HISTÓRICO DO PLANEJAMENTO NO BRASIL

A década de 30 marcou a transição entre dois modelos de Estado no Brasil.
Antes de 1930, o Brasil se caracterizava por uma estrutura econômica baseada na agricultura, sendo que o poder político se concentrava nas oligarquias rurais, notadamente de São Paulo e Minas Gerais. Uma série de acontecimentos (principalmente a quebra dos produtores de café devido ao crash da bolsa de Nova Iorque, que reduziu drasticamente o mercado consumidor do café brasileiro), que culminaram com a revolução de 1930 e a subida de Getúlio Vargas ao poder, marcaram o fim do antigo modelo e o início de um novo, com participação mais ativa do Estado na economia, que pode ser denominado como nacional-desenvolvimentista.

A partir daí, o Estado brasileiro foi levado a desempenhar funções cada vez mais complexas no conjunto da economia. Essa participação se deu tanto de forma direta quanto de forma indireta, desde a formulação de regras de desenvolvimento até a criação e manutenção de empresas estatais.

Esse era o cenário nacional quando foram efetivadas as primeiras tentativas de planejamento no Brasil, decorrência natural da nova concepção do Estado como fomentador do desenvolvimento nacional. Deve se assinalar também que a experiência do planejamento estava em voga também em outras nações, quer desenvolvidas, em desenvolvimento ou socialistas .

Nas linhas seguintes, serão apresentados as experiências brasileiras de planejamento em nível nacional, em uma retrospectiva histórica até os dias de hoje.

PLANO ESPECIAL (Plano Especial de Obras Públicas e Aparelhamento da Defesa Nacional)
PERÍODO PREVISTO: 1939 - 1944

Trata-se do marco inicial do planejamento no Brasil; foi a primeira tentativa de alocação de recursos visando o atingimento de fins específicos, muito embora não possa ser considerada uma experiência de planejamento propriamente dita, haja vista ter muitas falhas em sua concepção.

Tinha como objetivos principais a criação de industrias básicas, execução de obras públicas consideradas indispensáveis e o aparelhamento da defesa nacional.

Conforme já foi salientado não chegou a constituir um plano propriamente dito, mas antes uma listagem de obras a se fazer. Ressalta-se também a preocupação com a soberania e a defesa nacional, o que se explica pelo desenrolar à época da Segunda Guerra Mundial.

O PLANO ESPECIAL é resultado direto da nova concepção de Estado que se criara no Brasil na década de 30, ou seja, o Estado como propulsor da economia e do desenvolvimento. Porém, a preocupação excessivamente econômica desse plano resultou em um êxito apenas relativo, haja vista que vários aspectos dos problemas nacionais não foram abordados.

De qualquer forma, o PLANO ESPECIAL, teve extrema importância, não só pelo marco inicial do planejamento no Brasil, mas também por alguns êxitos alcançados no desenvolvimento da economia (a criação da Companhia Siderúrgica Nacional fazia parte do Plano, por exemplo).

PLANO DE OBRAS E EQUIPAMENTOS
PERÍODO PREVISTO : 1944 a 1948

A execução desse plano foi precedida por duas missões técnicas norte-americanas encarregadas do diagnóstico dos problemas brasileiros, bem como a indicação das vias para a superação destes problemas. A Missão Taub (1942) e a Missão Cooke (1943) tiveram profunda influência na formação dos técnicos brasileiros, no tocante ao planejamento.

O PLANO DE OBRAS E EQUIPAMENTOS foi idealizado sob a luz do referencial técnico absorvido das missões norte-americanas. No aspecto metodológico, podem ser observados notáveis avanços em relação ao plano anterior. Tinha como objetivos precípuos apoiar obras públicas e indústrias básicas.

Esse plano teve vida curta; embora tenha sido efetivamente aplicado nos dois primeiros anos, em 1946, devido a problemas econômicos seu orçamento (diferenciado até então) foi incorporado ao Orçamento Geral da república.

PLANO SALTE
PERÍODO PREVISTO : 1950 a 1954

Implantado no governo Dutra sob influência de técnicos do DASP, que convenceram o então presidente da república das vantagens do mesmo, uma vez que ele não era simpático à idéia.

Foi a primeira experiência de planejamento no Brasil implementada sob um regime democrático. A discussão no Congresso Nacional sobre o PLANO SALTE Elegia quatro setores como prioritários para os investimentos governamentais: saúde, alimentação, transporte e energia (daí a sigla SALTE, formada pelas iniciais destas palavras).

Pela primeira vez nota-se a preocupação com a coordenação das ações por parte das diferentes esferas de governo:

O Poder Executivo promoverá entendimentos e firmará acordos com os governos estaduais e municipais, as autarquias, as sociedades de economia mista e entidades privadas, no sentido de coordenar as atividades relacionadas com os programas de trabalho deste Plano.

O PLANO SALTE também redundou em fracasso. Podemos apontar como causas do insucesso do plano: defasagem entre os recursos previstos e os aplicados, falta de controle e excessiva centralização de poderes da presidência. Esvaziado a partir de 1953, se manteve de forma precária até 1954.

PROGRAMA DE METAS

Em fevereiro de 1956 foi criado o Conselho de Desenvolvimento, com as seguintes atribuições:
1. estudar as medidas necessárias à coordenação da política econômica do País, particularmente no tocante ao desenvolvimento econômico;
2. elaborar planos e programas que visem aumentar a eficiência das atividades governamentais, bem como fomentar a iniciativa privada;
3. Analisar relatórios e estatísticas relativos à evolução dos diferentes setores da economia do País, com o propósito de integrá-los na formação da produção nacional;
4. Estudar e preparar anteprojetos de leis, decretos ou atos administrativos julgados necessários à consecução dos objetivos supramencionados;
5. Acompanhar e assistir a implementação, pelos Ministérios e Bancos Oficiais competentes, de medidas e providências concretas cuja adoção houvesse recomendado.

Durante o governo Juscelino Kubistchek foi instituído, sob os auspícios do Conselho de Desenvolvimento, o PROGRAMA DE METAS, que estabelecia 30 metas em quatro grandes setores: energia, transporte, agricultura e alimentação e indústrias de base.

O PROGRAMA DE METAS inaugura no Brasil a utilização do planejamento indicativo (embora em pequena escala), ou seja, a distinção entre onde o governo vai atuar como agente econômico e onde deve haver apenas a indicação para o setor privado.

Conseguiu êxito no plano de industrialização da economia e na superação de pontos de estrangulamento que impediam o desenvolvimento nacional, porém teve como conseqüências desequilíbrios na balança de pagamento e aumento das taxas de inflação.

PLANO TRIENAL

Tentativa de planejamento instituída em meio à agitação política que marcou o breve governo de João Goulart.
Data dessa época a criação do Ministério Ordinário do Planejamento (1962), sob o comando do economista Celso Furtado.
O PLANO TRIENAL procurou, pela primeira vez, soluções para os problemas estruturais do país, abordando de forma integrada a estrutura econômica e social do Brasil. Conferiu importância fundamental ao planejamento no processo de desenvolvimento econômico; caberia a ele antecipar as principais modificações estruturais desenvolvidas e indicar medidas a serem tomadas.

Tinha como objetivos a manutenção de elevada taxa de crescimento do produto, a redução progressiva da inflação, a redução do custo social do desenvolvimento, a melhor distribuição de seus frutos e a redução das desigualdades regionais de níveis de vida.

O PLANO TRIENAL estabelecia uma reforma de base de difícil implementação, pois estabelecia controles que não contavam com a simpatia popular, o que o levou a seu fracasso.

Não obstante tenha sido a primeira experiência de planejamento que visava a objetivos não meramente econômicos, mas também sociais, o PLANO TRIENAL teve duração de apenas 5 meses. Após seu malogro foi extinto o Ministério do Planejamento.

PAEG - PROGRAMA DE AÇÃO ECONÔMICA DO GOVERNO
PERÍODO 1964 a 1966

Instituído pelo governo Castelo Branco, já sob a ditadura militar que derrubou o antigo presidente João Goulart, o PAEG enfatiza a viabilidade do modelo de planejamento dentro de uma economia de mercado. Tratava-se de uma tentativa clara de desvincular a imagem do planejamento das economias socialistas de então, e um modelo totalmente diverso daquele apregoado pelo PLANO TRIENAL.

Seus objetivos primordiais eram: acelerar o ritmo do desenvolvimento econômico, conter progressivamente o processo inflacionário, atenuar os desníveis econômicos setoriais e regionais e assegurar oportunidades de emprego, além de corrigir a tendência a déficits descontrolados do balanço de pagamentos.

Durante seu período de implementação, foi reativado o órgão do poder executivo encarregado do planejamento, sob o nome de Ministério do Planejamento e Coordenação Econômica.

O PAEG obteve relativo sucesso, muito embora não tenha atingido todos os objetivos inicialmente previstos, houve uma significativa melhora na situação econômica do país.

PLANO DECENAL
PERÍODO: 1967 a 1976

Foi a primeira tentativa de planejamento a longo prazo no Brasil, sendo que seu período previsto abrangia 10 anos.

Formulado sob a influência do relativo sucesso do PAEG, buscou naquele plano suas inspirações para os objetivos a serem alcançados no período.

O PLANO DECENAL, todavia, não saiu do papel. Não obstante tenham sido feitos os estudos iniciais visando sua implementação, o plano não chegou a ser executado.

PROGRAMA ESTRATÉGICO DO DESENVOLVIMENTO
PERÍODO:1968 a 1970

Idealizado durante o governo Costa e Silva, tinha como objetivos a aceleração do desenvolvimento econômico simultaneamente com a contenção da inflação, o desenvolvimento a serviço do progresso social e a expansão das oportunidades de emprego e de mão de obra.

Nota-se que os objetivos desse plano não diferem muito dos planos anteriores idealizados sob o regime militar; porém houve uma preocupação para que não houvesse correlação de imagens entre esse plano e o fracassado PLANO DECENAL, pois havia a necessidade de correção de certas distorções que se faziam sentir.

No aspecto econômico, o PROGRAMA ESTRATÉGICO DO DESENVOLVIMENTO foi bem sucedido, haja vista as altas taxas de crescimento do produto interno bruto alcançadas no período. O mesmo porém, não pode se dizer no campo social.

METAS E BASES PARA AÇÃO DO GOVERNO
PERÍODO: 1970 a 1972

Não chegou a constituir um plano em si, na verdade tratou-se mais de um documento de intenções do governo instituído pelo presidente Médici, dando continuidade aos objetivos traçados pelo PAEG, buscando inová-lo e corrigi-lo, sem descontinuá-lo.

Fixa como grande objetivo o ingresso do Brasil no mundo desenvolvido até o final do século, por meio de políticas que levassem ao crescimento expressivo do PIB, processo de desenvolvimento auto-sustentado integrado e crescimento dos setores de infra estrutura.

PRIMEIRO PLANO NACIONAL DO DESENVOLVIENTO ECONÔMICO PERÍODO: 1972 a 1974

Segue o plano anterior de "metas e bases", aperfeiçoando-o ao dividir o planejamento em duas grandes partes: modelo brasileiro de estratégia de desenvolvimento e execução da estratégia, ou seja a implementação do planejamento.

Esse fato manifesta preocupação com a consecução prática dos objetivos do plano, face a proliferação de tentativas não realizadas e do irrealismo e ausência de objetividade de determinado programas.

Estabelecia três grandes objetivos: colocar o Brasil, em uma geração, na categoria das nações desenvolvidas; duplicar, até 1980, a renda per capita do país; elevar a economia às dimensões resultantes de um crescimento anual do PIB entre 8% e 10%.
Durante sua implementação, ocorreu a expansão da fronteira econômica, a consolidação do desenvolvimento no centro sul e as primeiras tentativas de industrialização do Nordeste. Nota-se a preocupação com a redução das disparidades regionais e a preocupação com a integração nacional.

Ocorreu uma relativa modernização da economia brasileira, e a tentativa de redução da dependência externa. O 1º PND correspondeu a um período de crescimento econômico extraordinário no Brasil, aliado a baixas taxas de inflação.

SEGUNDO PLANO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Instituído na época da primeira crise do petróleo, o que o influenciou diretamente.

O sucesso advindo do 1º PND gerou um otimismo exagerado; acreditava-se que o Brasil conseguiria superar a crise econômica internacional por suas características naturais o que gerou uma expectativa superestimada de crescimento econômico, refletida no 2º PND.

Seus objetivos eram:
1. manter o crescimento acelerado dos anos anteriores, com taxas de aumento de oportunidades de emprego de mão-de-obra superiores às da década passada;
2. reafirmar a política de conexão da inflação pelo método gradualista;
3. manter em relativo equilíbrio o balanço de pagamentos;
4. realizar políticas de melhoria de distribuição de renda, pessoal e regional, simultaneamente com o crescimento econômico;
5. preservar a estabilidade social e política; e
6. realizar o desenvolvimento sem deterioração de qualidade de vida, sem devastação de recursos naturais.
Os problemas econômicos do período geraram sérios obstáculos para sua implementação; durante seu período de vigência, foi alvo de duras críticas e teve sua credibilidade comprometida ao longo de sua execução. Na verdade, o 2º PND não foi uma resposta à altura da crise econômica mundial que então se afigurava.

TERCEIRO PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONOMICO

Idealizado em plena crise econômica mundial e nacional, que teve reflexos também no aspecto político, com o desgaste do regime militar, o 3º PND marca o fim do processo de planejamento como efetivo instrumento da política econômico financeira do país.

Estabelecia como objetivos principais:
1. acelerar o crescimento da renda e do emprego;
2. melhoria da distribuição de renda com redução dos níveis de pobreza absoluta e elevação dos padrões de bem estar das classes de menor poder aquisitivo;
3. redução das disparidades regionais;
4. contenção da inflação;
5. equilíbrio da balanço de pagamento e controle do endividamento externo; 6. desenvolvimento do setor energético; e
7. aperfeiçoamento da instituições políticas.

O 3º PND não conseguiu atingir a nenhum de seus objetivos. Se constituiu em um malogro retumbante face à crescente crise econômica no país, notadamente a alta das taxas de inflação e o desequilíbrio na balança de pagamentos.

Influenciaram em seu fracasso a descrença derivada do malogro do plano anterior, bem como as dificuldades econômicas internacionais. Além disso, foi posta em cheque a própria efetividade e importância do planejamento como ferramenta de decisão governamental.

A DÉCADA DE 1980

Os anos 80 foram marcados por profundas crises econômica, política e social, que levaram à sua caracterização como a "década perdida". Durante o período, os efeitos da crise do petróleo se fizeram sentir, notadamente com a elevação das taxas de juros internacionais em 1982 e a moratória mexicana no mesmo ano.

No campo político e social, a ditadura militar demonstrava claros sinais de esgotamento. Sem conseguir manter as altas taxas de crescimento da década anterior e lutando contra a inflação e o desemprego crescentes, o governo tornava-se cada vez mais impopular. Manifestações populares a favor da abertura política tornavam-se cada vez mais freqüentes.

Neste cenário de incerteza política e econômica, o planejamento era visto como uma figura de retórica. Contribuíam ainda para essa visão negativa do planejamento na época o insucesso dos 2º e 3º Planos Nacionais de Desenvolvimento, durante a década de 70.

Ademais, o restante do mundo experimentava o início da onda neo-liberal, capitaneada pelos governos Reagan, nos Estados Unidos, e Tatcher, na Inglaterra. As políticas neo-liberais apregoavam a redução do intervencionismo estatal na economia, na crença em que o mercado estaria suficientemente amadurecido para resolver seus próprios problemas; essa concepção de Estado também influenciou negativamente o planejamento governamental.

Prevaleceram no Brasil durante o período planos heterodoxos de orientação voltada à política econômica (monetária e fiscal): Plano Cruzado e Cruzado 2 (1986), Plano Bresser e Verão (1987) e o Plano "feijão com arroz" do então Ministro da Fazenda Marcílio Marques Moreira. Todos estes planos tiveram eficácia pequena ou nula na resolução dos problemas econômicos brasileiros.

Podemos afirmar, portanto, que a década de 80 é marcada pela crise deliberada do planejamento governamental, pelo desencanto com o processo, dúvidas quanto às suas qualidades e ceticismo quanto a seu potencial. Todos esses fatores, aliados ainda às altas taxas de inflação observadas no período, levaram ao gradativo desuso do planejamento governamental.


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