Abaixo segue o trabalho de monografia sobre a História das Ferrovias, apresentado pelo associado Ivanil Numes, para o curso de Ciências Sociais, da UNESP.
- PROJETO DE PESQUISA
- AS FERROVIAS EM SÃO PAULO - 1860/1960
INTRODUÇÃO
- CAPÍTULO I
- CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA
1 - A ferrovia no Brasil
2 - As primeiras ferrovias
3 - Café e ferrovia
4 - Os barões do café
5 - A mão-de-obra e a ocupação da terra
6 - A ferrovia no contexto
- CAPÍTULO II
- AS TRANSFORMAÇÕES
DO SISTEMA FERROVIÁRIO
- CAPÍTULO III
AS FERROVIAS DE FATO NAS MÃOS DO ESTADO
1 - A "solução"
paulista
2 - O ponto de vista dos trabalhadores
3 - Privatização sem traumas
- CONCLUSÃO
- BIBLIOGRAFIA
- ALUNO - IVANIL NUNES
- CURSO - CIÊNCIAS SOCIAIS
- ORIENTAÇÃO - Profª Drª Vera Lúcia S. Botta Ferrante
- dez/1993
PROJETO DE PESQUISA
TEMA: AS FERROVIAS EM SÃO PAULO
OBJETIVO: Discutir a participação
do Estado na formação do sistema ferroviário
paulista.
METODOLOGIA: Será utilizado bibliografias referentes ao
tema, bem como levantamentos primários a partir de relatórios
anuais das ferrovias paulistas, à disposição
na biblioteca ferroviária da FEPASA, localizada à
rua Barra Funda 630, São Paulo.
SOBRE O TEMA
O discurso da ineficiência
estatal, tema em moda lançado pelo neo liberalismo e corroborado
pela real utilização do Estado para o atendimento
de interesses privados, parece reproduzir na formação
de uma determinada opinião na sociedade de que toda instituição
governamental é por "natureza" corrupta, ineficiente,
improdutiva, etc. No caso da ferrovia no Brasil, essa aparência
é reforçada se observarmos as condições
das suas linhas, locomotivas, vagões, trens de passageiros,
etc. Utilizando tecnologia que em alguns casos ultrapassam cinquenta
anos , traçado secular e forma de gestão ultrapassada,
as ferrovias parecem aguadar segundo esse discurso, a "salvação"
que virá da iniciativa privada para que o choque de racionalidade
e eficiência interrompa essa etapa de marasmo em que se
encontra esse patrimônio público.
É sobre esse raciocínio que nos parece falso, que
passaremos a discutir no referido trabalho, restringindo porém
o campo de pesquisa ao Estado de São Paulo e ao período
1930/1990. A escolha de São Paulo está pela sua
importância econômica e política, assim como
pelo entendimento de que a economia cafeeira foi responsável
pela dinamização da ferrovia em sua caminhada para
o oeste paulista a partir da necessidade econômica e política
dos barões do café e atuais donos da agro-industria
paulista, que continuam a se utilizar dos serviços dessa
mesma ferrovia, agora porém, estatizada.
As grandes ferrovias em São Paulo nascem sob comando da
inciativa privada e se desenvolvem, praticamente todo o seu traçado
durante a chamada República Velha; porém, com forte
indício dessa expansão se dar em total afinação
com o governo do Estado, que sob hegemonia das oligarquias fazia
da política de valorização do café
uma forma de governar. Para se ter noção dessa expansão,
podemos constatar que em 1901, havia no Estado um total de 3.471
quilômetros de linhas férreas(1), chegando-se em
1940 a atingir um total de 8.622 quilômetros(2), estagnando-se
no período posterior ou mesmo reduzindo-se até os
dias atuais.
Portanto, existem indícios que serão melhor elaborados
no decorrer dessa pesquisa, de que a formação e
expansão da ferrovia no Estado de São Paulo e mesmo
sua encampação estatal após os anos 40 com
o declínio do café, parecem ocorrer em sintonia
com os interesses da agro-indústria paulista que desde
a sua inauguração utiliza-se dessas ferrovias. Dessa
maneira, fica prejudicado o discurso neo liberal em sua linha
mestra uma vêz que o empresariado paulista, principalmente
o agro-exportador, parece utilizar-se bem e a contento dessa ferrovia
que o serve quase exclusivamente em detrimento do setor de passageiros
que tem ficado excluido
das melhorias implementadas pelo Estado a partir dos anos 30.
Assim, esse discurso neo liberal, essencialmente ideológico,
poderia estar servindo muito mais na realidade, para uma nova
readequação da relação empresariado/ferrovia,
ou seja iniciativa privada e poder público, provavelmente
através da tercerização,em função
da privatização exigir grande quantidade de capitais
que teria que ser ai aplicado.
Sendo assim, a participação estatal, no caso ferroviário
continua a ser de atendimento a elite agroindustrial e aos seus
interesses ainda hegemônicos no setor. Se atentarmos para
o fato de que em 1970 as cinco empresas que vieram a formar a
FEPASA - Estrada de Ferro Sorocabana, Cia Paulista de Estradas
de Ferro, Cia Mogiana, Estrada de Ferro Araraquara e Estrada de
Ferro São Paulo Minas - transportavam perto de dez milhões
de toneladas com um total de 36 mil funcionários - e que
esse mesmo conjunto de empresas, agora unificados sob direção
estatal passou a a transportar 22 milhões de toneladas
na década de 1990, poderemos perceber que o discurso da
ineficiência estatal precisa ser melhor preparado para se
mostrar pertinente, uma vêz que seus elementos não
acertam o alvo, a saber o governo supostamente ineficiente. Se
o discurso empresarial da privatização da vida social
não considera as benesses recebidas em todos esses anos,
certamente está maculado em sua estruturação
pela carga ideológica neo liberal que procura "esconder"
a real participação da elite nesse mesmo governo,
ao mesmo tempo que utilizam-se do patrimônio público
como "sempre" o fizeram, desde os barões do café,
mesmo antes da República.
HIPÓTESES
1 - a ferrovia faz parte do complexo cafeeiro, portanto contribui para a realização do sistema de produção agro-exportador, uma vêz que, a implantação das ferrovias em São Paulo coincide com a hegemonia dos cafeicultores no aparelho do Estado, e sua expansão para o Oeste.
2 - O Estado contribuiu para a implantação das companhias férreas e assumiu a administração de diversas ferrovias diretamente, adequando-as para a construção de um sistema ferroviário, ampliando traçados e assumindo obras após o início da crise do complexo cafeeiro, iniciada no final do século XIX.
3 - O fim da chamada "era ferroviária" localiza-se por volta da década de 1940; coincide com fim dos regimes das oligarquias, crise da economia cafeeira, implantação do sistema ferroviário e indústria automobilistica nos anos 50.
4 - Os anos 1960/90, período em que o Estado, após assumir diretamente o controle das ferrovias passa a racionalizar o sistema, implementando corte de ramais considerados ociosos, diminuindo o número de empregados, aumentando a capacidade transportada e passando a fazer parcerias com a iniciativa privada, etc.
1 - A expansão do plantio do café ocorre na década de 1830; no mesmo período, a chamada Lei Feijó de 31 de outubro de 1835 estimulava a construção de uma Estrada de ferro que ligasse a capital do Império às províncias de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Bahia. Em 1840, o café passa a ser o principal produto de exportação(3) e a partir daí se expande do Rio de Janeiro para a Região do Vale do Paraíba, e do Vale para o interior paulista, utilizando a ferrovia como meio de transportes em substituição ao lombo de mulas, que custavam aproximadamente seis vezes mais que o transporte ferroviário(3). O período da economia cafeeira (1850/1929), coincide com o surgimento das ferrovias, que possuiam 14,5 quilômetros em 1854 e chegam em 1929 a 32 mil quilômetros, com alterações insignificantes a partir daí, chegando mesmo a se reduzir em relação aos anos 90. Por fazer parte desse complexo, as ferrovias também foram beneficiadas com a ação do Estado que contribuiu decisivamente para a implantação, expansão e em vários casos, a manutenção de companhias, aparentemente, dentro do mesmo principio da política de valorização do café que consistia em repatir a crise iniciada no início do século XIX, com o conjunto da sociedade(4).
2 - A Lei No 101, de 31 de outubro
de 1835 assegurava privilégios à empresa que se
dispusesse a construir estrada de ferro. Já a Lei No 641,
de 26 de junho de 1852, além dos privilégios, garantia
juros de até 5% que começariam a ser reembolsados
aos Estado quando a situação da empresa propriciasse
distribuição de dividendos superior a 5%. Além
da taxa de 5% garantida pela União, províncias como
São Paulo, Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro concediam
juros suplementares de mais 2%(5).
Desde as primeiras ferrovias, o Estado intervém direta
ou indiretamente. Vale citar o caso da Estrada de Ferro Dom Pedro
II, primeira ferrovia brasileira, inaugurada em 1854; ao passar
para o controle da União em 1865, amplia suas linhas, do
pouco mais de cem quilômetros para aproximadamente 3.500
quilômetros. Através de recursos públicos,
atingiu São Paulo (1875), Belo Horizonte (1895) e ampliou
suas linhas no Estado do Rio de Janeiro. Também como investimento
da União em São Paulo (e Mato Grosso), a construção
da Estada de Ferro Noroeste do Brasil, com projetos iniciados
após a Guerra do Paraguai , contempla a necessidade da
expansão agrícola e integração nacional,
ao ligar o "distante" Mato Grosso a Capital (Rio de
Janeiro) no início desse século. A nível
Estadual podemos citar: a) Estrada de Ferro Araraquara, inaugurada
em 1898 (Araraquaa a Ribeirãozinho, atual Taquaritinga),
passa para o controle do Estado em 1919, e após isso amplia
suas linhas até a divisa com o Mato Grosso (Santa Fé
do Sul), e entre várias obras de melhorias, podemos destacar
a remodelação do traçado e adequação
da bitola ao tráfego mútuo a Companhia Paulista
de Estradas de Ferro
b) Estrada de Ferro Sorocabana, inaugurada em 1875, veio a falir
em 1902, e após o período de breve encampação,foi
vendida a um grupo norte-americano em 1907, retornando ao controle
do Estado de São Paulo em 1919. Após a segunda encampação
passou por ampliação de suas linhas e construção
de ramais. Entre as obras importantes, destacamos a contrução
do Ramal de Evangelista de Souza, concluido em 1935, que passou
a possibilitar a ligação com o Porto de Santos em
alternativa a Estrada de Ferro São Paulo Railway, (Santos
a Jundiai).
c) Estrada de Ferro São Paulo minas, inaugurada em 1893,
ligando Bento Quirino a São Sebastião do Paraiso,
é encampada pelo governo Estadual em 1931 e após
diversas obras, tem seu traçado adequado operacionalmente
à Companhia Mogiana de Estradas de Ferro, a qual passa
a interligar-se a partir de 1934.
d) A Companhia Mogiana de Estradas de Ferro, inaugurada em 1875
passa para o controle estatal em 1952.
e) A Companhia Paulista de Estradas de Ferro, inaugurada em 1872,
passa para o controle acionário do Estado (somente) em
1961. As duas últimas têm em comum o fato de serem
as últimas a "submeter-se" ao controle estatal
após a denominada "era ferroviária".
3 - "Constituida pois, atendendo aos interesses e as conveniências dos fazendeiros, a rede ferroviária paulista, no seu aspecto arboricular, dá nos hoje a impressão de total ausência de plano, o que implica em que, superado o fundamento econômico que a motivou, pela natural itinerância do café, ou por decorrência de fatores externos que condicionaram o apelo as rodovias, elas tenham se tornado anti-econômicas, praticamente sem função em muitos de seus trechos que acabaram por sendo suprimidos".(6) Nesse sentido a Lei 2698 de 27 de dezembro de 1955, que passa a autorizar a erradicação de ramais considerados ociosos, vem a dar o golpe de misericórdia na era ferroviária em pleno governo JK. Era a consolidação da indústria automobilistica e do capital industrial, iniciada nos anos 30, que agora se definia enquanto hegemônicos no aparelho do Estado.
4 - A partir da década
de 1960, a intervenção direta do Estado, a nível
federal com a criação da RFFSA em 1957 e criação
da FEPASA, a nível Estadual em 1971), uma nova etapa começa
a ser implementada sob a tutela do Estado de São Paulo,
quando a última grande estrada de ferro privada passa para
o controle estatal em 1961. Nesse sentido, a organização
de um sistema, com regras e diretrizes unificadas para o conjunto
das ferrovias paulista, inicia-se formalmente a partir de 1961,
quando o Instituto de Engenharia de São Paulo, em estudos
realizados naquele ano sugeria a formação da RFP
- Rede Ferroviária Paulista - sob controle estatal. Foram
encaminhados projetos de Lei a Assembléia Legislativa nos
anos de 1962, 66 e 1971, quando foi finalmente aprovado a formação
da FEPASA - Ferrovia Paulista S/A.
Paralelo a essa discussão, em 29 de maio de 1967, a Estrada
de Ferro São Paulo Minas, passa a ser administrada pela
Companhia Mogiana, que já era estatizada desde 1952; A
Estrada de Ferro Araraquara, no mesmo ano, passa a ser administrada
pela Companhia Paulista de Estradas de Ferro. Reunidas à
Sorocabana que já era estatal desde 1919, formam a "nova"
empresa ferroviária que ao se constituir em 10 de novembro
de 1971, através de Assembléia Geral de Fundação,
contava com 36.665 funcionários, 5.251 quilômetros
de vias, 622 locomotivas, 1109 carros de passageiros de longo
percurso, 116 trens unidades para transporte urbano e 17.200 vagões
transportando aproximadamente 10 milhões de toneladas/ano(7).
Adotando uma política de racionalização do
sistema sob controle estatal essas empresas reduzem o número
de funcionários e aumentam a quantidade de cargas transportada
com menos vagões. Em 1975 o quadro de funcionários
é reduzido para 24.892, caindo em 1980 para 19.656, chegando
em 1990 a apenas 18.603, além de paresentar tendências
de quedas no ano de 1991, (17.658 empregados ativos)(7).
Esse conjunto de empresas, que fundiu-se numa só, na década
de 90 (19 anos depois), apresenta dados, que apesar de não
"falarem por sí" levanta questões que
nos remete a avaliarmos a eficiência empresarial da gestão
estatal no trato das ferrovias paulistas. Reduz o número
de locomotivas para 496 (menos 20%); reduz a frota de carros de
passageiros de longo percurso para 266 (menos 276%); reduz o número
de funcionários, como vimos acima, para 18.603, (menos
42%); amplia (somente) os trens unidades para transporte urbano
que passam a contar com 422 unidades (mais 263%) e para concluir
a comparação entre os dois períodos, a quantidade
transportada que é o produto fim da ferrovia aparece como
síntese da suposta eficiência. Aumenta para 22 milhões
de tonelada/ano com perspectivas de ampliação para
34 milhões de toneladas/ano a partir da segunda metade
da década, considerando-se a expansão agrícola
nas regiões Oeste e Noroeste do Estado e ampliação
do volume de cargas em direção ao porto de Santos
proveniente do Planalto central através da Ferronorte -
Ferrovia Norte do Brasil S/A, que encontra-se em construção
com prazo de conclusão em 1995, quando concluirá
o tráfego mútuo com a FEPASA atraves da cidade de
Santa Fé do Sul.
NOTAS
(1) - Pinto, Adolpho Augusto
- História da Viação Pública de São
Paulo. Typografia e papelaria Vanorden & Cia. São Paulo,
1903, p. 85.
(2) - Matos, Odilon Nogueira de - Café e ferrovias. Pontes
editores, Campinas, 1990, p 163.
(3) - Silva, Sérgio - Expansão cafeeira e orígens
da indústria no Brasil. Alfa omega, São Paulo, 7a
edição, 1986, p.12
(4) - Furtado, CElso - Formação Econômica
do Brasil. 23a edição, Companhia Editora Nacional,
São Paulo, 1989, p. 178.
(5) - Matos, Odilon N de - Café e ferrovias. p.64.
(6) - idem, p 167/168
(7) - I relatório da fepasa - 1971/72
INTRODUÇÃO
O objetivo de estudar as ferrovias em São Paulo surge em
função de vários motivos, e entre tantos,
podemos destacar alguns que merecem relevância. O conjunto
da ferrovia brasileira, encontra-se atualmente, basicamente sob
domínio estatal. Com pouco mais de 30.000 quilômetros
em 1990, a ferrovia nacional é operada por cinco grandes
empresas, quatro das quais de propriedade do governo federal :
RFFSA (Rede Ferroviária Federal S.A.), CBTU (Companhia
Brasileira de Transportes Urbanos), EFVM (Estrada Ferroviária
Vitória à Minas) e EFC (Estrada de Ferro Carajás);
de propriedade do governo do Estado de São Paulo, a FEPASA
(Ferrovia Paulista S.A.) surgida na década de 70, resultado
da fusão das antigas companhias de Estrada de Ferro Sorocabana,
Mogiana, Paulista, Araraquara e São Paulo Minas; lidera
o transporte ferroviário no Estado, com pouco mais de 5.000
quilômetros de via. As demais ferrovias do Brasil, Estrada
de Ferro Campos do Jordão, E.F. Perus-Pirapora, E.F. Votorantim,
E.F. Jari e E.F. Mineração Rio do Norte, atingem
juntas perto de 1% da malha ferroviária nacional.
No total, a ferrovia transporta 22,5% das cargas brasileiras,
segundo dados da CNT (Conferência Nacional dos transportes,
Maio de 1992). Quanto aos produtos transportados, somente cinco
mercadorias, minério de ferro, granéis agrícolas
para exportação, combustíveis, produtos siderúrgícos
e cimento, correspondem a 90% do total transportado, o que demonstra
que um seleto grupo social de usuários utilizam o sistema
ferroviário brasileiro.
Limitamos porém, a discussão ao Estado de São
Paulo, sem perdermos de vista o contexto nacional que molda o
sistema de transporte históricamente. Apesar de toda a
limitação teórica, de tempo e demais dificuldades
de trabalhador estudante, a intenção do seguinte
trabalho está localizada na perspectiva de discutir a ferrovia
como um modo de transporte que dentro do desenvolvimento histórico,
econômico e político do Estado de São Paulo,
saiu das mãos privadas, que inicialmente lançara
as ferrovias na expansão do café, para a administração
estatal, hoje tão atacada como "empreguista, corrupta
e ineficiente". Não se trata de fazer apologia ao
modo de gestão estatal, mas no caso da ferrovia, o Estado,
a partir da crise da economia cafeeira iniciada na última
década do século XIX passa a intervir adequando-as
operacional e administrativamente, dotando as ferrovias paulistas
de mecanismos que passam a possibilitar a criação
de um sistema ferroviário paulista, formalmente constituído
com a criação da FEPASA em 1971.
Logicamente que não podemos perder de vista, a cumplicidade
existente em nossa história, entre as elites dominantes
e o aparelho estatal. Assim, essas ligações perigosas
entre classe dominante e Estado é que acabam por produzir
o sistema ferroviário paulista. É nesse contexto
histórico que a ferrovia faz parte do complexo cafeeiro
contribuindo para a implantação do sistema de produção
agro-exportador, iniciado na segunda metade do século XIX
com a expansão para o Oeste.
Por outro lado, a intervenção Estatal esteve sempre
presente na implantação e principalmente nas transformações
ocorridas na ferrovia após o início da crise cafeeira,
o que explicíta a forma como capital/governo andaram juntos
para a formação do complexo cafeeiro, não
apenas no caráter da expansão, mas nos objetivos,
que no caso da ferrovia parecem "coincidir".
O fim da chamada "era ferroviária" localiza-se
por volta da década de 1940, coincidindo com o "fim"
do regime das oligarquias, crise da economia cafeeira e implantação
do sistema rodoviário e indústria automobilística
nos anos 50. Para Odilon Nogueira de Matos, "a rede ferroviária
paulista, superado o fundamento econômico que a motivou,
pela natural itinerância do café, ou por decorrência
da fatores externos que condicionaram o apelo às rodovias,
elas tenham se tornado antieconômicas, praticamente sem
função em muitos dos seus trechos, que acabaram
sendo suprimidos".
Ao meu entender, é justamente nesse momento de maior "ociosidade"
do sistema que o Estado vai preencher o papel de "administrador"
das ferrovias. A nível federal as diversas ferrovias já
encampadas ou em vias de ser, acabam por serem organizadas em
uma só empresa, a RFFSA. A nível Estadual, a encampação
de grandes companhias que ainda funcionavam em sistema privado
como a Cia. Mogiana de Estradas de Ferro em 1952 e Companhia Paulista
em 1961, que reunidas às companhias já estatizadas,
E.F. Sorocabana desde 1904, E.F. Araraquara desde 1919 e E.F.
São Paulo Minas desde 1931, acabam por "redefinir"
o quadro operacional e administrativo de todo o conjunto ferroviário
nacional, com a criação da FEPASA.
Assim, o objetivo deste trabalho, fica sendo, na realidade, uma
contextualização do sistema ferroviário paulista,
sua formação, descrição, e na medida
do possível, da trajetória desse sistema até
a década de 1960 quando o governo assume diretamente um
processo de reordenamento do conjunto das ferrovias no Estado
de São Paulo.
O objetivo inicial que seria discutir as ferrovias em São
Paulo - 1960/1990, fica para um segundo momento (pós graduação),
diante da limitação de tempo e acúmulo de
conhecimento do problema. Assim, esse trabalho, divido em três
capítulos, que tratam da contextualização
histórica da ferrovia (capítulo I) onde tento mostrar
o processo social que a ferrovia "penetra" e qual é
o seu papel; discuto no 2º Capítulo as transformações
do sistema ferroviário, onde procuro demonstrar a ocupação
do espaço seja pela expansao das linhas ou anexação
de outras ferrovias menores; no 3º Capítulo, fica
reservado para o papel do Estado enquanto "responsável"
pela gestão das ferrovias paulistas, tentando mostrar a
trajetória estatal na direção das ferrovias
paulistas.
Para finalizar, se faz necessário lembrar do capítulo
ausente desse trabalho. As ferrovias em São Paulo (1960/1990),
fica então, como objetivo posterior por tratar-se do momento
"vivo" dessa discussão, da qual esse trabalho
serve como introdução ao problema que consiste em
"elucidar" os seguintes questionamentos:
1- Apesar das ferrovias iniciarem-se basicamente como investimentos
privados, acabam por submeterem-se muito precocemente ao controle
estatal.
2- Entram em "declínio" juntamente com a crise
da economia cafeeira, mas apesar de estatizadas, continuam a servir
as mesmas elites que até hoje dominam a agro-indústria.
3- A quem serve essa ferrovia? qual o papel que o sistema ferroviário
paulista cumpre para a sociedade uma vez que trata-se de uma empresa
estatal.
4- Iniciar a pesquisa, eis o objetivo ...
1 - A FERROVIA NO BRASIL
A ferrovia no Brasil foi inaugurada
em 30 de abril de 1854 ligando Porto Mauá a Raiz da Serra
(Bahia de Guanabara a Petrópolis) numa extensão
de 14,5 quilômetros. Isso vinte e quatro anos após
a inauguração na Inglaterra, da primeira linha ferroviária
a vapor e dezenove anos após a Lei Feijó, de 31
de outubro de 1835, que autorizava a construção
de uma Estrada que ligasse a capital do Império as Províncias
de Minas Gerais, Rio Grande de Sul e Bahia.(1) A distância
da intenção da Lei e a disponibilidade de recursos
para a construção desse empreendimento audacioso,
parece ter diminuido somente no início da década
de 1850, quando o café já havia se firmado como
o principal produto de exportação brasileiro, e
o governo, finalmente, proibido legalmente o tráfico negreiro,
com consequências ao estímulo para novos investimentos
de capital provenientes do tráfico. É nesse contexto,
que a Lei Nº 641 de 26 de junho de 1852 cria bases para a
construção ferroviária no Brasil, pois além
dos benefícios da Lei Feijó de 1835, que garantia
o direito de desapropriação de terrenos, uso de
madeiras e outros materiais que fossem encontrados nos terrenos
nacionais, isenção de impostos sobre trilhos, máquinas
e outros materiais destinados a construção da ferrovia
entre outros , inovou com o privilégio de zona, que impedia
a qualquer outra empresa estabelecer estações em
distância inferior a cinco léguas (trinta quilômetros),
e garantia de juros de 5% por parte do Governo Imperial até
o momento em que a situação econômica da Estrada
propiciasse a distribuição de dividendos, quando
deveria então reembolsar a União. Juros suplementares
de 2%, também foram concedidos pelas Províncias
a partir de 1852, como forma de estimular a construção
das ferrovias, destacando-se num primeiro momento, a Bahia, São
Paulo, Pernambuco e Rio de Janeiro.
A nível internacional, o período é demarcado
pela Revolução
Industrial na Europa e Estados Unidos que acabou por produzir
grandes centros urbanos impulsionando o mercado consumidor de
matérias primas com consequências diretas na aplicação
de novas técnicas de transporte marítimo e terrestre.
(3) As transformações ocorridas no Brasil na metade
do século XIX, estariam assim, diretamente relacionados
a essa nova conjuntura internacional, que permitiria a substituição
da economia açucareira,já decadente, pela cafeicultura,
iniciando assim, uma nova etapa social, política e conômica
com consequências na construção nas ferrovias
brasileiras.
2 - AS PRIMEIRAS FERROVIAS
A Estrada de Ferro Dom Pedro
II, posteriormente Central do Brasil, foi a primeira ferrovia
brasileira. Surge como investimentos de capitais privados, no
mesmo tempo e lugar da produção do café,
garantindo assim, grande redução nos custos dos
transportes e dividendos para seus acionistas. Utilizando cálculos
de A d Taunay, Sérgio Silva concluiu que a economia foi
cerca de 10% do preço do café na região fluminense
no período de 1860/68, já que o custo do transporte
ferroviário era seis vezes inferior ao das tropas de mulas
(4).
Apesar da produção cafeeira da Provincia do Rio
de Janeiro saltar de um milhão de sacas em 1835 para um
milhão e meio em 1840; atingindo seu auge em 1882 com dois
milhões e seiscentos mil sacas, e apesar da garantia de
juros e demais incentivos da lei, essa ferrovia sob liderança
privada de Irineu Evangelista de Souza, o Visconde de Mauá,
não conseguiu acompanhar a expansão dos cafezais.
Onze anos, foi o tempo de duraçao em operaçao sob
regime de sociedade anônima, e assim, em 1865 a D. Pedro
II é emcampada pelo governo da União sendo assim
administrada até 1941 quando passa para o regime de autarquia
sob a jurisdiçao do ministério de viação
e obras públicas, tornando parte da RFFSA (Rede Ferroviária
Federal S.A.) em 1957.(5) Após a estatizaçao, na
época com pouco mais de cem quilômetros, a D. Pedro
II, continuou a ser utilizada pelos fazendeiros como um poderoso
instrumento de redução de custos. Assim, expandiu
do pouco mais de cem quilômetros para aproximadamente três
mil e quinhentos quilômetros atingindo o Estado de Sao Paulo
(Bráz em 1875), Minas Gerais (Juiz de Fora em 1875 e Belo
Horizonte em 1895) e ampliando suas linhas dentro do Estado de
Rio de Janeiro.(6)
Wilson Cano, ao discutir os problemas encontrados pela ferrovia
na região para constituir-se enquanto empreendimento rentável,
aponta a crise econômica que apresentava a região
após 1883, a saber: concorrência com o antigo sistema
de pequenos portos fluviais e marítimos e suas rodovias,
rede de armazéns existentes junto a esses portos e expansão
ferroviária tardia, quando os cafezais já estavam
maturados (exceto para a região oriental na década
de 1870). Para esse autor, esses e outros fatores, teriam tornado
a aplicaçao de capitais na ferrovia uma opçao negativa
do ponto de vista privado,"tendo como único remédio
a encampaçao"(7).
Um detalhe interessante revela-se porém, quanto a paticipaçao
britânica nessa ferrovia. Os ingleses somente liberaram
empréstimos a "D. Pedro II" após 1865,
quando já estava sob dominio estatal. Diversas ferrovias,
no mesmo período, acabaram por fazer empréstimos
junto aos ingleses.Foi o caso da E.F. São Paulo e Rio que
ainda particular em 1874, emprestou seiscentas mil libras de Londres
e mais cento e sessenta e quatro mil e duzentas libras cinco anos
depois. Essa estrada ligou a cidade de Sao Paulo a E.F.D.Pedro
II em 1877, sendo ela também, comprada pelo governo federal
em 1890, passando o empréstimo britânico a fazer
parte do débito nacional. Em Minas Gerais, os ingleses
emprestaram mil e cem libras à E.F. do Sapucaí em
1889 e três milhões e setecentos mil libras para
a E.F. do oeste de Minas em 1893. Capitalistas ingleses emprestaram
à Companhia Mogiana, Sorocabana, E.F. Ituana e Companhia
Paulista, numa clara demonstraçao de ligaçoes inglesas
nas linhas que serviam a regiao cafeeira.Algumas ferrovias, portanto,
nao puderam pagar seus débitos e acabaram sendo encampadas
pelos ingleses que passaram a administrá-las. Em fins de
1880, havia no Brasil onze Companhias Inglesas de estrada de ferro,
subindo para vinte e cinco Companhias dez anos depois; segundo
Graham, quase metade dos investimentos ingleses no Brasil antes
de l914 (8).
3 - CAFÉ E FERROVIA
Ao estudar a origem da indústria no Brasil, Sérgio
Silva parte da economia cafeeira por entende-la como principal
centro de acumulação do capital no período
por ele estudado (desenvolvimento e crise da economia cafeeira,
substituição do trabalho escravo pelo assalariado,
do desenvolvimento do mercado, da rápida expansão
da estrada de ferro e aparição das primeiras indústrias)(9).
Sérgio Milliet, ao estudar o roteiro do café, diz
que "tudo gira em torno dele e à ele tudo se destina,
homens, animais e máquinas. A terra cansada que ele abandona,
se despovoa, empobrece, definha; a terra virgem que ele deflora,
logo se emprenha de vida ativa, enriquece, progride. O fenômeno
é visivel a olho nú" (10). Wilson Cano, ao
estudar as raízes da concentração industrial
de São Paulo, examina na primeira etapa desse trabalho,
as origens da formação capitalista, do complexo
cafeeiro de São Paulo, por entender que a atividade produtora
do café, possui uma dinâmica que estimula os diversos
componentes do complexo. Assim, o processo de formação
do complexo cafeeiro teria estimulado a agricultura de alimentos
e matérias primas, para atender ao mercado interno e externo;
a atividade industrial, que inicialmente estava dirigida para
a produção de beneficiamento de café, confecção
de sacarias, embalagem e textil; expansão do sistema bancário,
aperfeiçoamento do comércio de exportação
e importação; desenvolvimento de atividade criadoras
de infra-estrutura como portos, armazéns, transportes urbanos,
comunicação e implantação e desenvolvimento
do sistema ferroviário paulista (11).
Odilon Nogueira de Matos, utilizando estudos de Adolpho Pinto
(História da Viação pública de São
Paulo) ressalta que o sistema de comunicação de
São Paulo não inicia exclusivamente com a construção
das ferrovias. Apesar do isolamento do planalto paulista em relação
ao litoral, o início do século XVII já desponta
povoamentos como Taubaté, Jundiaí, Parnaíba,
Itú, Sorocaba e Atibaia. A busca do ouro havia estimulado
a entrada dos "paulistas" em direção a
Cuiabá e Goiás, chegando até mesmo, a levar
a capitania a reduzir-se a menos de um terço de sua área
original, a ponto de extinguir-se enquanto região administrativa
no período de 1748 a 1765. É como resultado desta
inquietação paulista que Adolpho Pinto entende a
construção de estradas que cortavam a Província
de longa data, classificando sete estradas como principais na
Província de São Paulo, existentes no início
do século XIX. Saindo da Capital com exceção
de uma são elas :
1- Para Vila da Constituição (atual Piracicaba)
com cento e oitenta quilômetros, passando por Itú
e Porto Feliz, onde inicia a navegação do Tiête.
2- Para Franca, passando por Jundiaí, Campinas, Mogi-Mirim,
Casa Branca e Batatais, com quase quinhentos quilômetros.
3- Para divisa de Minas Gerais, passando por Juquerí, Atibaia
e Bragança, com pouco mais de cem quilômetros.
4- Para o chamado Norte de São Paulo, passando por Mogi
das Cruzes, Jacareí, São Paulo, São José
dos Campos, Taubaté, Pindamonhangaba, Guaratinguetá,
Lorena, Areias, indo até Bananal numa extensão de
quase quatrocentos quilômetros.
5- Para Ubatuba, passando por Santos, São Sebastião
e Caraguatatuba, numa
distância de duzentos e oitenta quilômetros.
6- De Santos a Iguape, passando por Itanhaém.
7- Dirigindo para o Paraná, através de Cotia, São
Roque, Sorocaba, Itapetininga e Faxina (atual Itapeva).
De vários pontos dessas estradas partiam ramificações
para outras Vilas e Freguesias (12). Existia assim, uma timida
ocupação do território no estado de São
Paulo, situação que será radicalmente alterada
com a implantação da cafeicultura.
4 - OS BARÕES DO CAFÉ
A produção brasileira
de café atinge um ritmo sem precedentes a partir da metade
do século XIX. Enquanto isso a produção açucareira,ao
contrário, tornara cada vêz menos promissora frente
a concorrência da produção das Antilhas e
E.U.A., além da diminuição da demanda européia
devido a produção do açúcar a partir
da beterraba. O café, por outro lado, apesar de introduzido
no Brasil desde os começos do século XVII e cultivado
por toda a parte para fins de consumo local, assume importância
comercial, quando ocorre a alta do preço causada principalmente,
pela desorganização da produção do
Haiti.
Contido na expansão comercial, iniciada com a Revolução
Industrial e atendendo as necessidades das metrópoles européias,
é que o café transforma-se em produto de exportação.
Salta assim, de terceiro produto da pauta de exportação
brasileira na década de 18% dessas exportações,
atrás do açucar e do algodão, para primeiro
lugar na década de 1840, representando nesse momento mais
de 40% do valor das exportações. Para Furtado, essa
primeira fase da expansão cafeeira se concentrou na região
montanhosa próxima à Capital, beneficiando-se de
recursos semi-ociosos desde a decadência da mineração.
Assim, a mão-de-obra e transporte (mula) relativamente
abundante naquele momento, preço da terra, etc., permitiu
a expansão da produção a ponto de quintuplicar
a quantidade exportada entre 1821/1850, apesar dos preços
apresentarem declínio entre os anos 30 e 40, chegando a
desvalorizar-se em média 40% durante esse período
(13).
A produção cafeeira segundo Furtado, passa a ser
resposável pela formação de uma nova classe
empresarial. Diferentemente dos podutores de açúcar
do nordeste, que limitavam-se ao pólo da produção,
deixando as atividades comerciais aos monopólios holandês
ou português, os produtores de café desde muito cedo
entrelaçaram os interesses da produção e
do comércio. Essa nova classe dirigente estruturou-se com
a aquisição de terras, recrutamento de mão-de-obra,
organização e direção da produção,
transportes, comercialização nos portos e interferência
na política econômica e financeira. Perceberam a
importância do governo como instrumento de ação
econômica, e por essa consciência clara de seus próprios
interesses que eles se diferenciam de outros grupos dominantes
anteriores ou contemporâneos (14).
Alguns "obstáculos" porém, estavam presentes
na expansão da produção cafeeira. Coincidentemente,
durante a expansão do plantio na década de 1830,
o governo imperial brasileiro instituiu em novembro de 1831 a
Lei que proibia o tráfego. Na prática o tráfico
internacional de negros, somente teria se estancado por volta
de 1850 com a promulgação da Lei de 04 de setembro
(Lei Eusébio de Queiroz), e diante das pressões
inglesas que neste período chegam a beira do conflito armado.
Dois grandes problemas precisavam ser suparados pelas elites cafeeiras:
o problema da mão-de-obra e o uso da terra diante das necessidades
da expansão da produção.
5 - A MÃO-DE-OBRA E A OCUPAÇÃO DA TERRA
A possibilidade da proibição
do tráfico não era novidade para as classes dominantes
da metade do século XIX. A questão do tráfico
já era discutida desde 1815 com a assinatura do Tratado
de Viena, Lei de novembro de 1831, promulgação da
Lei Bill Aberdeen de 1845 (que sujeitava os navios brasileiros,
traficantes de escravos, ao alto tribunal do almirantado e a qualquer
tribunal do vice almirantado dentro dos domínios britânicos),
e finalmente, a Lei Eusébio de Queirós de 4 de Setembro
de 1850.
De certo modo, o problema da colonização do Brasil,
e consequentemente a substituição da mão-de-obra
escrava, já estava sendo ensaiada desde a experiência
com núcleos estrangeiros que datam da vinda da corte de
D. João VI para o Brasil em 1808, quando rompe-se as tradicionais
restrições para a fixação de estrangeiros
na colônia. Assim, os primeiros núcleos são
formados no Espírito Santo, Rio de Janeiro, São
Paulo, em Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Segundo Emília Viotti da Costa, a imigração
para o Brasil não chegava a entusiasmar, tendo em vista
a precariedade das condições brasileiras em relação
a possibilidade da imigração para os E.U.A., para
onde se dirigia espontâneamente as correntes imigratórias
(15). Enquanto isso, a convivência com medidas paliativas,
como o tráfico inter-provincial e ensaios de colonização
arrastaram-se até a década de 1840 quando a
pressão pela abolição chega ao limite. É
diante da necessidade de ampliação da produção
e a solução do problema da escassez de braços,
que o senador Vergueiro, fazendeiro da região de Limeira,
apresenta em 1845 uma emenda ao orçamento autorizando o
governo a despender até duzentos contos com a importação
de colonos, para o trabalho nas lavouras de café em forma
de parcerias.
Os descontentamentos não tardaram a aparecer uma vêz
que os
anseios do imigrante europeu, interessados em "fazer"
riqueza, chocava-se frontalmente com os interesses dos fazendeiros,
que viam nos "parceiros" somente forma de reprodução
do capital. Um dos indícios de que os barões do
café, "prepararam" o terreno para o recebimento
dos imigrantes europeus, pode ser constatado com a promulgação
da Lei Nº. 601 de 1850 (Lei de Terras), regulamentada em
1854 que dispunha sobre a ocupação da terra a partir
daquele período. Enquanto até 1822 vigorou o regime
de sesmaria, onde a apropriação legítima
da terra era concessão do poder público, a partir
de 1822, a falta de uma forma institucional específica
de legitimação da apropriação, acabava
sendo as ocupações ou posses. Nesse sentido a Lei
de 1850/54, vem na prática, impedir o acesso a posse da
terra pelos seguimentos marginalizados uma vêz que a apropriação
legítima passa a ser feita através da compra junto
ao Estado, ou através da "compra" de terras de
pequenos produtores onde os argumentos das armas ditam os parâmetros
da negociação.
A partir da Constituição de 1891, ocorre a transferência
para os Estados federados, o domínio das terras devolutas.
No caso do Estado de São Paulo, a Lei Nº. 323 de 22
de junho de 1895 dispunha sobre as terras devolutas, sua medição,
marcação, aquisição, legitimação,
etc. A ela seguiram mais cinco leis e dezesseis decretos até
1930, sintoma de que o poder público não conseguia
regular com eficácia o processo real de apropriação
de terras no Estado de São Paulo até esse período
(16).
6- A FERROVIA NO CONTEXTO
O momento de surgimento da ferrovia
em substituição ao transporte feito em "lombos
de mula" se dá quando a classe dominante, diante da
necessidade de ampliação da área plantada,
busca soluções que não se limitam ao problema
do transporte, da mão-de-obra, etc., mas ao conjunto da
produção cafeeira. A ferrovia representava então,
nova oportunidade de inversão para o capital cafeeiro,
ao mesmo tempo em que provocava uma redução apreciável
nos custos do transporte do café. Surge então, como
parte do complexo cafeeiro, contribuindo para a realização
do sistema de produção agro-exportador. Assim, apesar
de sua formação enquanto empresa, construção
e implantação passar por concessão estatal,
atende basicamente às necessidades dessa elite empresarial
que se torna hegemônica no aparelho de Estado até
1930. Portanto, toda a construção ferroviária
de São Paulo acontece durante o período em que esses
interesses agro-exportador dominam o aparelho do Estado, nas suas
mais variadas instâncias.
A ferrovia em São Paulo surge após a primeira metade
do Séc.XIX e ocupa geograficamente todos os pontos cardeais
do Estado, montando uma verdadeira rede de captação
de café em diração ao porto. Seu período
de construção e de expansão também
é limitado ao tempo em que as oligarquias dominaram o aparelho
de Estado. De 1867 até a década de 1930 estava "concluida"
a ocupação ferroviária paulista. Nesse período,
dezoito ferrovias foram formadas para atender basicamente ao transporte
de café. Desse total, nove com menos de cem quilômetros,
serviam praticamente de ramais de captação de cargas
para as grandes e médias companhias a saber:
Estrada de Ferro Sorocabana | 2.074 Km |
Companhia Mogiana de Estradas de Ferro | 1.954 Km |
Estrada de Ferro Noroeste do Brasil | 1.539 Km |
Companhia Paulista de Estradas de Ferro | 1.536 Km |
Estrada de Ferro Araraquara | 379 Km |
São Paulo Railway | 246 Km |
Esta última era a única
ligação ferroviária com o Porto de Santos
até a década de 1930.
Como se sabe, esgotada a possibilidade de expansão do café
na região do Vale do Paraíba, sua marcha prosseguiu
em direção ao interior do Rio de Janeiro, Minas
Gerais, Espiríto Santo e em direção ao Oeste
Paulista, onde o problema de delimitação de terra
já havia sido resolvido para os ricos fazendeiros desde
a já citada Lei de Terras de 1850/54. Entretanto, uma nova
etapa começava em direção ao Oeste Paulista.
Enquanto as regiões do Vale do Paraíba, Norte de
São Paulo e Sudeste de Minas Gerais, eram servidas pela
Estrada de Ferro D. Pedro II, na região Oeste o transporte
era feito de forma bastante rudimentar e cara. O "lombo de
mula" impedia a expansão da fronteira cafeeira, sendo
que antes da inauguração das ferrovias em São
Paulo, o plantio limitava-se no ano de 1854 praticamente à
região Norte com 77%, seguido pela região Central
(Capital, Campinas, Sorocaba e outras), com aproximadamente 14%
da produção paulista.
Esse quadro parece mudar, porém, a partir de 1870 quando
a produção paulista passa a representar 16% do total
brasileiro atingindo 40% em 1885. A produtividade do oeste paulista
dada a maior fertilidade do solo, menor idade média dos
cafezais, técnicas agrícolas mais eficientes, utilização
de máquinas de beneficiamento de café, cuja fabricação
já se desenvolvia na década de 1870, representavam
maior lucratividade e novas plantações, com consequente
aumento da distância entre a produção e o
porto. Para demonstrar a expansão do café no Estado
de São Paulo, Sérgio Milliet "divide"
o Estado em sete zonas geográficas por ordem de surgimento
da plantação de café, a saber.
1 - Zona Norte - (inclusive o litoral) com os seguintes municípios:
Aparecida, Areias, Bananal, Buquira, Cachoeira, Caraguatatuba,
Cruzeiro, Cunha, Guararema, Guaratingueta, Igaratá, Jacareí,
Jambeiro, jataí, Lagoinha, Lorena, Mogi das Cruzes, Natividade,
Paraibuna, Pindamonhangaba, Pinheiros, Piquete, Quelúz,
Santa Branca, Santa Isabel, São José dos Campos,
São José do Barreiro, São Luiz do Paraitinga,
São Sebastião, Silveiras, Taubaté, Tremembé,
Ubatuba e Vila Bela.
2 - Zona Central (abrangendo a capital) com os seguintes municípios:
Piracaia, Bragança, Campinas, Piracicaba, Itapetininga,
Piedade, Una, Angatuba, Anhembi, Araçariguama, Atibaia,
Bofete, Cabreúva, Campo Largo, Con-chas, Capivari, Cotia,
Guareí, Indaiatuba, Itatiba, Itú, Joanópolis,
Jundiai, Juqueí, Laranjal, Monte-Mór, Nazaré,
Parnaibas, Pereiras, Piedade, Porangaba, Porto Feliz, Rio das
Pedras, Salto, Santa Bárbara, São pedro, São
Roque, Sarapuí, Sorocaba, Tatuí, Tietê e Vila
Americana.
3 - Zona Mogiana - Amparo, Altinópolis, Batatais, Brodósqui,
Caconde, Cajurú, Casa Branca, Cravinhos, Espírito
Santo do Pinhal, Franca, Guará, Igarapava, Itapira, Ituverava,
Jardinópolis, Mogi-Mirim, Mogi-Guaçú, Mocóca,
Nuporanga, Orlândia, Patrocínio do Sapucaí,
Pedregulho, Pedreira, Ribeirão Preto, Sertãozinho,
São João da Boa Vista, São José do
Rio Pardo, São Joaquim, São Simão, Santo
Antônio da Alegria, Santa Rosa, Serra Azul, Socorro, Tambaú,
Itapiratiba e Vargem Grande.
4 - Zona Paulista - Araras, Araraquara, Barretos, Bebedouro, Cajobí,
Colina, Descalvado, Guaíra, Guariba, Jaboticabal, Leme,
Limeira, Monte Azul, Olimpia, Palmeiras, Piraçununga, Pitangueiras,
Porto Ferreira, Rio Claro, São Carlos, Santa Cruz da Conceição,
Santa Rita do Passaquatro e Viradouro.
5 - Zona Araraquarense - Ariranha, Barra Bonita, Bariri, Bica
de Pedra, Boa Esperança, Borborema, Brotas, Catanduva,
Cedral, Dourado, Dois Córregos, Ibirá, Ibitinga,
Itápolis, Inácio Uchoa, Jaú, José
Bonifácio, Matão, Mineiros, Mirassol, Monte Alto,
Monte Aprazível, Mundo Novo, Nova Granada, Novo Horizonte,
Pederneiras, Pindorama, Potirendaba, Ribeirão Bonito, Rio
Preto, São José da Bocaiúva, Santa Adélia,
Iabapuã, Tanabi, Tabatinga, Taquaritinga e Torrinha.
6 - Zona Noroeste do Brasil e Alta Paulista - Araçatuba,
Avaí, Avanhandava, Baurú, Cafelândia, Birigui,
Coroados, Duartina, Gália, Garça, Glicério,
Iacanga, Lins, Marília, Penápolis, Pirajuí,
Piratininga, Presidente Alves e Promissão.
7 - Zona Sorocabana - Agudos, Assis, Avaré, Bernardino
de Campos, Cândido Mota, Cerqueira César, Xavantes,
Conceição do Monte Alegre, Espírito Santo
do Turvo, Fartura, Ipauçú, Itatinga, Lençóis,
Maracaí, Óleo, Ourinhos, Palmital, Paraguaçú,
Pirajuí, Platina, Presidente Prudente, Presidente Wenceslau,
Quatá, Salto Grande, Santa Bárbara do Rio Pardo,
Santa Cruz do Rio Pardo, São Manuel, São Pedro do
Turvo e Santo Anastácio.
A partir dessa divisão levanta os seguintes dados em porcentagem
das regiões acima citadas, por ordem de sugimento do café.
|
|
|
|
|
|
Norte | 86,50 | 77,46 | 19,99 | 3,47 | 7,90 |
Central | 11,93 | 13,90 | 29,00 | 12,58 | 1,71 |
Mogiana | 0,14 | 2,31 | 21,81 | 35,53 | 16,20 |
Paulista | 1,43 | 6,32 | 23,69 | 18,77 | 11,64 |
Araraquarense | 0,00 | 0,00 | 4,05 | 18,74 | 26,93 |
Noroeste | 0,00 | 0,00 | 1,26 | 3,27 | 23,92 |
Sorocabana | 0,00 | 0,00 | 0,00 | 7,59 | 12,51 |
fonte: Milliet, Sérgio - O Roteiro do Café e outros ensaios. p.24
Esses dados levantados por Milliet,
apesar de limitados ao café, como se esse tivesse autonomia
em relação aos homens que nele trabalham, mostram
a rapidez com que acontece esse deslocamento da produção
cafeeira. As consequências para a região que o café
"abandona" são retratadas por Monteiro Lobato
em "Cidades Mortas" e outros escritos. Dá-nos
a dimensão do que foi a passagem da economia cafeeira para
a população do Vale do Paraíba. Ao falar
de Jeca Tatú, na realidade retrata uma população
sub-nutrida, marginalizada socialmente, sem acesso a cultura e
acometida de toda a sorte de doenças endêmicas. Em
"Negrinha" o autor aborda o preconceito racial após
a Abolição onde personagens da elite (senhoras gordas),
num gesto de falsa bondade, "adotam" meninas negras
para escravizá-las em trabalhos caseiros.
Ao capital não interessa a lógica dessa população.
A expansão é a sua lógica, a ferrovia um
dos seus veículos. Parece ironia que essa mesma ferrovia
venha a entrar em decadência após a década
de 1940, quando passado a liderança do café na economia
paulista, diversos trechos são fechados por serem considerados
improdutivos. Morrem assim, como vítimas que algum dia
girou em torno do senhor café e seus barões; a ferrovia
também abandonada "empobrece, definha", e acaba
adotada pelo Estado, também num falso gesto de bondade,
que como as "negrinhas" em Monteiro Lobato, continuam
a servir como sempre serviram, nesse caso, aos novos donos da
agro-indústria pós café, que continuam a
escoar "sua" produção para o Porto de
Santos em busca de dólares.
Juntamente com essa expansão segue a população,
que em 1874, basicamente, ocupava o Vale do Paraíba, Região
Central e Mogiana. Flávio Azevedo Marques de Saes, diz
que 80% da população paulista ocupava essas três
regiões nesse período, e que os três elementos,
café, população e ferrovia caminham juntos
a partir da segunda metade do século XIX (17). Sobre as
condições da maioria trabalhadora nessa caminhada,
trabalhos de Emília Viotti da Costa (Da Monarquia a República)
e Brasílio Salum Jr (Capitalismo e Cafeicultura) e outros,
indicam o quanto foi dolorosa essa "caminhada". A posse
da terra garantida para os grandes fazendeiros, o processo de
Abolição e imigração, a cumplicidade
oligárquica com o aparelho de Estado são questões
fundamentais que precisam ser aprofundadas no futuro para entendermos
melhor o processo de formação das ferrovias em São
Paulo. Essas questões estão presentes de maneira
decisivas no contexto em que as grandes estradas de ferro são
formadas para atender a resolução desses e outros
impasses colocados à lógica da expansão capitalista
em direção ao Oeste. Vale dizer, que não
podemos perder de vista todo o quadro de disputas que existiu
na expansão do oeste paulista para não corrermos
o risco de fazermos apologia a história dos "vencedores",
no caso os barões de café, que aparentemente teriam
implementado seus projetos, como se fossem a única alternativa
para a colonização e povoamento do Estado de São
Paulo, como insiste a "história oficial".
Voltando ao quadro da expansão da produção
cafeeira do Vale do Paraíba para o interior paulista, veremos
que existe "coincidência" entre essa expansão
e a construção da rede ferroviária paulista.
Adolpho Augusto Pinto escreve em 1903 que o "desenvolvimento
das estradas de ferro em São Paulo não obedeceu
a um plano geral previamente delineado; as malhas da grande rede
de viação (...) foram tramadas dia a dia, sem nenhuma
preocupação de conjunto ou coordenação
de partes visando um certo resultado geral, ao menos nos primeiros
tempos". Mesmo assim, "apesar de não ter presidido
a sua formação um princípio geral de méthodo,
entretanto as linhas férreas de fato se desenvolveram por
modo a virem as suas partes a formar mais tarde um sistema geral,
relativamente bem delineado" a ponto de "o traçado
desse tronco normalmente ser sensivelmente retilíneo em
direção ao porto de Santos em sua extensão
total de cerca de 500 quilômetros"(18).
Parece haver um certo consenso de que o traçado acompanha
o escoamento da produção para o porto de Santos.
Se observarmos o mapa atual das ferrovias paulistas, veremos que
todos os seus extremos convergem para a capital onde "afunilam-se"
em direção ao porto. Se observarmos a expansão
da produção cafeeira em relação a
expansão ferroviária, veremos que ambas seguem lado
a lado. Utilizando a tabela de expansão cafeeira organizada
por Milliet, constatamos que a região norte lidera a produção
do café até a década de 1850, diminuindo
relativamente, cinquenta e sete pontos percentuais em relação
ao período posterior, 1886. No mesmo período a região
central e paulista que em 1836 representavam juntas pouco mais
de 13% da produção paulista, em 1886 representavam
74,5% dessa produção. É sintomático
que nesse período, ocorra o grande momento das ferrovias
com a ligação de Jundiai a Santos em 1867, inauguração
da Companhia Paulista em 1872 e Companhia Mogiana em 1875. Regiões
que nem mesmo apareciam nas estatísticas de produção
de café no Estado, como a Araraquarense, Noroeste e Sorocabana,
em 1886, timidamente já aparecem como iniciando a produção,
representando 5% do total produzido em São Paulo. Essas
três últimas regiões "despertam"
para a produção cafeeira entre 1886 e 1935, quando
juntas chegam a representar 29,6 do total da produção
paulista em 1920, chegando a 63,36% em 1935.
No mesmo período é inaugurado a Companhia Ituana
em 1873 (que acabou por fundir-se à Sorocabana em 1893);
Estrada de Ferro Sorocabana em 1875; Estrada de Ferro Araraquara
em 1898 e Estrada de Ferro Noroeste do Brasil em 1904, encerrando-se
assim, o período de formação de grandes companhias
férreas em São Paulo. Esse período, marcado
pela grande quantidade de inauguração de estradas
de ferro não se limita a essas seis grandes ferrovias;
apesar de serem inegavelmente as mais importantes em suas respectivas
regiões.
Segundo Adolpho A Pinto (19), na virada do século, existiam
dezoito ferrovias em São Paulo, a saber:
Estradas de ferro em tráfego a 31 de dezembro de 1901
|
|
Estrada de Ferro Central do Brasil | 276 |
São Paulo Railway Company | 139 |
Cia. Paulista de Vias Férreas e Fluviais | 863 |
Cia. Mogiana de Estradas de Ferro | 901 |
Cia. União Sorocabana e Ituana | 905 |
Cia. Estrada de Ferro Bragantina | 52 |
Cia. Estrada de Ferro Itatibense | 21 |
Cia. Estrada de Ferro Araraquara | 83 |
Cia. Interesses Locais | 16 |
Estrada de Ferro do Bananal | 11 |
The Minas and Rio Railway | 25 |
Cia. Agrícola Fazenda Dumont | 23 |
Ramal Férreo Campineiro | 43 |
Cia. Carril Agrícola Funilense | 41 |
Cia. Estrada de Ferro do Dourado | 20 |
São Paulo T. L. and Power Company | 22 |
Cia. Ferro Carril Santista | 9 |
Tramway da Cantareira | 21 |
TOTAL | 3.471 |
De onde se conclui, que em linhas
gerais, o traçado ferroviário paulista já
se encontrava definido na virada do século, e apesar de
ter sido ampliado nos anos seguintes até a década
de 1930 e reduzido sensivelmente a partir dos anos 60, pouco se
altera se compararmos 1901 a 1990.
Passado o período de hegemonia das oligarquias e expansão
do plantio cafeeiro, em 1940 as ferrovias paulistas apresentavam
o seguinte quadro, segundo Odilon Nogueira de Matos(20):
|
|
Estrada de Ferro Sorocabana | 2.074 |
Cia Mogiana de Estradas de Ferro | 1.959 |
Estradas de Ferro Noroeste do Brasil | 1.536 |
Estrada de Ferro Araraquara | 379 |
Estrada de Ferro do Dourado | 317 |
São Paulo Railway | 246 |
Estrada de Ferro São Paulo Minas | 180 |
Estrada de Ferro São Paulo Goiás | 148 |
Estrada de Ferro Campos do Jordão | 47 |
Estrada de Ferro do Morro Agudo | 41 |
Estrada de Ferro do Monte Alto | 32 |
Ramal Férreo Campineiro | 31 |
Estrada de Ferro Jaboticabal | 25 |
Estrada de Ferro Itatibense | 20 |
Estrada de Ferro Perus-Pirapora | 16 |
Estrada de Ferro Barra Bonita | 18 |
Estrada de Ferro Votorantim | 14 |
TOTAL | 8.622 |
Se classificarmos essas ferrovias em grandes, superiores a 500
quilômetros, médias, acima de 100 quilômetros
e pequenas, com menos de 100 quilômetros, veremos que apenas
as quatro grandes possuem em 1940 o equivalente a 82,5 da extensão
dos trilhos paulistas. As cinco médias atingem 14,7 do
total, enquanto as pequenas, num total de nove ferrovias não
chegam a atingir 3% do total.
Odilon Nogueira de Matos entende que em 1940 se deu o fim da chamada
"era ferroviária", uma expressão bastante
feliz, se considerarmos a verdadeira operação desmanche
ocorrida na ferrovia a partir desse período. Um novo quadro
de redefinição a partir de 1940, acabou por moldar
uma ferrovia com as características atuais. Na realidade
um verdadeiro sistema ferroviário, que nasce a partir da
década de 1960, sob controle estatal, como veremos a seguir.
NOTAS
(01) - Matos, Odilon Nogueira
de - Café e ferrovias (A evolução ferroviária
de São Paulo e o desenvolvimento da cultura cafeeira).
Pontes editores, Campinas, 1990, p.59.
(02) - Idem, p.64.
(03) - Graham, Richard - Grã-Bretanha e o início
da modernização no Brasil. 1850 - 1914. brasiliense,
São Paulo, 1973, p.32.
(04) - Silva, Sérgio - Expansão cafeeira e orígens
da indústria no Brasil. 7ª edição, Alfa
Omega, São Paulo, 1986, p.51.
(05) - I Centenário das Ferrovias Brasileiras - diversos
autores. Serviço gráfico do IBGE, Rio de Janeiro,
1954, p.135
(06) - Guia Geral das Estradas de Ferro e Empresas de Transportes
com Elas Articuladas - Contadoria Geral dos Transportes, Rio de
Janeiro, 1960.
(07) - Cano, Wilson - Raízes da concentração
industrial em São Paulo. Hucitec, São Paulo, 3ª
edição, 1990, p.28 a 30.
(08) - Graham, Richard - Grã-Bretanha e o início
da modernização do Brasil. op cit. p.59 e seguintes.
(09) - Silva, Sérgio - Expansão cafeeira e orígens
da indústria no Brasil, p.12.
(10) - Milliet, Sérgio - O roteiro do café e outros
ensaios. Hucitec, 4ª edição, São Paulo,
1982. (1ª edição de 1938).
(11) - Cano, Wilson - Raízes da concentração
industrial em São Paulo.p.20 (12) - Matos, Odilon Nogueira
de - Café e ferrovias. p.29, 39 e 40
(13) - Furtado, Celso - Formação Econômica
do Brasil - 23ª edição, Companhia Editora Nacional,
São Paulo, 1989, p 110 a 114.
(14) - Idem, p.116
(15) - Costa, Emília Viotti da - Da monarquia a Rpública.
Momentos decisivos. 3ª edição, brasiliense,
São Paulo, 1955, p 162 a 163.
(16) - Salum Jr, Brasilio - Capitalismo e cafeicultura. Oeste
paulista: 1888 - 1930. Livraria Duas cidades, São Paulo,
1982, p. 13 a 17.
(17) - Saes, Flávio Azevedo Marques de - As ferrovias de
São Paulo (1870 - 1940), Hucitec, São Paulo, 1981.
p.37 e seguintes
(18) - Pinto, Adolpho Augusto - História da Viação
Pública de São Paulo. Typografia e papelaria Vanorden
& Cia. São Paulo, 1903, p.85
(19) - idem, p.230 a 232
(20) - Matos, Odilon Nogueira de - Café e ferrovias. p.163
A crise da economia cafeeira
não ocorre isoladamente em 1929. Na realidade se arrasta
desde 1893 com a crise econômica dos EUA com graves conseqências
para o preço da saca de café no mercado mundial.
Utilizando mecanismos de depreciação externa da
moeda, a elite cafeeira acabava por repassar para a sociedade
a sua crise procedente da queda dos preços do café.
Políticas como o convênio de Taubaté de 1906,
consistia em intervenção do governo através
da compra de excedentes utilizando empréstimos externos
e desencorajamento da expansão das plantações.
Para Celso Furtado, o "êxito financeiro da experiência
veio a consolidar a vitória dos cafeicultores que reforçaram
seu poder até 1930 logrando submeter o governo central
aos objetivos de sua política econômica".(1)
O complicado e caro mecanismo de defesa da economia cafeeira não
resistiu porém à crise mundial de 1929.
Apesar de considerarmos que essa crise afetou diretamente a ferrovia
tendo em vista as implicações da economia cafeeira
na estrada de ferro não podemos ligar mecanicamente ambos
seguimentos econômicos; porém, é inegável
que a partir de 1940, um novo rumo acaba sendo construido para
as ferrovias. Passamos então a descrever as ferrovias paulistas
existentes em 1940 para explicarmos posteriormente a forma como
se deram essas transformações que acabaram por formar
o atual sistema ferroviário paulista. Assim, não
devemos perder de vista que basicamente toda a rede ferroviária
paulista formou-se no período entre 1880 e 1940, quando
pequenas, médias e grandes ferrovias se formaram dentro
de um verdadeiro surto ferroviário,e que, após esse
surto, passaram por um processo de total reestruturação
operacional e administrativa para a daptar-se a realidade político-econômica
pós anos trinta.
Utilizando dados levantados por Odilon Nogueira de Matos sobre
as ferrovias em São Paulo em 1940, classificamos as estradas
de ferro existentes no período em três categorias,
segundo a extensão de sua malha:pequenas, com menos de
cem quilômetros; médias, entre cem e quinhentos quilômetros
e grandes, com mais de 500 quilômetros de vias férreas.
|
|
Estrada de Ferro Campos de Jordão | 47 |
Estrada de Ferro Morro Agudo | 41 |
Estradas de Ferro Monte Alto | 32 |
Ramal Férreo Campineiro | 31 |
Estrada de Ferro Jaboticabal | 25 |
Estrada de Ferro Itatibense | 20 |
Estrada de Ferro Perus-Pirapora | 16 |
Estrada de Ferro Barra Bonita | 18 |
Estrada de Ferro Campos do Jordão | 47 |
Estrada de Ferro do Morro Agudo | 41 |
Estrada de Ferro do Monte Alto | 32 |
Ramal Férreo Campineiro | 31 |
Estrada de Ferro Jaboticabal | 25 |
Estrada de Ferro Itatibense | 20 |
Estrada de Ferro Perus-Pirapora | 16 |
Estrada de Ferro Barra Bonita | 18 |
Estrada de Ferro Votorantim | 14 |
SUB-TOTAL | 244 |
Estrada de Ferro Araraquara | 379 |
Estrada de Ferro Dourado | 317 |
São Paulo Railway | 246 |
Estrada de Ferro São Paulo Minas | 180 |
Estrada de Ferro São Paulo Goiás | 148 |
SUB-TOTAL | 1.270 |
Estrada de Ferro Sorocabana | 2.074 |
Cia Mogiana de Estrada de Ferro | 1.959 |
Estrada de Ferro Noroeste do Brasil | 1.539 |
Cia Paulista de Estrada de Ferro | 1.536 |
SUB-TOTAL | 7.108 |
TOTAL | 8.622 |
fonte: Matos, Odilon Nogueira de - Café e ferrovias. p
163.
Assim, essas pequenas ferrovias, que somavam juntas 244 quilômetros,
menos de 3% do total, de maneira geral funcionavam como captadoras
de carga para as ferrovias maiores. São importante no contexto
da economia cafeeira por integrar fazendas distantes aos grandes
corredores de exportação formado pelas grandes ferrovias.
São elas:
ESTRADA DE FERRO CAMPOS DO JORDÃO (47 quilômetros)
- Com sede em Pindamonhangaba funciona praticamente como um ramal
da E.F. Central do Brasil. Propriedade do governo de São
Paulo, destaca-se pelo seu caráter social ao servir área
destinada a saúde pública e ao turismo.
ESTRADA DE FERRO DO MORRO AGUDO (41 quilômetros) -
Com sede em Jundiai, propriedade particular, funciona como subsidiária
da Companhia Paulista; transporta a produção de
algumas fazendas de café por onde passa, utilizando material
operacional cedido pela Paulista.
RAMAL FÉRREO CAMPINEIRO (31 quilômetros) -
Com sede em Campinas. Iniciou operação em outubro
de 1890 como propriedade particular, funcionando na prática
como um ramal da Companhia Paulista.
ESTRADA DE FERRO JABUTICABAL (25 quilômetros) - De
propriedade particular, com sede em Jundiai, era controlada pela
Companhia Paulista que detinha a maioria das ações.
Funcionava como ramal dessa companhia utilizando inclusive, vagões
e locomotivas pertencentes à "Paulista".
ESTRADA DE FERRO ITATIBENSE (20 quilômetros) - Com
sede em Itatiba, propriedade particular, tinha como ponto de contato
com a Companhia Paulista a cidade de Louveira. Transportava algodão,
milho couro, lenhas, madeiras e pedras para as linhas da "Paulista".
ESTRADA DE FERRO PERÚS-PIRAPORA (16 quilômetros)
- De propriedade do governo Estadual. Na realidade funcionava
como um ramal que sai da estação de Perus, (da E.F.
São Paulo Railway) e atende a uma fábrica de cimento
transportando empregados, cimento e calcáreo.
ESTRADA DE FERRO BARRA BONITA (18 quilômetros) -
Com sede administrativa em Jundiai, de propriedade particular;
sob controle acionário da "Paulista" funcionava
como captadora de cargas tendo como ponto de contato com essa
ferrovia a cidade de São Carlos.
ESTRADA DE FERRO VOTORANTIM (14 quilômetros) - Com
sede em Votorantim, propriedade particular, tal como a Perus-Pirapora,
mal classificada como Estrada de Ferro, na prática funcionava
como ramal da Sorocabana tendo como ponto de contato com essa
companhia, a estação de Paula Souza, transportava
cimento, cal e empregados.
Entre as ferrovias médias podemos destacar:
ESTRADA DE FERRO ARARAQUARA (379 quilômetros) - Autorizada
a construção em 17 de setembro de 1895, ligando
Araraquara a Ribeirãozinho, (atual Taquaritinga), tendo
como diretores os "barões do café" araraquarenses,
Carlos Batista Magalhães, Antônio Lourenço
Corrêa e Antônio Joaquim de Carvalho. A construção
dessa ferrovia, também coincide com a expansão da
produção cafeeira na região, que segundo
Milliet, já produzia mais de 4% da produção
do Estado com tendência de crescimento.
Em 1898 é inaugurado o trecho até Bueno de Andrade,
chegando a Matão no ano seguinte, concluindo o traçado
em 1901. Passa a funcionar em regime de tráfego mútuo
com a Estrada de Ferro Rio Claro a Araraquara, que já operava
em Araraquara desde 1886, ligando essas duas cidades. No ano de
1906, novas concessões foram outorgadas. Pelo Decreto No
663 de 16 de setembro de 1908 ficou autorizado a construção
do Ramal de Santa Joséfa (atual Silvânia) a Ibitinga;
pelo Decreto 7.245 de 24 de setembro de 1908, ficou autorizado
o prolongamento da linha tronco de São José do Rio
Preto a Jataí em Goiás, passando por Francisco Sales
em Minas Gerais. Esse projeto ambicioso, apesar de não
sair da prancheta da EFA, voltou a ser discutido em 1940, na Secretaria
de Viação, sob o título de "Ligações
do Triângulo Mineiro e de São Paulo por Estradas
de Ferro e de Rodagem com Goiás e Mato Grosso". Sugere
esse estudo, o prolongamento da EFA até Cuiabá ligando
o Mato Grosso ao litoral paulista, bem como articulações
com linhas de navegação da Bacia do Paraná,
dos rios Taquari, São Lourenço e Cuiabá,
e consequentemente, Paraguai podendo mais tarde atingir as vertentes
amazônicas; outra opção desse projeto seria
a expansão até Jataí depois de atravessar
o Rio Grande nas proximidades do Porto Quissoça ou da Cachoeira
dos Indios, para articular-se no final com a navegação
fluvial do Rio Araguaia.(2)
Após atingir Pindorama em 1909 num total de 128 quilômetros,
a Estrada de Ferro Araraquara foi adquirida por um consórcio
de engenheiros que também detinha quase totalidade das
ações da Estrada de Ferro São Paulo Goiás
e Estrada de Ferro do Dourado. Reinicia assim o avanço
ambicioso rumo ao Mato Grosso. Atinge São José do
Rio Preto em 1912, distante mais de 200 quilômetros do ponto
inicial, abrindo falência dois anos depois.
Adquirida como massa falida em 07 de fevereiro de 1916 passa a
denominar-se São Paulo Northern Railroad Company, passando
a ser (mal) administrada pelo francês Paul Deleuse, suspeito
de ligações com banqueiros de Hamburgo, a partir
de sua sede em Niteroi-RJ. Diante da falta de pagamentos, uma
greve geral na estrada durante todo o mês de outubro de
1919 desencadeou a encampação pelo Governo do Estado
de São Paulo no dia primeiro de novembro de 1919.
Após a encampação, atendendo ao avanço
da produção cafeeira, que na década de vinte
atinge 18,74% do total da produção paulista de café,
a EFA avança até Mirassol em 1933; retomando a expansão
na década de 1940 chega a Votuporanga (1945), Fernandópolis
(1949), Jales (1951), Santa Fé do Sul e Presidente Vargas,
divisa com o Mato Grosso em 1952 onde "aguarda" a chegada
dos trilhos da FERRONORTE, que virão de Goiás, procedente
de Cuiabá-MT com ligação além de Santa
Fé, também com Jataí-GO e Uberlândia-MG.
Essa "nova" ferrovia, a Ferronorte, que na realidade
se inspirou no projeto pioneiro da EFA de atingir a região
do cerrado, foi formada em 1989, através de concessão
federal, com o prazo de seis anos para conclusão da obra.
Após essa conclusão, as linhas da antiga EFA, atualmente
integradas à FEPASA, passará a ser uma das mais
produtivas linhas ferroviárias do País.
ESTRADA DE FERRO DO DOURADO (317 quilômetros) - De
propriedade particular com sede em Ribeirão Bonito, passou
para o controle da Companhia Paulista através da venda
de ações. Apesar da extensão classificá-la
como média, funcionava como um ramal da "paulista"
atendendo as cidades de Novo Horizonte, Ibitinga, Itápolis,
Tabatinga, Boa Esperança, Bariri, Jaú, Bocaina e
Dourado tendo como ponto de contato com a Paulista a cidade de
São Carlos.(3)
SÃO PAULO RAILWAY (246 quilômetros) - De propriedade
particular, com sede em São Paulo, a São Paulo Railway,
primeira ferrovia construida totalmente em território paulista,
constituida com capital inglês, localiza-se estrategicamente
entre o planalto (Jundiai) e o porto de Santos, além de
servir as cidades de Atibaia, Piracaia e Bragança Paulista
seguindo até Vargem, divisa com Minas Gerais, através
da compra da Estrada de Ferro Bragantina no começo desse
século. Beneficiada com a construção de todas
as ferrovias paulistas posteriores a ela, até a década
de 1930 manteve-se como única opção ferroviária
para o porto, chegando a abrir mão do direito de prosseguir
até Rio Claro em função dessa localização
privilegiada que lhe garantia a posição de corredor
"natural" para o porto de Santos.
Em função desse enorme fluxo de carga optou pela
modernização dos seus serviços com a duplicação
da linha entre Santos em Jundiai e introdução de
novas técnicas para as linhas de serra entre 1896 e 1900,
o que nos leva a concordar com a hipótese segundo a qual,
a São Paulo Railway se "contentava" com sua extensão
tendo em vista sua localização geográfica.
ESTRADA DE FERRO SÃO PAULO MINAS (180 quilômetros)
- Inaugurada em 1893, concluiu sua implantação ligando
Bento Quirino (1903) a São Sebastião do Paraíso-MG
(1911). Construiu o ramal de Evangelina em 1928 sendo encampada
pelo governo estadual em 1931 empreendendo em 1934 a adequação
da bitola de 0,60m para l,00m, possibilitando a interligação
com a Cia Mogiana, que já estatizada desde 1952, assumiu
a administração da Estrada de Ferro São Paulo
Minas em 1967.(4).
ESTRADA DE FERRO SÃO PAULO GOIÁS (148 quilômetros)
- De propriedade particular, com sede em Bebedouro, inaugurada
em 1911 servia a região de Jaboticabal a Nova Granada,
cidades consideradas por Milliet como parte da Zona Paulista,
transportava café e algodão para as linhas da Cia
Paulista com a qual mantinha ponto contato, e veio a fazer parte
desta como "ramal de Nova Granada".
As ferrovias denominadas grandes têm em comum, o fato de
terem atingido mais de 1500 quilômetros de extensão,
e no seu processo de expansão ter englobado ferrovias menores
ou a elas associado através da compra de ações
numa constante competição em busca de novas áreas
de influência. Assim como as pequenas e médias anteriormente
relacionadas, a extensão de suas linhas referem-se ao ano
de 1940, anterior portanto, à Lei 2698 de 27 de dezembro
de 1955 que autorizava a supressão de Estradas e ramais
considerados deficitários. Para Odilon Nogueira de Matos,
o limite final da "era ferroviária".(5).
Como grandes estradas ferroviárias, passamos a classificar:
1 - Companhia Paulista de Estradas
de Ferro (1536 km)
2 - Estrada de Ferro Noroeste do Brasil (1539 km)
3 - Companhia Mogiana de Estradas de Ferro (1959 km)
4 - Estrada de Ferro Sorocabana (2074 km)
Assim, as quatro grandes ferrovias
paulistas, de um total de 8622 quilômetros de linhas em
1940, concentram 82% da rede ferroviária, enquanto as consideradas
médias representavam 14,7 % e as pequenas somente 2,8%,
o que demonstra certa definição da ocupação
do espaço geográfico ferroviário a partir
dos interesses em jogo, travados entre as "grandes"
companhias.
COMPANHIA PAULISTA DE ESTRADAS DE FERRO (1536 quilômetros)
- Após construção do ramal de Descalvado
em 1881, as concessões posteriores autorizadas pelo governo
provincial de São Paulo para a construção
de outras estradas de ferro foram dando forma a rede ferroviária
em direção ao interior procurando os limites de
Mato Grosso, Goiás e Minas Gerais. Um detalhe interessante
com graves conseqências posteriores é que a bitola
entre os trilhos, de 1,00m, diferente da utilizada pela Cia Paulista
e São Paulo Railway, que era de 1,60m, passa a ser exigida
pelo governo do estado para as concessões posteriores,
em função de suposta redução de custos,
o que acaba por criar uma descontinuidade na largura dos trilhos
a partir de Rio Claro. É diante desse problema que surge
uma nova companhia férrea, a Cia Estrada de Ferro Rio Claro,
que formada em 1882 para atender as novas exigências, inaugura
o trecho Rio Claro a São Carlos, de 72 quilômetros
em 15 de outubro de 1884 chegando a Araraquara em 18 de janeiro
de 1885, além de prosseguir em direção ao
Mato Grosso através do ramal de Itirapina, chegando a Jaú
em 19 de fevereiro de 1887.
Apesar de contar com a concessão para o prolongamento de
Araraquara a Jaboticabal e construção dos ramais
de Ribeirão Bonito (São Carlos a Ribeirão
Bonito) e Águas Vermelhas (São Carlos a Santa Eudóxia),
essa empresa foi vendida para uma companhia inglesa em 1889 passando
a denominar-se The Rio Claro São Paulo Railway Company.
Três anos depois, em 26 de março de 1892 a Rio Claro
foi adquirida pela Cia Paulista que entre vários melhoramentos,
padronizou as bitolas dessa companhia para o seu padrão,
ou seja, 1,60m de bitola entre seus trilhos.
A partir de 1910, inicia a eletrificação de suas
linhas entre Jundiai e Rincão,concluida em 1922, num total
de 285 quilômetros); chega em 1940 com mais de 450 quilômetros
de suas vias eletrificadas. Por ocupar uma posição
geograficamente privilegiada e por possuir ponto de contato especial
com as outras ferrovias, no caso, A Mogiana, e Sorocabana em Campinas
e a São paulo Railway em Jundiai, beneficiava-se com a
incorporação de ferrovias menores, contribuindo
para o aumento de sua rentabilidade. Assim, enquanto a quantidade
de café transportada diminuia de 70%
do total transportado para 15% na década de 1940, os transportes
de outras mercadorias e de passageiros foram crescendo consistentemente.
Entre a década de 1930/40 cresceu 200% em relação
ao transporte de passageiro e aumento de 300% para as mercadorias
transportadas no mesmo período, numa clara demonstração
de diversificação do transporte e saúde financeira.(6)
Após atingir Rincão com a compra da "Rio Claro
a Araraquara" em 1892, expande-se até Colômbia,
divisa com Minas Gerais em 1929; em direção ao Mato
Grosso, partindo de Itirapina chega a Baurú em 1906, Fernão
Dias, Garça e Marília em 1928, Tupã em 1941,
Oswaldo Cruz em 1949, Dracena em 1959 e Panorama, divisa com Mato
Grosso em 1962.
Nesse processo de expansão incorpora ao seu patrimônio
a Estrada de Ferro do Dourado que passa a chamar-se Ramal de Ribeirão
Bonito (São Carlos a Ibitinga) num total de 148 quilômetros;
Estrada de Ferro de Jaboticabal (Rincão a Bebedouro) num
total de 112 quilômetros e a Estrada de Ferro do Monte Alto
que passa a denominar-se Ramal de Nova Granada (Bebedouo a Olímpia),
num total de 70 quilômetros. Em 1960 além desses
já citados ramais, contava com os seguintes trechos: Ramal
de Piracicaba, (Recanto a Piracicaba Paulista), num total de 45
quilômetros; Ramal de Descalvado, (Cordeirópolis
a Descalvado, num total de 107 quilômetros; Ramal de Santa
Veridiana, (Laranja Azeda a Santa Veridiana), num total de 39
quilômetros; Ramal de Pontal, (Passagem, ponto de contato
com a Mogiana a Pontal), num total de 14 quilômetros; Linha
de Panorama (Itirapina a Panorama), num total de 535 quilômetros
e mais a linha tronco de Jundiai a Colômbia num total de
506 quilômetros. Esses dois últimos trechos são
os pontos mais avançados em direção ao interior.
Panorama e Colômbia fazem divisa com Mato Grosso e Minas
Gerais, respectivamente.(7)
Após diminuir o rítimo depois da Segunda Guerra
Mundial, o Estado de São Paulo passa a ser o acionista
majoritário a partir de 1961. A partir de 1967 a Paulista
passa a administrar a Estrada de Ferro Araraquara, que já
era estatal desde 1919. A partir dos anos 60, já não
havia mais dúvidas quanto ao fim de uma determinada "era
ferroviária". Sob a tutela do Estado, uma nova "era"
começava para as ferrovias paulistas.
ESTRADA DE FERRO NOROESTE DO BRASIL (1539 quilômetros)
- A guerra do Paraguai, (1864/1870), além do sangrento
conflito que reduziu a população daquele pais à
metade, despertou também no Governo do Império a
necessidade de construir uma ligação rápida
e segura com o "distante" Mato Grosso. Diversos projetos
de construção ferroviário foram apresentados
como alternativa a essa necessidade geo-política e econômica
que tinha entre outros objetivos encaminhar para o Brasil o comércio
do sudeste boliviano e norte do Paraguai(8).
Fundada em 1904 com capitais brasileiros e franco-belga, a Companhia
Estrada de Ferro do Noroeste do Brasil obteve a título
de incentivo, privilégio por 60 anos para construção,
uso e gozo das respectivas linhas férreas; isenção
de impostos nas importações; direito de desapropriação;
juros de 30% durante 30 anos sobre o capital de 30:000$000 (trinta
mil contos) por quilômetro; criação de campos
de experiência destinado a educação de operários
agrícolas no manejamento de instrumentos agrários;
aquisição de terras para dividí-las em lotes
de 30 hectares, vendendo-as pelo custo. Entre as obrigações
previa-se a entrega ao governo, após a inauguração
do trecho em tráfego, de uma linha telegráfica,
zelando pela sua conservação (9).
Dividida inicialmente em dois trechos (Baurú/Itapura e
Itapura/Porto Esperança, com adminstração
separada, embora sob mesmo comando empresarial, os trabalhos tiveram
de enfrentar o desconhecimento da região; doenças
e a "agressividade" indígena vitimavam em grande
número empregados e empreiteiros, criando e espalhando
uma tal impressão de pavor contra a região, que
impedia o recrutamento de novas turmas para substituir as inutilizadas
(10).
Em 1913, o governo federal encampou a Estrada de Ferro Itapura
a Corumbá subordinando-a ao Ministério da viação,
completando a ligação Bauru a Porto Esperança
em 1914, concluindo assim, a ligação ferroviária
entre a capital e o Estado de Mato Grosso. Em 1918 o governo federal
encampa o trecho Itapura a Corumbá, passando a existir
apenas uma denominação para toda a extensão
da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, que sob essa denominação
passa a ligar Baurú a Corumbá.
Segundo Milliet, é justamente nesse período de encampação
total da Noroeste do Brasil, que a expansão cafeeira, tardia
em relação às outras regiões, começa
a se firmar como alternativa no processo de povoamento dessa região,
chegando na década de 30 a representar mais de 20% do total
produzido no Estado. Juntamente com a produção de
algodão e criação de gados em larga escala,
grandes cidades se formaram rapidamente ao longo da linha. Segundo
a Revista Ferroviária, o "desenvolvimento das localidades
chegou mais cedo do que o esperado" (...) e a partir de 1925,
diversos estudos foram iniciados para a construção
de variantes que deram novas disposições ao traçado,
"abandonando regiões inóspitas e impróprias".
A mesma fonte aponta esse periodo como um momento de grande recebimento
de verbas para a construção de pontes, oficinas,
casas de operários e aquisição de material
rodante e de tração, além de maquinismos
para aparelhamento conveniente de suas novas oficinas e depósitos
de locomotivas.
Entre as principais modificações implementadas pela
administração federal, podemos destacar a construção
de diversas variantes, o prolongamento das linhas de Porto Esperança
a Corumbá, numa extensão de 97 quilômetros
que para atingir a Estrada de Ferro Brasil-Bolívia, (intercâmbio
entre esses dois países), necessitou atravessar o Rio Paraguai
através da construção de uma ponte em concreto
armado, com um comprimento total de 995 metros, além da
construção do ramal de Ponta Porã, concluido
em 1953, num total de 305 quilômetros, ligando Campo Grande
a fronteira com o Paraguai (11).
Em 1957, passa a integrar a RFFSA, com um total de 1605 quilômetros,
dos quais, 400 quilômetros em território paulista.
COMPANHIA MOGIANA DE ESTRADAS DE FERRO (1959 quilômetros)
- Inaugurada em 1875, partindo de Campinas, que já possuia
ligação com o porto de Santos desde 1875, a Companhia
Mogiana de Estradas de Ferro se expande em direção
ao Estado de Minas Gerais, acompanhando o crescimento da produção
cafeeira. Nesse processo de expansão construiu diversos
ramais de captação de cargas, cumprindo um papel
de penetração e expansão de fronteiras. Construida
conforme condições estabelecidas na época,
entre as quais, privilégio de zona de 30 quilômetros
e a faculdade de elevar tarifas para garantir renda não
inferior a 7%.
Após atingir Mogi-Mirim em 1875, inicia o prolongamento
da Estrada até Casa Branca em 1878 atingindo Ribeirão
Preto em 1883. Dentro desse período de grande surto ferroviário
no Estado, a Mogiana conclui em 1882 o ramal de Mogi-Mirim a Penha
do Rio do Peixe (atual Itapira), inaugura o ramal de Poços
de Caldas e o ramal de Ribeirão Preto a Batatais em 1886,
chegando a Franca no ano seguinte (12). Em 1888 incorpora as linhas
da Companhia Ramal Férreo do Rio Pardo, cuja concessão
garantia a expansão até São Sebastião
do Paraíso que acabou se concluindo em 1914. Nesse rítimo
de expansão, possuia em 1915 um total de 1950 quilômetros
de linhas em tráfego. Ao mesmo tempo, a produção
cafeeira na região, que no ano de 1886 representava 20%
do total da Província, chega a atingir 35% do total em
1920, garantindo a lucratividade da Mogiana.
Dados de 1901 (13) apontam que a Mogiana possuia um total de 926
quilômetros de extensão, tráfego de 538.049
toneladas e 1.399.739 passageiros transportados ao ano enquanto
a Companhia Paulista, que fazia parte do corredor privilegiado
da exportação do Estado de São Paulo possuia
863 quilômetros de extensão, tráfego de 883.992
toneladas e "apenas" 1.102.799 passageiros transportados
ao ano.
Se por um lado a Mogiana beneficiou-se com a expansão cafeeira,
por outro lado sofreu as consequências dessa crise. Diante
de problemas financeiros nos anos 30, inicia na década
seguinte um grande plano de reorganização, promovendo
empréstimos junto ao Banco do Brasil, liquidando dívidas
externas e buscando reaparelhar-se. A primeira etapa do programa
de remodelação (1945/1952) previa a aquisição
de trilhos, 15 locomotivas, 40 carros de passageiros, 300 vagões
de carga, gastos com comunicação, construção
de edifícios para estações e armazéns,
reformas de oficinas, etc (14). Segundo a mesma fonte, em 1944,
a arrecadação com o café, o produto de maior
transporte, representava 58% do total e o número de funcionários
chegava a 8500 pessoas.
O ano de 1952, que terminaria a primeira etapa do programa de
remodelação é marcado pela encampação
por parte do governo Estadual. Quinze anos depois recebe para
administrar a Estrada de Ferro São Paulo Minas, que já
pertencia ao governo do Estado desde 1931. No início da
década de 1960,(15) quando inicia-se os estudos de unificação
das ferrovias paulistas, a Companhia Mogiana contava com as seguintes
linhas em operação: linha tronco, partindo de Campinas,
passando por Mogi-Mirim, Mogi-Guaçú, Aguai, Casa
Branca, Ribeirão Preto, Orlândia, São Joaquim
da Barra, Uberaba-MG, Uberlândia-MG e Araguari-MG num total
de 689 quilômetros; contava também com o Ramal de
Itapira (Mogi-Mirim a Sapucai), num total de 52 quilômetros,
Ramal de Caldas (Aguaí a Poços de Caldas), num total
de 75 quilômetros; Ramal de Passos (Casa Branca a Passos),
num total de 275 quilômetros; Ramal de Guatapará
(Ribeirão Preto a Guatapará) num total de 82 quilômetros;
Ramal de Setãozinho (Barracão a Passagem, ponto
de contato com a Paulista), num total de 55 quilômetros;
Ramal de Franca (Entroncamento a Pedregulho) num total de 29 quilômetros;
Ramal de Jaguara (Uberaba-Mg a Jaguara-MG), num total de 101 quilômetros.
Com considerável redução das linhas em operação
e número de funcionários, passou a integrar a FEPASA
em 1971 com um total de 1445 quilômetros (menos 26%) e 5.709
funcionários (menos 32%) em relação a 1944.
ESTRADA DE FERRO SOROCABANA - (2074 quilômetros)
- A construção da Sorocabana está ligada,
na realidade à formação da Companhia Ituana
em 30 de junho de 1870, e que há muito deixou de existir
quando da fusão com a própria Sorocabana em 07 de
julho de 1893, tendo em vista, entre outros objetivos, projetos
da Sorocabana, dessa mesma época, de construção
de uma linha alternativa a São Paulo Railway, partindo
do interior para o porto de Santos, com grandes vantagens comerciais
para ambas.
A Sorocabana, segundo "conta-se" na história
ferroviária, surge quando o húngaro Mateus Maylasky
divergindo dos dirigentes da Companhia Ituana, saindo da reunião
onde sofrera a oposição que tanto o contrariara,
chegando a praça pública e lançando uma moeda
ao chapéu que retirara da cabeça, proclamou enfaticamente
sua disposição de criar uma companhia iniciando
seu fundo com aquele capital, por que não dispunha de mais
nenhum vintém"(16).
Voltemos a Ituana. Esta companhia tinha como sócios, cidadãos
de Itú e municípios vizinhos. Entre os sócios,
Maylasky de Sorocaba. Obtido a concessão para a construção
de uma estrada de ferro de Jundiai a Itú, com os mesmos
favores já concedidos a Companhia Paulista, a companhia
Ituana foi inaugurada em 1873. Possuia também concessão
desde 17 de maio de 1872 para a construção do ramal
de Itaici até Piracicaba, nesse caso sem garantias de juros
ou privilégios de zona; porém, foi garantido favor
estatal de garantias de rendas de 7% através de elevação
de tarifas, quando necessário para atingir aquela renda.
E assim, não contando com os privilégios iniciais,
somente com empréstimos é que foi possivel a conclusão
do ramal de Piracicaba em 1879.
Verdade ou fantasia, a criação da sorocabana a partir
da vontade individual de Maylasky, o fato é que a autorização
para a construção de uma estrada de ferro para Sorocaba
parte da mesma lei No 34 de 24 de março de 1870, a mesma
que autorizara a construção da estrada de ferro
de Jundiai a Itú, e de Itú uma linha que seguiria
para Sorocaba. Se observarmos o mapa de São Paulo, veremos
nessa iniciativa um total desrespeito a afirmação
matemática de que a menor distância entre dois pontos
é uma reta. O caminho São Paulo/Sorocaba via Itú,
aumentava em mais de 70% a distância em linha reta. Nesse
caso, acabou vencendo a coerência e no dia 13 de junho de
1872, iniciou-se as obras para a construção contando
como mesmos benefícios concedidos à Companhia Paulista.
Em 10 de julho de 1875 foi inaugurado o tráfego entre São
Paulo e Sorocaba, atingindo Bacaetava em 1880.
Após a fusão com a Ituana em 1893 a Sorocabana passa
a denominar-se Companhia União Sorocabana e Ituana e conclui
em 1897 o traçado inicial ligando Jundiai a Sorocaba via
Itú, através da expansão das linhas em 43
quilômetros de Itú até Mayrink, ligando-se
fisicamente através desse ponto de contato, concluindo
finalmente, a fusão iniciada quatro anos antes.
Na virada do século essa ferrovia contava com um total
de 905 quilômetros de vias, tranportando no ano de 1900,
590.017 toneladas de mercadorias e 223.807 passageiros, enquanto
a Paulista, cuja comparação exige ponderarmos para
a sua localização privilegiada, com 863 quilômetros
transportava 1.052.900 toneladas de mercadorias/ano e 676.812
passageiros/ano, (quase o dobro de cargas e o triplo de passageiros
em relação a Sorocabana(17). A comparação
faz sentido quando observamos o quadro de expansão do café
através das regiões, elaborado por Sérgio
Silva. Interessante observar, que o café na chamada região
sorocabana só é detectado nesse levantamento a partir
de 1920, o que nos leva a reafirmar a importância do café
para as ferrovias quando atentamos para as toneladas transportadas
pelas duas ferrovias, que apesar de possuirem praticamente, a
mesma extensão, diferem visivelmente quanto a sua produtividade.
Parece haver assim, boa parte de explicação para
o fato da Sorocabana ser a primeira grande ferrovia encampada
pelo governo Estadual em 1919 enquanto a Mogiana e Paulista "resistiram"
até 1952 e 1961, respectivamente. Longe de apresentarmos
a falência "precoce" da Sorocabana como sendo
causa única a expansão cafeeira na região
por ela servida, parece haver ai porém, um fato que merece
consideração.
Merece consideração também, o fato de que
após a falência em 1902, a empresa passa para o controle
federal em 1904, sendo encampada no ano seguinte pelo governo
Estadual que a arrenda para particulares em 1907, retornando para
o controle do Estado de São Paulo "definitivamente"
doze anos depois. O que ocorreu nesses dezessete anos bastantes
tumultuados para o gerencialmente racional da Sorocabana , talvêz
mereça um estudo de caso (mais detalhado) no sentido de
esclarecer os motivos que impediram uma administração
regular, mas uma vêz que o tempo e o acúmulo de materiais
não nos permite a entrada nesse ramal, continuemos em sua
linha tronco.
A segunda entrada em cena do Governo do Estado na administração
direta da Sorocabana coincide com um período de expansão
cafeeira nessa região e auge da "política dos
governadores" iniciada com Campos Sales. Se por um lado não
chegou a representar um crescimento espantoso, apresentou tendências
de crescimento nos dois últimos períodos apontados
por Milliet. Salta de 7,59% em 1920 para 12,5% em 1935. Reiteramos
que não há uma relação mecânica
entre Sorocabana, Governo e Café, mas se faz necessário
lembrar que esses elementos se relacionam intimamente, de longa
data. Dai não estranharmos o fato dessa Companhia, a partir
de 1922, passar por um grande programa de renovação
utilizando para isso recursos do Estado. A partir dessa época
inicia-se a reconstrução da linha, construção
de novas estações, casa de operários, remodelação
de traçados em muitos trechos e duplicação
das linhas entre São Paulo e Sorocaba. Conclui-se também,
na década de 1930 a ligação de Mayrink a
Santos, criando-se assim, uma alternativa para o porto, meio século
após o seu projeto inicial, passando a concorrer com a
São Paulo Railway, até então, único
caminho férreo para o mar.
Os liberais sinceros que me desculpem, mas se faz necessário
citar. As linhas da Sorocabana no ano de sua falência, possuia
900 quilômetros de extensão. Após a encampação
estatal, avançou de Presidente Bernardes para Presidente
Epitácio, divisa com o Mato Grosso ampliando nesse caso
mais 63 quilômetros de vias; construiu o Ramal de Evangelista
ligando o interior ao Porto de Santos; construiu o sub ramal de
Juquiá, ligando Samaritá a Juquiá, num total
de 142 quilômetros, organizando assim, a via férrea
no litorral sul; construiu o ramal de Dourados e concluiu a ligação
São Paulo (capital) a Santos na década de 1950,
(outra alternativa para o porto partindo agora da capital). Vinte
anos de administração estatal dobrou a extensão
quilométrica da Sorocabana que passa a ter na década
de 1940, 2.074 quilômetros.
No início dos anos 60 a Estrada de Ferro Sorocabana administrava
os seguintes trechos: Linha tronco, partindo de Júlio Prestes,
passa entre outras pela cidade de Osasco, São Roque, Mayrink,
Sorocaba, Iperó, Rubião Júnior, Ourinhos,
Assis, Presidente Prudente, num total de 842 quilômetros;
Ramal de Santos que partindo de Presidente Altino passa por Pinheiros,
Evangelista de Souza, Samaritá, São Vicente, Santos
e Estuário, num total de 117 quilômetros; sub ramal
de Juquiá, com início em Samaritá, passando
por Itanhahém, Peruíbe, Pedro de Toledo, Miracatú
e Juquiá, num total de 143 quilômetros; Ramal de
São Pedro, partindo de Mayrink, passando por Itú,
Salto, Itaici, Capivari, Piracicaba, Charqueada e São Pedro,
num total de 226 quilômetros; Sub ramal de Jundiai, ligando
Itaici a Jundiai, num total de 43 quilômetros; Sub ramal
de Pádua Sales, com início também em Itaici,
passando por Campinas, Paulínea, Cosmópolis e Pádua
Sales num total de 130 quilômetros; Sub ramal de Artêmis,
com início em Montana e término em Artêmis,
com apenas 17 quilômetros; amal de Evangelista de Souza,
com início em Mayrink passando por Calcáia do Alto,
Embú-Guaçú, Mário Solto,Evangelista
de Souza, num total de 90 quilômetros; Ramal de Itararé,
com início em Iperó passando em Tatuí, Itapetininga,
Angatuba, Buri, Itapeva, e Itararé num total de 265 quilômetros;
Ramal de Porto Feliz com início em Boituva, término
em Porto Feliz, num total de 24 quilômetros; Ramal de Tietê,
com início em Cerquilho e término em Tietê,
com apenas 8 quilometros; Ramal de Baurú, com início
em Rubião Júnior, passando por São Manoel,
Rodrigues Alves, Lençóis Paulista, Agudos, Baurú,
num total de 122 quilômetros; Sub Ramal de Coronel Leite,
com início em Virgílio Rocha a Coronel Leite, num
total de 19 quilômetros; Ramal de Pirajú, com início
em Manduri e término em Pirajú, num total de 26
quilômetros; Ramal de Santa Cruz do Rio Pardo ligando Bernardino
de Campos a Santa Cruz do Rio Pardo num total de 24 quilômetros;
Ramal de Dourados, com início em Presidente Prudente passando
por Pirapozinho, Dumontina, com término no km 782, num
total de 51 quilômetros; Linha da Cantareira com início
em Tamanduatei da Cantareira, passando por Santana da Cantareira,
Mandaqui, Tremembé e Cantareira, num total de 12 quilômetros;
Variante do Horto, com início em Invernada da Cantareira
a Nova parada sete, com apenas 3 quilômetros e por último
a linha de Guarulhos, com início em Areial da Cantareira
passando por Carandirú, Paulicéia da Cantareira,
Tucuruvi, Jaçanã, Augusta e Guarulhos, num total
de 18 quilômetros.
Ao integrar-se à FEPASA em 1971 a Sorocabana contava oficialmente
com um total de 2.016 quilômetros e 17.237 funcionários.
Mais que o dobro de funcionários da Mogiana e Paulista
juntas. Integra-se assim, a essa"nova" empresa com 38%
da extensão das vias e 47% do pessoal, uma vêz que
essa reunião das estradas de ferro numa só companhia
possuia um total de 5.251 quilômetros de vias e 36.665 funcionários
na sua "fundação".
Em linhas gerais, (e bastante gerais), me parece ser esta a trajetória
das principais ferrovias paulistas até os anos 40. Logicamente
que um trabalho específico sobre o tema entraria em detalhes
que apesar de importantes, não fazem parte do objetivo
desse trabalho, assim como o tempo e o acúmulo de conhecimentos
e materiais disponíveis, não permite uma viagem
tão longa por caminho tão importante e complexo.
Sem contar o risco que corremos ao estudar o "passado",
de não trazermos luzes para o presente, fazendo assim,
uma apologia a um tempo em que a ferrovia "funcionava",
a um tempo em que havia um "era ferroviária",
em que se "acertava-se o relógio pelo horário
da passagem do trem", etc.
Se faz necessário salientar, que não existiu um
período "maravilhoso" seguido de estagnação
e declíeno por culpa do governo em função
de sua intervenção empreguista e ineficiente como
quer o discurso liberal, mas sim uma ocupação econômica,
social e política que no contexto da economia agrária
cafeeira, funcionava obedecendo a essa lógica da sociedade.
Melhor dizendo (para corrigir um pouco o funcionalismo exacerbado
), obedecia a lógica da nossa sociedade com todos os seus
defeitos e virtudes. Não existe aqui, espaço para
a defesa do caminho "certo ou errado" no processo de
formação do sistema ferroviário paulista,
mas ressaltar o quanto a participação estatal tem
participado da implementação das vias férreas,
bem como de sua manutenção, expansão e mesmo
adminstração.
NOTAS
1 - Furtado, Celso - Formação
Econômica do Brasil - 23ª edição, Companhia
Editora Nacional, São Paulo, 1989.
2 - Silva, Ayres Reis e - Estatísticas, dados diversos-
cópia radiotelegramada ao ministro dos transportes para
figurarem em volume historico biográfico a ser editado
na I Semana Nacional dos Transportes entre 25 e 31 de julho de
1969 - 18/03/1969-
3 - Revista Ferroviária - Setembro de 1991, p 16. Publicação
Mensal da Empresa Jornalística dos Transportes Ltda. Rio
de Janeiro,RJ.
4 - Exposição Comemorativa do 14º aniversário
da FEPASA -1985 - Roteiro de visitação.
5 - Matos, Odilon Nogueira de - Café e Ferrovias ( A evolução
de São Paulo e o desenvolvimento da cultura cafeeira) Pontes
editores, Campinas, 1990, p 163 a 168.
6 - Estradas de Ferro do Brasil - Suplemento Revista ferroviária,
1945.
7 - Matos, Odilon Nogueira de - Café e ferrovias. p 130.
8 - Azevedo, Fernando de - Um trem corre para o oeste. Estudo
sobre a Noroeste e seu papel no sistema de viação
nacional. São Paulo, Martins, 1950.
9 - Matos, Odilon Nogueira de - Café e ferrovias
10 - idem, p 131.
11 - Suplemento da Revista Ferroviária, 1945. p 219
12 - Pinto, Adolpho Augusto - História da Viação
Pública de São Paulo. Coleção Paulistica,
Vol II, 2ª edição, São Paulo, 1977.
13 - idem
14 - Suplemento da Revista Ferroviária, 1945, p 207.
15 - Guia Geral das Estradas de Ferro e Empresas de Transportes
com Elas Articuladas.
16 - Supl. Revista Ferroviária, 1945, p 179
17 - Pinto, A Augusto - História da Viação
Pública de São Paulo.
Parece haver um certo consenso
na sociedade de que as ferrovias no Brasil, há muito perderam
seu caráter dinâmico que era visível no início
do século até por volta dos anos de 1960. Podemos
constatatar a olho nú que ao falar do trem a imagem de
referência normalmente é uma "maria fumaça",
o que reflete um certo saudosismo em função do desuso
social em grande escala desse meio de transporte.
Alguns autores localizam a crise do sistema a partir de 1940.
Flávio Azevedo Marques de Saes "responsabiliza"
a industrialização e mudanças no setor agrícola
após 1940, como elementos centrais do declínio do
sistema ferroviário. Já Odilon Nogueira de Matos,
entende que a partir de 1940 ocorre o fim da "era ferroviária".
Em função das ferrovias não terem sido "aparelhadas,
nem corrigidos seus erros básicos, não tiveram condições
para resistir à concorrência das rodovias".
Assim, superado o fundamento econômico que as motivaram,
a solução encontrada a partir da década de
1950 foi a desativação de muitas pequenas ferrovias
e ramais considerados ociosos. Para ele, a Lei nº 2698 de
27 de dezembro de 1955, que passa a regulamentar a supressão
de linhas no Brasil, é uma prova do fim de um modêlo
de transporte e entrada numa nova era, a rodoviarista.
Parece certo afirmar que muita coisa mudou na concepação
e forma de gestão do sistema ferroviário no Brasil.
A intervenção estatal que até momento se
dava de forma setorizada, principalmente em São Paulo,
a partir dos anos 50 começa a se dar de maneira direta.
Wilson Cano diz que o censo de 1907, já apontava que grande
parte das ferrovias nacionais eram deficitárias, e aquelas
que ainda representavam algum resultado positivo, estavam na realidade,
em deplorável situação financeira, como a
Central do Brasil, por exemplo, cujos custos representavam 96,5%
de suas receitas. Assim, essa grande oportunidade de aplicação
financeira do capital cafeeiro nas ferrovias, tornou-se mais tarde
uma aplicação "improdutiva" do ponto de
vista privado de uma inversão capitalista. Assim, a diminuição
da taxa de lucro acabaria por consolidar uma situação
deficitária, que teria como único "remédio",
a encampação(1).
Esse remédio parece ter sido indicado em diversas situações,
com um certo critério dando a impressão de apôio
aos interesses regionais como forma de manter as ferrovias servindo
determinda região do Estado. Esse raciocínio se
aplica aos casos de intervenção na Estrada de Ferro
Dom Pedro II ainda em 1865, Estrada de Ferro Sorocabana em 1904
(encampação federal), e 1905 e 1919 (encampação
estadual), Estrada de Ferro Araraquara em 1919, Estrada de Ferro
São Paulo Minas em 1931 entre outras pequenas "ingerências"
estatal nessas e noutras empresas. O que diferencia a partir dos
anos de 1960 é o caráter administrador que o Estado
passa a exercer. Dessa maneira após assumir diretamente
o controle das ferrovias, o Estado passa a dar uma nova forma
nesse sistema, implementando cortes de ramais considerados ociosos,
diminuindo o número de empregados, aumentando a capacidade
transportada ao melhor estilo da chamada "livre iniciativa".
A nível federal essa tendência é constatada
com a criação da RFFSA (Rede Ferroviária
Federal S/A) em 1957, quando a junção de dezessete
ferrovias unificam 28.460 quilômetros de linhas, antes "espalhadas"
pelo Brasil inteiro, passando a traçar linhas gerais para
essa teia complexa onde as normas, regulamentos, sistema de operacional,
etc, divergiam completamente. Desse total de ferrovias que passam
a ser gerenciadas pela RFFSA, três delas se localizam ou
passam pelo território paulista; Estrada de Ferro Central
do Brasil, Estrada de Ferro Santos a Jundiai e Estrada de Ferro
Noroeste do Brasil.
O "enxugamento" desse conjunto a nível de pessoal
empregado e erradicação de trechos considerados
ociosos, são constatados no primeiro anuário estatístico
da RFFSA, na realidade um primeiro balanço oficial feito
em 1962, que comparando os anos de 1948 a 1961, indicam que o
conjunto dessas ferrovias unificadas na "Rede" possuiam
em 1948, 135.188 funcionários para uma extensão
de 26.999 quilômetros; Em 1957, ano da fundação
da "nova" companhia, os números indicavam 161.791
funcionários para um total de 28.460 quilômetros.
Porém, em 1961 os dados indicam uma redução
para 152.462 funcionários num total de 28.547 quilômetros.
Interessante observar que a tendência de queda do número
de funcionários persiste até o período que
dispomos para consulta. Em 1970, a quantidade de funcionários
chega 123.862 enquanto a extensão das vias também
diminuem em 1975 para 24.491 quilômetros chegando em 1990
a apenas 22.029 quilômetros, o que indica de certa forma
uma reformulação em todo esse período(2).
Se faz necessário salientar, que precisaríamos aprofundar
o estudo da formação da RFFSA para entendermos as
diversas modificações que essas ferrovias sofreram.
O que pretendemos aqui é afirmar que havia a partir desse
período um projeto estatal (ou uma tentativa de projeto)
para o conjunto da malha ferroviária brasileira. Se por
um lado não temos condições de argumentar
os motivos particulares que levaram essas ferrovias a encontrarem
na tutela estatal a garantia para continuarem operando em suas
regiões, por outro, podemos dizer que nesse período
fica evidente a tentativa de uma reformulação pensada
a nível inter-regional, ou seja, a idéia de planejamento
ganha forma "também" na reformulação
do sistema ferroviário, que por sua vêz estava contido,
no sistema viário do País, que através de
suas elites, já havia optado pela rodovia e sua indústria
automobilística.
Dados do Anuário Estatístico da RFFSA e DNEF (1961),
indicam que para a extensão da rede ferroviária
nacional, de 37.230 qui lômetros,em tráfego em 1960,
28.633 quilômetros eram de propriedade da Rede, ou seja,
77% do total, sendo o restante, 8.597 quilômetros de propriedade
do governo do Estado de São Paulo e particulares, o que
demonstra uma concentração administrativa da malha
ferroviária nas mãos do Estado, que acaba por forjar
esse atual sistema férreo nacional construido nos últimos
trinta anos.
Assim, nessas três últimas décadas a concentração
e redefinição do papel das ferrovias no contexto
econômico, acabou por redefinir usuários e produtos,
que de forma seleta continuam a usufruir de maneira privada desse
patrimônio público. Assim, mesmo após o rearranjo
político e econômico pós hegemonia oligárquica,
o controle das ferrovias continua atrelado a interesses de alguns
grandes grupos econômicos que interferem diretamente na
condução política do Estado, tirando daí
proveitos econômicos. Na realidade muito mudou para que
pouco se alterasse.
Segundo dados levantados na Conferência Nacional dos Transportes
Ferroviários (CNT) em Brasília, maio de 1992, o
transporte ferroviário brasileiro, possui atualmente perto
de 30.000 quilômetros de vias operado por cinco grandes
empresas, quatro das quais, de propriedade do governo federal
e uma do governo do Estado de São Paulo, a saber: RFFSA,
(Rede Ferroviária Federal SA), EFVM (Estrada de Ferro Vitória
Minas), EFC (Estrada de Ferro Carajás), CBTU (Companhia
Brasileira de Transportes Urbanos) e FEPASA (Ferrovia Paulista
SA), essa última, de propriedade do governo paulista. Segundo
a mesma fonte, esse conjunto de ferrovias é responsável
pelo transporte de aproximadamente 20% do total de cargas do país.
O que chama a atenção sobre o uso restrito da ferrovia
nacional, é a irrisória diversidade dos produtos
transportados. Apenas cinco produtos, juntos representam 90% do
total tansportado. Minério de ferro, granéis agrícolas
para exportação, combustíveis, produtos siderúrgicos
e cimento, praticamente " fecham" a pauta de produtos
transportados pelas ferrovias da Nação.
1 - A SOLUÇÃO PAULISTA
Como vimos anteriormente, no
ano de 1940 a ferrovia paulista atinge sua maior extensão,
ou seja, 8.622 quilômetros. Após esse período
as pequenas ferrovias que na prática já funcionavam
como ramais das ferrovias maiores, passam a a ser administradas
por estas, que implementam cortes de trechos considerados deficitários
tendo em vista a readequação ao modêlo econômico
implantado no país após a segunda guerra mundial.
O Estado de São Paulo chega aos anos de 1960 com uma rede
ferroviária bastante depurada do ponto de vista da sobrevivência
econômica e operacional, que continua funcionando até
os dias atuais.
Percebe-se assim, uma nova estrutura que consiste basicamente
na encampação estatal das últimas ferrovias
privadas existentes no Estado. No ano de 1960, entre as quatro
grandes ferrovias paulistas, duas delas, Mogiana e Sorocabana,
pertenciam ao Governo; A Noroeste do Brasil, pertencia ao governo
federal e somente uma, a Companhia Paulista pertencia a iniciativa
privada. Entre as médias, de um total de cinco, apenas
duas continuavam a operar como empresa, mesmo assim, sob controle
estatal. A Estrada de Ferro Araraquara sob controle do governo
do Estado desde 1919 e a São Paulo Railway encampada pelo
governo federal desde 1946; A Estrada de Ferro do Dourado havia
sido incorporada pela Paulista juntamente com a Estrada de Ferro
São Paulo Goiás, enquanto a São Paulo Minas
era administrada pela já estatizada Mogiana desde 1931.
Quanto as ferrovias pequenas, algumas foram extintas, como a Estrada
de Ferro Monte Alto e Estrada de Ferro Itatibense; outras foram
incorporadas à Paulista como é o caso da Estrada
de Ferro do Morro Agudo, Estrada de Ferro Jaboticabal e Estrada
de Ferro Barra Bonita. A Sorocabana incorpora o Ramal Férreo
Campineiro enquanto outras ferrovias continuam a existir, sem
grande expressão econômica, servindo a fins específicos
como é o caso da E.F Campos do Jordão que serve
ao sanatório Estadual e passeios turísticos ou empresas
como a Estrada de Ferro Perús-Pirapora e Estrada de Ferro
Votorantim que prestam serviços a empresas particulares
as quais estão subordinadas.
Certamente que esse processo de readequação da rede
ferroviária paulista não estava isolado de um contexto
mais amplo. Como vimos, nesse período as ferrovias brasileiras
passavam por uma grande reorganização técnico-político
e operacional que praticamente definiu um outro modo de funcionamento
que vem sendo implementado até os dias atuais. O quadro
de redução da malha ferroviária nacional
era assim articulado com a política de implantação
da indústria automobilística. Na realidade, um novo
caminho político estava sendo aberto conforme podemos constatar
na tabela abaixo.
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Locomotivas | 4.454 | 2.351 | 2.336 | - 47,5% |
Carros passag. | 4.611 | 5.419 | 2.054 | - 55,5% |
Vagões | 59.382 | 68.500 | 73.428 | + 23,7% |
Total | 64.447 | 76.270 | 77.818 | + 20,7% |
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Automóveis | 4.454 | 2.351 | 2.336 | + 880 |
Ônibus | 27.645 | 50.767 | 113.926 | + 312 |
Caminhão | 389.773 | 454.259 | 4.072.033 | + 945 |
Outros | 193.356 | 426.165 | + 120 | |
Total | 987.613 | 3.022.681 | 9.691.150 | + 881 |
fonte: Jacob, Chafic - Ferrovia O caminho certo. Imprensa oficial do Estado, São Paulo, 1982, p 137 e 138
Enquanto diminuia-se o número de locomotivas, principalmente
em função da desativação da tração
a vapor entre 1960/1970 que de 3394 foi reduzida para apenas 597
"marias fumaça", diminuia-se o número
de carros de passageiros e ampliava-se as "opções"
automóvel/caminhão. Mesmo o aumento do número
de vagões é insignificante em relação
ao número de caminhões, principalmente se levarmos
em consideração o crescimento econômico no
período. Ainda como demonstração da opção
pelo "rodoviarismo" após os anos 40 basta observarmos
a participação das ferrovias comparadas as diversas
modalidades de transportes no Brasil.
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Rodoviário | 38,0 | 60,5 | 69,6 | 70,0 |
Ferroviário | 29,2 | 18,7 | 16,9 | 17,0 |
Hidroviário | 32,4 | 20,6 | 12,1 | 10,2 |
Dutoviário |
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1,3 | 2,6 |
Aeroviário | 0,4 | 0,2 | 0,1 | 0,2 |
Total | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 100,0 |
Fonte: Jacob, Chafic - op cit, p.117.
É dentro desse contexto
de aparente crise, declínio e decadência que o Estado
assume "definitivamente" o controle das ferrovias paulistas
fazendo coro a tendência nacional de estatização
do sistema. Em 1961, a última grande companhia férrea
passa para o controle estatal paulista, iniciando assim ao meu
ver, a organização de um sistema ferroviário
no Estado, uma vêz que implanta-se regras e diretrizes que
unificam estratégias políticas e econômicas
para o conjunto da malha ferroviária paulista, dotando-a
de uma racionalidade que não faz parte da preocupação
do capitalista enquanto proprietário privado.
Dentro dessa perspectiva de ordenamento do "caos" que
estudos do Instituto de Engenharia de São Paulo, sugerem
a criação da RFP - Rede Ferroviária Paulista
- que sob controle estatal deveria agrupar todas as ferrovias
estatais numa mesma empresa. Projetos nesse sentido foram apresentados
a Assembléia Legislativa nos anos de 1962 e 66 e 1971,
quando foi finalmente aprovado a criação da FEPASA
(Ferrovia Paulista S.A), que passaria a administrar numa só
diretoria, as companhias férreas, Paulista, Sorocabana,
Mogiana, São Paulo Minas e Araraquarense, (e outras a elas
já agregadas).
O que vem a seguir, levanta muito mais questões do que
esclarecimentos. Aparentemente, o Estado passa a adotar uma política
de racionalização do sistema que mais parece um
grande empreendedor privado do que o tão criticado aparelho
de "ineficiência e empreguismo" atualmente criticado
pelos defensores do "Estado" mínimo. Para se
ter uma idéia da nova postura frente a gestão dessas
ferrovias, quanto ao corte de ramais e despesas, reduz-se o número
de funcionários de 42.963 em 1965 para 36.665 no ano de
formação da "nova" empresa em 1971. De
um total de 6.594 quilômetros de vias em 1965, reduz-se
para 5.295 quilômetros em 1975. O enxugamento da máquina
não para por aí. Se compararmos o período
1971/1990 constataremos que a intervenção estatal
operou, do ponto de vista do capital, uma "modernização"
no gerenciamento dessas empresas que num primeiro momento merecem
ser destacados como qualidades, que precisam ser melhor estudadas
para aprofundarmos nosso conhecimento sobre a ferrovia paulista,
para entendermos a quem efetivamente interessou essa reestruturação.
Assim, no ato de junção das cinco ferrovias que
operavam anteriormente isoladas, a FEPASA contava com um total
de 36 mil funcionários, 5.251 quilômetros de vias,
622 locomotivas, 1109 carros de passageiros de longo percurso,
116 trens unidades para o transporte urbano e 17.200 vagões
que transportavam aproximadamente 10 milhões de toneladas
por ano (3). Em 1990, apresenta dados que apesar de não
falarem por si, levanta questões intrigantes. Reduz o número
de funcionários nesse período para apenas 18.603
enquanto a extensão das linhas também se reduz para
4.929 quilômetros. Reduz o número de locomotivas,
que cai para 496; reduz a frota de carros de passageiros para
apenas 266; amplia os trens unidades de transporte urbano para
422; reduz também o numero de vagões que passam
a contar um total de 13.211 unidades. Nesses dezenove anos, apesar
da redução em 20% no total de locomotivas, 42% no
total do pessoal e 23% no total de vagões, consegue transportar
um total de 22 milhões de toneladas/ano, portanto, aumento
de mais de 100%, com previsão de atingir um total de 30
milhões/ano a partir da inauguração da FERRONORTE,
prevista para 1995, o que de certa forma sintetiza o discurso
da eficiência gerencial adotada nesse período
2 - O PONTO DE VISTA DOS TRABALHADORES
O preço da reesturuturação,
sem dúvida foi muito alto para os trabalhadores dessas
ferrovias. Sob regime da ditadura política, os setores
organizados dos trabalhadores enfrentavam todo tipo de adversidades
para interfirir no processo de reorganização das
ferrovias paulistas. A partir da incorporação das
ex companhias à FEPASA, deflagra-se um verdadeiro processo
de decomposição da categoria ferroviária
que passa a ser agredida em suas conquistas mais expressivas.Embora
não houvesse qualquer distinção funcional,
havia distinção de direitos entre os admitidos pelo
regime jurídico da CLT a partir de 1971, e os chamados
"estatutários", regidos pelo Estatuto dos Ferroviários
das Estradas de Ferro de Propriedade e Administração
do Estado de São Paulo. Segundo avaliação
do sindicato da Sorocabana, (Primeiro Simpósio sobre os
Problemas da Ferrovia e dos Ferroviários, São Paulo,
4 a 7 de setembro de 1981), "a criação (ilegal)
do quadro especial à disposição da Secretaria
dos Transportes põe milhares de ferroviários (ditos
estatutários) na condição de "excedentes",
a maior parte inaproveitáveis na ferrovia (...). Assistiu-se
a dolorosa transformação de veteranos ferroviários
em inspetores de alunos ou faxineiros de escolas estaduais, motoristas
da polícia, etc, em condições ilegais e humilhantes.
Assim foi possível reduzir o número de funcionários
nos anos seguintes, ao mesmo tempo em que a FEPASA, ao lado da
CMTC, disputava o lugar de campeã das reclamações
trabalhistas".
Diante da prática da empresa de "convencer" funcionários
estatutários a abrir mão de direitos como licença
prêmio, licença gala e nojo de oito dias, estabilidade
no emprego, entre outros, em troca da "opção"
pelo fundo de garantia, a saída encontrada pela categoria
em negociações exaustivas foi a elaboração
de um Contrato Coletivo de Trabalho celebrado em 1976 que assegurava
alguns direitos do "Estatuto" para todos os funcionários,
reestruturando-se assim no campo jurídico-trabalhista,
a situação dos trabalhadores. Após cinco
anos de reorganizaçao, afastamento de funcinários,
aposentadorias e mortes, o Contrato Coletivo entra em vigor no
momento em que o quadro de funcionários havia se reduzido
(em dezembro de 1975) para 24.892 pessoas, ou seja, uma redução
de 11.750 trabalhadores(4)
Deliberadamente a empresa aumenta o grau de exploração
da mais valia da categoria em função da política
de redução de empregados dispensados, aposentados,
falecidos e transferidos para as Secretarias do Governo do Estado.
Em resposta a essa situação, a avaliação
sindical no citado simpósio de 1981, diz que "a empresa
apresenta quadros e números reveladores de aumento de produtividade,
porém não amplia o insuficiente número de
funcionários nem efetiva e remunera de forma correta seus
servidores, obetendo expressivos lucros e vantagens ilícitas
dessas práticas atentatórias ao Contrato Coletivo
que se recusa a cumprir". Dez anos depois o quadro de funcionários
continua a diminuir, reduzindo de 19.363 pessoas no ano do simpósio,
em 1981 para apenas 17.658 funcionários em 1991. Assim,
o quadro funcional do período (1971/1991) reduz para menos
da metade, uma vêz que o quadro funcional atinge um total
de 18.984 pessoas, ou seja, um corte de 52% na força de
trabalho. Por outro lado, a quantidade de cargas transportadas
segue na relação inversamente proporcional. Enquanto
em 1971 a quantidade transportada ficava perto de dez milhões
de toneladas/ano, na década de 90 ultrapassava os vinte
milhões com tendência de ampliação
(5).
Não podemos perder de vista o momento político em
que se dá a formulação desse contrato coletivo.
O peso da Lei de Segurança Nacional, imposto pela ditadura,
que impedia o direito de greve, autonomia sindical, etc, tornava
o momento bastante propício para a empresa definir um regime
jurídico para a política de recursos "humanos".
Interessante observar que o sujeito que propunha a unificação
da ferrovia, obviamente não se interessava pela unificação
dos ferroviários. Utilizando de todo o aparato das leis,
cooptação política de lideranças sindicais,
entre outras práticas, o Estado-patrão conseguiu
negociar com os sindicatos isoladamente enquanto preparava um
conjunto de normas, regulamentos, etc que viriam a moldar uma
única empresa.
Críticas a essa forma de organização sindical
começam a ganhar peso após o começo da abertura
política do final dos anos 70, com a formação
da oposição sindical que inicia uma crítica
política aos acordos das "lideranças"
que negociaram os direitos dos trabalhadores ferroviários
na fase de formação da FEPASA. Essa reavaliação
entendia como negativo para os trabalhadores esse corporativismo
às avessas que buscava organizar-se a partir de uma visão
"regional", ou seja, que no ato da negociação,
se considerava funcionário ainda da ex Sorocabana, Mogiana,
Paulista, etc. Essa nova posição dos ferroviários
começa por denunciar a falsa teoria de neutralidade da
política do aparelho de Estado, que apostava na manutenção
da divisão da categoria ferroviária no Estado de
São Paulo. Internamente ao movimento sindical, essa posição
consiste em combater o fracionamento dos trabalhadores nas ferrovias
paulistas, que nesse processo parece não ter conseguido
encontrar um norte organizativo.
Longe de querer buscar "atributos" para a categoria
ferroviária paulista, passo a levantar alguns elementos
que confirmam a busca da unificação política
dessa categoria.
Apesar de existirem atualmente no Estado de São Paulo,
basicamente duas empresas ferroviárias (RFFSA e FEPASA),
existe uma diversidade de sindicatos ferroviários todos
de base estadual e com regiões nem sempre bem delimitadas.
No caso da Rede, os trabalhadores da antiga São Paulo Railway,
Noroeste do Brasil e Central do Brasil, são representativamente
divididos em três sindicatos. No trecho que vai da baixada
santista e região de São Caetano até Jundiai,
os ferroviários são representados pelo sindicato
dos ferroviários de São paulo. No trecho que vai
de Mogi das Cruzes ao Rio de Janeiro a representação
é do sindicato dos ferroviários da Central do Brasil,
com sede no Rio de Janeiro. No trecho que vai de Baurú
até Campo Grande (MS) a representação fica
por conta do sindicato dos ferroviários da zona noroeste.
No caso dos funcionários da FEPASA a situação
também é bastante complexa uma vêz que a estrutura
sindical das antigas companhias continuam a "ignorar"
a unificação de 1971. Das cinco ferrovias que vieram
a formar a FEPASA, as únicas que já tinham sindicatos
reconhecidos era a Companhia Paulista e Companhia Mogiana; ocorre
porém, que ao invés de fundir-se, foram criados
mais dois sindicatos, a saber, Sindicato dos Trabalhadores da
Zona Sorocabana em 1974 e Sindicato dos Trabalhadores da Zona
Araraquarense em 1983, além da existência do Sindicato
dos Engenheiros e Federação Nacional dos Trabalhadores
Ferroviários que representa os trabalhadores da antiga
Estrada de Ferro São Paulo Minas. Vale lembrar que existe
apenas um regime de trabalho e jurídico para o conjunto
dos funcionários, não havendo inclusive possibilidade
de acordos diferenciados com os sindicatos. Na prática
funciona como elemento criador de uma divisão fictícia
afastando o fantasma dos antigos movimentos de luta dos ferroviários.
3 - PRIVATIZAÇÃO SEM TRAUMAS
"Privatização?
Nem pensar. Depois da tentativa fracassada do MDU (Movimento Democrático
Urbano) de operar a SR3 e SR4 (superintendências da RFFSA
em São Paulo); depois de arquivado os planos do Governo
Sarney de lançar ações da Rede, vai passar
algum tempo antes dos empresários enfrentarem de novo o
establishment das operadoras e sindicatos. Nada impede, no entanto,
que esse imenso angú seja comido pelas bordas, e que, sem
levantar celeuma, os usuários do sistema ferroviário
se aproximem pouco a pouco das operadoras oferecendo meios de
que só eles dispõem para resolver os problemas que
sentem mais do que ninguém".
Revista Ferroviária, janeiro de 1990. p.15
Depois da decadência econômica
das ferrovias após a segunda guerra mundial, a denominada
iniciativa privada parece ter se dirigido para outros investimentos,
de menor risco, "abandonando" as estradas de ferro ao
"remédio" da encampação, como diz
Wilson Cano.
No ato de fundação da Ferrovia Paulista S/A em 1971,
entre os acionistas não desponta nenhum grande banco privado
ou grupo econômico exportador. Segundo o primeiro relatório
anual da empresa, de 1972, os acionistas fundadores são:
- Fazenda do Estado de São Paulo
- Banco de Desenvolvimento do Estado de São Paulo
- DERSA - Desenvolvimento Rodoviário S/A
- CAIC - Companhia Agrícola, Imobiliária e Coloniadora
- Companhia de Seguros do Estado de São Paulo
- CEAGESP - Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais
de São Paulo.
- IPESP - Instituto de Previdência do Estado de São
Paulo
Octávio Ianni, ao discutir o papel do Estado e iniciativa
privada lembra que "existe momentos do processo de desenvolvimento
das forças produtivas em que o Estado se torna imprescindível,
para que o processo não se interrompa, nem sofra distorções
indesejáveis para certos setores da população
(...). Quando se torna empreendedor autônomo, o Estado esá
reagindo a determinados desequilíbrios estruturais, que
a iniciativa privada não percebe ou não tem capacidade
para enfentar".
Em outras palavras está assumindo massa falida socializando
prejuízos com a população para continuar
a atender demandas do setor agro-exportador; uma postura que não
chega a ser novidade para a elite usuária dos caminhos
para o porto. Porém, passado duas décadas de gestão
estatal, após grandes obras de infra-estrutura que racionalizam
o tráfico, diminuem o efetivo, e aumentam a capacidade
transportada, etc, retorna o discurso da privatização,
ora frontal, ora dissimulado, como a matéria jornalistica
acima citada. Ora bendito, ora maldito, a relação
iniciativa privada e empresa estatal deixa claro não haver
limites devidamente demarcados entre o bem público e o
privado.
A "volta" da iniciativa privada é então
anunciada através de parcerias que se dão na construção
de terminais, manutenção e construção
de vias permanente, reforma e aquisição de vagões
e locomotivas, que deixando de assumir o risco do gerenciamento,
interferem "informalmente" nos rumos, loteando fluxos
de transportes em suas áreas de operação.
Assim, a participação desses usuários em
instalações fixas e material rodante divulgados
em janeiro de 1990 pela Revista Ferroviária, apontavam
as seguintes "parcerias":
Matosul - terminal de baldeio
em Baurú e terminal rodo viário de cargas em Campo
Grande (MS).
Cargill Agrícola - terminais intermodais em Santos, Presidente
Epitácio e Santa Fé do Sul
Cutrale Quintela - Terminais em Santos, Colômbia e Panorama.
CNAGA - Terminal de Boa Vista.
FERRONORTE - terminal em Santa Fé do Sul
Colúmbia Armazéns Gerais - terminal em Boa Vista.
Cutrale - Quintela - manutenção,
troca de dormentes e capina no trecho Colômbia-Barretos.
CBA - Construção de ramal de 4.800 metros entre
Alça de Pantojo e Alumínio.
Cimento Itaú - Reparação
de vagões para transporte de cimento a granel.
Camargo Correa Industrial - Reparação de vagões
para transporte de cimento
Citrosuco Paulista - Reforma de vagões comuns em graneleiros.
Citropectina - Reforma e transformação de vagões
comuns em graneleiros.
Frutesp - reforma e transformação de vagões
comuns em graneleiros.
Meca Navegação - Reforma de vagões fechados
de bitola estreita em graneleiros de bitola larga.
Cutrale - Quintella - Rforma de 350 vagões fechados em
graneleiros.
FERRONORTE - Reforma de 150 vagões fechados em graneleiros
Champion Papel e Celulose - Reforma de 60 vagões gaiolas(transporte
de animais) em vagões plataformas.
Petrofértil - Aquisição de 25 vagões
para transporte de enxofres.
Valefértil - aquisição de 77 vagões
para o transporte de amônia.
Ultrafértil - aquisição de 115 vagões
para transporte de uréia.
Shell, Atlantic, Esso, Ipiranga, Texaco, Petrobrás - Aquisição
de 1.514 vagões para o transporte de derivados de petróleo
e álcool.
Gessy Lever - aquisição de 72 vagões para
o transporte de óleo vegetal.
SANBRA - Aquisição de 31 vagões para transporte
de óleo vegetal.
Ciminas - Aquisição de 210 vagões para o
transporte de cimento.
Cutrale-Quintela- Aquisição de 7 locomotivas de
3.000 hp
FERRONORTE - Aquisição de 7 locomotivas de 3.000
hp
Longe de querer criticar a forma
de parcerias que vem sendo desenvolvidas como os usuários,
que na realidade consiste, teoricamente, em adiantamento de pagamento
de fretes futuros, nosso objetivo aqui é constatar a "volta"
da iniciativa privada. Se essa volta consiste em preparação
para "comer o angú pelas bordas", somente uma
investigação mais criteriosa poderia levantar questionamentos
ou elogios dessa nova postura. Até pelo fato dessa empresa
ser pública, o que fica em aberto é a possibilidade
de investigações por parte do poder público,
se houver "dúvidas no ar" em relação
a essas parcerias. Mas se faz necessário refletir, até
que ponto o "pequeno" usuário teria condições
de intervir nesse jogo de influências entre os poderes políticos
que "ganham" a gestão da empresa a partir dos
resultados eleitorais e os interesses dos grandes usuários
que de certa forma dominam o fluxo de cargas do Estado em direção
a exportação.
O fato é que propostas de ampliação dos serviços
ferroviários, como transporte de pequenas cargas, transparência
na gestão, participação dos trabalhadores
nos lucros, etc, ficam politicamente prejudicados em função
de que a neo reformulação da gestão da ferrovia
paulista, pós reestruturação, acabou por
contemplar os grandes grupos de pressão econômica
que garantem entre si, e para si, o domínio dos rumos administrativos,
e operacionais, moldando assim, uma ferrovia de muitos para atender
interesses de poucos. Se por um lado essa situação
não é novidade para um país de tradição
patrimonialista, como o Brasil, por outro lado, a gestão
da coisa pública, numa sociedade democrática, não
pode mais ser feita a quatro paredes, onde interesses de grupos
tenham prioridades sobre os interesses da comunidade.
CONCLUSÃO
As ferrovias brasileiras, a
princípio investimentos privados, acabam indo precocemente
à falência, tendo como remédio, a encampação
estatal. Para alguns autores, como Odilon Nogueira de Matos e
Flávio Azevedo Marques de Saes, essa situação
se agrava a partir dos anos de 1940, quando o café, principal
produto dessas ferrovias, entra em declínio na década
de 1930. O auge desse processo de intervenção estatal
ocorre após a segunda guerra mundial com a "compra"
das decadentes ferrovias inglesas dentro de um contexto de participação
crescente do Estado na economia. Assim, a formação
da RFFSA em 1957, a nível federal e FEPASA a nível
estadual encerra um ciclo de intervenção esporádica
para uma intervençõ direta e "permanente"
que se reproduz nos últimos trinta anos.
A participação empresarial, fica praticamente ausente
em relação a investimentos após a crise de
1930/40, porém continuam beneficiados por essas ferrovias
que continuam a garantir a exportação de seus produtos
para exportação. Aliás, uma exportação
que se dá desde a segunda metade do século XIX,
primeiramente com o café, depois algodão, açúcar,
e atualmente soja e derivados de laranja, entre outros.
O que aparenta uma certa contradição num primeiro
momento, é que a administraçao estatal direta a
partir dos anos 50/70, acaba por produzir uma reorganização
do sistema ferroviário nacional, diminuindo o quadro de
funcionários, promovendo cortes de ramais e ferrovias considerados
ociosos, entre outras obras de infra-estrutura, que acaba por
aumentar a produtividade dessas ferrovias antes falidas. Longe
de ser apenas "empreguista e ineficiente" como quer
o discurso neo liberal, o Estado (a nível estadual) acaba
por implementar na prática um receituário da iniciativa
privada, ou seja, redução de custos e aumento de
produtividade.
Esse trabalho porém, apesar de restrito do ponto de vista
da intenção inicial, que seria refletir sobre os
últimos trinta anos da ferrovia paulista, efetivamente
sobre controle estatal, passa a ser uma introdução
ao tema, ampliando de certa forma, o conhecimento sobre o tema
inicialmente pensado (As ferrovias em São Paulo - 1960-1990),
que (pretendo), será desenvolvido posteriormente...
AGRADECIMENTOS
Esse trabalho, apesar de sua
incompletude, não seria "concluido" sem a colaboração
de diversas pessoas, entre elas, amigos e colegas de trabalho
ferroviários que de alguma forma "palpitaram"
e acompanharam boa parte dessa pesquisa. Entre eles, Teodoro,
João Soldi, Cabau, Tito, Bonifácio, Gallo, Mário,
Engenheiros Hugo e Ney Melo, Maria Helena e demais colegas da
biblioteca da fepasa (Barra Funda),entre outros.
De maneira especial, agradeço a três mulheres especiais.
Vera Botta, Márcia e Mariana. A Vera pela sua orientação
apesar de seus inúmeros compromissos acadêmicos e
políticos; a Márcia, pela colaboração
direta em diversos momentos dessa etapa angustiante de final de
curso; e a Mariana, minha filha querida, que apesar da idade (quatro
anos) demonstrou respeito e compreensão concordando em
diversas momentos, que adiássemos os passeios de bicicleta
para os períodos posteriores aos meus estudos.
NOTAS
(1) - Cano, Wilson - Raízes
da Concentração Industrial em São Paulo.
Hucitec, 3ª edição, São Paulo, 1990.
p.30.
(2) - Anuário Estatístico da RFFSA - Rio de Janeiro,
1962 e Revista ferroviária, novembro 91.
(3) - I Relatório da FEPASA (1972)
(4) - Anuário Estatístico da FEPASA, 1976
(5) - FEPASA, 20 ANOS - Revista Comemorativa do 20º aniversário
da FEPASA - Três Editorial Ltda, São Paulo, 1991.
(6) - Ianni, Octávio - Estado e Democracia - Brasiliense,
2ª edição, 1989, p.24 e seguintes.
BIBLIOGRAFIA
01 - Anuário Estatístico
da RFFSA. Rio de Janeiro, Rj.
02 - Anuário Estatístico da FEPASA
03 - Azevedo, Fernando de - Um trem corre para o Oeste. (Estudo
sobre Noroeste e seu papel no sistema de viação
Nacional). São Paulo, Martins). 1950.
04 - Cano, Wilson - Raízes da Concentração
Industrial em São Paulo. Hucitec, São Paulo, 1990.
05 - Costa, Emília Viotti da - Da Monarquia a República.
Momentos decisivos. brasiliense, São Paulo, 1955.
06 - Centenário das Ferrovias Brasileiras - Diversos autores.
Serviço
Gráfico do IBGE. Rio de Janeiro, 1954.
07 - Estradas de Ferro do Brasil - Suplemento da Revista Ferroviária,
1945.
08 - Exposição comemorativa do 14º aniversário
da FEPASA. - Roteiro de Visitação.
09 - Furtado, Celso - Formação Econômica do
Brasil - Companhia Editora Nacional, 23ª edição,
São Paulo, 1989.
10 - FEPASA 20 ANOS - Revista Comemorativa do 20º aniversário
da FEPASA. Três Editorial Ltda. São Paulo, 1991.
11 - Guia Geral das Estradas de Ferro e Empresas de Transportes
com Elas Articuladas - Contadoria Geral de Transportes. Rio de
Janeiro, 1960
12 - Graham, Richard - Grã-Bretanha e o início da
Modenização do Brasil. 1850/1914. brasiliense, São
Paulo, 1973.
13 - Ianni, Octávio - Estado e Democracia - brasiliense,
2ª edição, São Paulo, 1989
14 - Jacob, Chafic - Ferrovia, o caminho certo - Imprensa Oficial
do Estado. São Paulo, 1982.
15 - Milliet, Sérgio - O roteiro do café e outros
ensaios - Hucitec, 4ª edição, São Paulo,
1982.
16 - Matos, Odilon Nogueira de - Café e ferrovias (A evolução
ferroviária de São Paulo e o desenvolvimento da
cultura cafeeira). Pontes Editores, Campinas, 1990.
17 - Pinto, Adolpho Augusto - História da Viação
Pública de São Paulo. Typografia e papelaria Vanorden
& Cia, São Paulo, 1903.
18 - Relatório da FEPASA, 1972
19 - Revista Ferroviária - Publicação Mensal
da Empresa Jornalística dos Transportes Ltda. Rio de Janeiro,
Rj
20 - Saes, Flávio Azevedo Marques de - As ferrovias de
São Paulo 1870/1940. Hucitec, São Paulo, 1981.
21 - Salum Jr, Brasílio - Capitalismo e Cafeicultura. Oeste
Paulista: 1888/1930 Livraria Duas Cidades, São Paulo, 1982.
22 - Silva, Ayres Reis - Estatísticas, dados diversos.
Cópia radiotelegramada ao ministro dos transportes para
figurarem em volume histórico-biográfico a ser editado
na I Semana Nacional dos Transportes entre 25 e 31 de julho de
1969 - 18/03/1969.
23 - Silva, Sérgio - Expansão Cafeeira e orígens
da indústria no Brasil. - Alfa Omega, 7ª edição,
São Paulo, 1986.