INTRODUÇÃO

O que é planejamento

Neste tópico serão apresentados conceitos e definições para o planejamento, bem como suas características. Deve ser ressalvado, entretanto, que nesse tópico inicial não será feita a distinção entre planejamento em uma empresa privada e o planejamento governamental. Apresentarei o planejamento tão somente como uma função administrativa, para somente no tópico seguinte explorar as peculiaridades do processo no âmbito governamental.

As organizações (em seu sentido lato) não trabalham com base na improvisação. Suas ações são planejadas antecipadamente. O planejamento é a função administrativa que determina antecipadamente quais são os objetivos que devem ser atingidos e como se deve fazer para alcançá-los. Trata-se, pois, de um modelo teórico para ação futura.

Segundo MATUS, planejamento pode ser definido como "cálculo situacional sistemático que relaciona o presente com o futuro e o conhecimento com a ação."

Quatro etapas principais compõem o planejamento:

1. estabelecimento dos objetivos a alcançar;
2. tomada de decisões a respeito das ações futuras;
3. elaboração de planos: e
4. ação.

O planejamento, portanto, começa com a determinação dos objetivos e posteriormente detalha os planos necessários para atingi-los da melhor forma possível. Planejar é definir os objetivos e escolher antecipadamente o melhor curso de ação para alcançá-los. O planejamento define onde se pretende chegar, o que deve ser feito, quando, como e em que seqüência.

De acordo com seu grau de amplitude, o planejamento pode ser categorizado em três níveis distintos: o planejamento estratégico, o tático e o operacional.

O planejamento estratégico é o planejamento mais amplo e abrangente da organização. Projetado a longo prazo, tem seus efeitos e conseqüências estendidos a vários anos pela frente, além de envolver a organização como um todo, abrangendo todos os seus recursos e áreas de atividade, e preocupar-se em atingir os objetivos a nível mais abrangente. É definido pela cúpula da organização e corresponde ao plano maior ao qual todos os demais estão subordinados.

O planejamento tático, por seu turno, é projetado a médio prazo, geralmente para o exercício anual. Envolve segmentos da organização, abrangendo seus recursos específicos, e é definido por cada segmento da organização.

O planejamento operacional é o planejamento feito para cada tarefa ou atividade. Geralmente é projetado para o curto prazo, e envolve cada tarefa ou atividade isoladamente, preocupando-se com o alcance de metas específicas.

Alguns detalhes devem ser observados no processo de planejamento. Inicialmente, é fundamental para o sucesso do plano que o objetivo planejado seja eficaz, coerente e possível, sob o risco de os planos não saírem nem ao menos do papel (aliás, uma das causas do insucesso de muitos dos planos governamentais adotados no Brasil, como se verá adiante, foi justamente a falta de rigor técnico na definição dos objetivos).

Objetivos possíveis, coerentes e eficazes não bastam. O planejamento deve definir os meios suficientes, necessários, potentes e eficazes, além de coerentes entre si, para a consecução dos objetivos propostos. É justamente nesse ponto que reside o cerne do sucesso ou não da implementação do planejamento proposto.

Um outro aspecto que merece destaque é que o planejamento deve considerar os terceiros envolvidos no processo. Ora, a implementação dos planos propostos vai depender diretamente das pessoas envolvidas em sua execução, em todos os níveis. O planejamento deve prever , na medida do possível, os efeitos dessa inter-relação. Esse é um dos pontos fracos do planejamento na área governamental, pois quanto maior o número de atores envolvidos no processo, mais difícil se torna a previsão das ações reativas ao plano.

Em suma, para obter êxito o planejamento deve incluir tanto o "deve ser", quanto o "pode ser" e o "fazer".

Abaixo, como síntese dessa definição do planejamento, são apresentadas algumas das características do planejamento apontadas por CHIAVENATO :
1. O planejamento é um processo permanente e contínuo;
2. O planejamento é sempre voltado para o futuro: o planejamento está sempre ligado intimamente à previsão, embora não se confunda com ela;
3. O planejamento visa selecionar, entre várias alternativas, um curso de ação;
4. O planejamento é sistêmico: deve considerar tanto o sistema como os subsistemas que o compõem;
5. O planejamento é interativo;
6. O planejamento é uma técnica de alocação de recursos humanos e não-humanos;
7. O planejamento é uma função administrativa que interage com as demais; e
8. O planejamento é uma técnica de coordenação e de integração.

Planejamento Governamental

Até o momento, o planejamento vem sendo tratado no presente trabalho de forma indistinta. Faz-se necessário agora, porém, apontar quais são as peculiaridades do processo de planejamento governamental e quais são as diferenças que mantém em relação ao processo em nível empresarial.

O objetivo primordial de uma empresa é gerar lucro. O objetivo estatal é promover o bem estar social. Essa diferença fundamental entre os diferentes entes tem repercussões diretas no processo de planejamento.

O planejamento empresarial envolve planejamento mercadológico, financeiro, de produção, de recursos humanos e organizacional, por exemplo.

LOPES fornece uma definição própria para o planejamento no setor público como sendo um "método coerente e compreensivo de formação e implementação de diretrizes, através de um controle central de vastas redes de órgãos e instituições interdependentes, viabilizados por conhecimentos científicos e metodológicos" .

Podemos nesse conceitos identificar peculiaridades do planejamento governamental. Note-se que LOPES menciona "diretrizes", além de "controle central de vastas redes de órgãos e instituições interdependentes". Nesse ponto, ele chama a atenção para a necessidade de haver órgãos específicos de planejamento, coordenando a criação e a implementação de políticas públicas.

Segundo MATUS , a ação planejadora do Estado vai além da simples produção econômica, alcançando também o que ele define como "Produção Social", que tem um sentido mais amplo que produção econômica, envolvendo diversos aspectos da vida social da população.

Justamente em decorrência dessa "produção social", a implementação do planejamento público enfrenta dificuldades decorrentes da ação criativa de resposta dos atores sociais envolvidos, aumentando o grau de imprevisibilidade do modelo de planejamento adotado. Modelos matemáticos podem ser úteis na simulação de diferentes cenários, mas nem sempre são eficazes, dada a complexidade decorrente das inúmeras reações possíveis, o que inviabiliza a construção de um modelo perfeito, que possa prever todas as variáveis envolvidas.

Tal característica, embora também possa ser observada em uma empresa privada, o será em grau infinitamente inferior, quando em comparação ao âmbito estatal. Por esse motivo, modelos de planejamento baseados em modernas tecnologias de informática e novas teorias obtêm ótimos resultados em uma empresa, porém pouca valia no aspecto governamental. Acreditar que técnicas de planejamento adotadas por empresas possam ser aproveitadas pelo governo sem ao menos passarem por uma profunda adaptação é, no mínimo, ingenuidade.

Planejamento em uma empresa privada admite e resolve os problemas de implementação, e pode dar-se ao luxo de restringir a varredura ambiental a busca de alternativas e aferição de conseqüências a um mínimo manejável e, principalmente, pode estabelecer uma clara hierarquização de objetivos dentro de critérios consistentes.

Podemos identificar, ainda segundo LOPES e a partir da análise dos modelos de adotados por diferentes países, três espécies principais de planejamento governamental, quais sejam: 1. o modelo socialista soviético, onde o planejamento permeia todo o sistema econômico, utilizando-se de minuciosa explicitação de todo o processo produtivo (trata-se de um modelo relativamente em desuso, após o colapso dos regimes socialistas, à exceção da China e Cuba, que assim mesmo fazem concessões à economia de mercado).
2. o modelo adotado pelos países de terceiro mundo, que adota o planejamento como processo ideal nos esforços de industrialização rápida, com o objetivo de aumentar a renda per capita. Neste rol se incluem os planos brasileiros até a década de 70.
3. o modelo utilizado nos países de economia de mercado, que utiliza o planejamento indicativo onde, ao invés da substituição do mercado e mecanismo de formação de preços, busca-se garantir maior eficiência do setor econômico através da redução do nível de incerteza.

O planejamento no âmbito governamental pode ainda ser classificado em:
è nacional: define metas e diretrizes para o país;
è regional: limitado a determinadas regiões do país que tenham certas peculiaridades econômicas e sociais;
è urbano: circunscrito ao ambiente da cidade e preocupado com aspectos ligados ao crescimento da mesma; e
è setorial: ligados a determinados setores, tais como educação, transportes, energia, etc.

No caso brasileiro, por se tratar de uma federação, observa-se ainda o planejamento de âmbito estadual, que inclusive pode ser dividido por micro-regiões dentro do estado.

Cabe nesse ponto ressaltar que o planejamento governamental deve prever três aspectos políticos que influenciam diretamente a implementação dos planos: o poder, a cooperação e a coordenação. A estrutura do poder, quando não prevista na formulação, simplesmente inviabiliza a execução do planejamento.

Deve ser salientado ainda que os problemas sociais, e também os econômicos, em menor grau, não tem uma única solução correta e possível. O planejamento deve escolher uma dentre as alternativas possíveis. E é justamente nesse ponto que estão envolvidos os aspectos políticos do planejamento. A decisão governamental de como gastar envolve interesses de toda a sociedade, e nesse ponto, os critérios que prevalecem nem sempre são os técnicos .

Uma última observação a ser feita sobre o planejamento governamental é no tocante aos críticos que apontam o seu insucesso e freqüente desuso, em escala mundial. Ora, não planejar é sinônimo de improvisação e despreparo. Muito embora seja verdadeiro que a experiência brasileira na década de 80 e o colapso das economias planificadas no início dos anos 90 indiquem o possível insucesso do planejamento governamental, o planejamento continua a ser um instrumento que pode ser útil ao governo e à nação. Constitui-se na verdade na indicação dos caminhos do desenvolvimento econômico, bem como na transparência da aplicação dos recursos públicos. O malogro brasileiro na década de 80 esteve muito mais ligado às oscilações da economia de então do que a falhas no planejamento em si. Voltarei neste ponto mais adiante, quando for tratada a questão da crise do planejamento e suas perspectivas futuras.


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