Saí de lá toda ofuscada por dentro, o "x" inquieto. Tudo se passara atrás do pensamento. Estou com saudade daquele terror que me deu trocar de olhar com a pantera negra. Sei fazer terror "X" é o sopro do it? é a sua irradiante respiração fria? "X" é palavra? A palavra apenas se refere a uma coisa e esta é sempre inalcançavel por mim. Cada um de nós é um símbolo que lida com símbolos _ tudo ponto de apenas referência ao real. Procuramos desesperadamente encontrar uma identidade própria e a identidade do real. E se nos entendemos através do símbolo é porque temos os mesmos símbolos e a mesma experiência da coisa em si: mas a realidade não tem sinônimos. |