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INTRODUÇÃO

Esta é uma das mais importantes escrituras de Yoga, na verdade uma das principais obras da humanidade. Muitos a classificam como um tipo de bíblia da religião hindu, no que discordo plenamente. Há uma tendência a se intitular de religiões os muitos modos de vida, esta é uma mania, ou um ponto de vista pobre e vicioso. Se temos de admitir que o legado cultural da civilização milenar indiana seja uma religião então temos de aceitar também que Americanismo seja uma religião ou melhor, que Bahianismo, se é que isto existe, também seja outra religião, porque afinal, no Estado da Bahia, no Brasil, existe o misticismo e tem até uma fama de “Bahia de Todos os Santos”. O Bhagavad-Gita, não é uma obra religiosa, é do patrimônio universal da humanidade, lida apenas com os aspectos universais do ser humano. Se existem religiões que adotaram-no como parte de seu acervo sagrado, isto é algo totalmente à parte.

Deixo bem claro, que o Bhagavad-Gita que aqui está traduzido diretamente do sânscrito para o português, o que é raro, está sendo apresentado como uma escritura yogui e não como uma obra religiosa. É parte de minha tradição espiritual, minha sucessão discipular oriunda de Dattatreya Avadhuta e Shri Shankaracharya, tradição esta que foi responsável por manter e evoluir os conhecimentos e textos yoguis desde milhares de anos antes do Senhor Cristo. Nesta tradição yogui o Bhagavad-Gita, o Brahma Sutra e os cento e oito Upanishads, bem como os estudos clássicos complementares destes, que formam riquíssima literatura, tais como, Avadhuta-Gita de autoria de Dattatreya, Yoga Vasishita, Astravaka-Gita, Viveka Shudamani de Shamkaracharya; e outros muitos textos formam o principal compêndio de tal tradição.

Esta obra em mãos também é denominada GITOPANISHAD, é tida como sendo um Upanishad. Upanishad em sânscrito quer dizer “sentar-se junto e aprender”, são escrituras que registram a experiência dos grandes Gurus yoguis da velha Índia e se caracterizam por serem em forma de diálogo entre Guru-Shirshia, ou seja, Guru e discípulo. Não são apenas textos yoguis, mas também, obras universais de filosofia, metafísica, estória e psicologia aplicada de inigualável quilate e inestimável valor prático. Bhagavad-Gita, significa ao pé da letra, Canção Divina; como obra literária deixa uma marca de soberbo requinte artístico e magia transcendental fortíssima, ao ler, ouvir ou estudar tal obra, sem dúvida nossas vidas são automaticamente afetadas, obviamente para melhor; o simples fato de tê-lo em mãos, sob o travesseiro, nas edificações como lar, trabalho, escola, etc. já o torna um senhor objeto de proteção e cuidados para com a saúde; composto em versos, foi cantado ao ser criado e recitado, possui em si uma incrível e soberba sonoridade que afeta positivamente os centros do sistema nervoso e ativa áreas do cérebro, além de transmitir sabedoria e encantos diversos. Que senhora obra! Tal obra transcende a criatividade artística dos mortais e ressalta na natureza de sua magnitude,o toque do Mestre Supremo de toda criação. É uma obra, assim como a criação, cuja autoria pertence a não outro senão o Ser Sublime e Criador de todos os artistas, do inventor da própria criatividade. Gitopanishad é também conhecido por SHRUTI. Os shrutis são obras que foram transmitidas oralmente de Guru para discípulo, também quer dizer canção. Embora Bhagavad-Gita seja mais comumente traduzido por Canção Divina, prefiro usar um termo que transmite melhor seu significado mais profundo: “Canção da Alma”.

Ao estudar O Gitopanishad, estude-o também de outros tradutores, se possível leia-o em sânscrito, você verá que é muito melhor. Ora, sânscrito não é tão difícil, se passar alguns anos na Índia, principalmente no norte, aprenderá o idioma mais falado que é o Hindi (pronuncia Rindi), este é mais da metade sânscrito e seu alfabeto só possui umas pouquíssimas letras de diferença. No mais, afortunadamente os Upanishads em geral estão em uma forma muito simples e falam muito com poucas palavras. O sânscrito utilizado é o falado no período védico, o sânscrito védico, não é o chamado sânscrito clássico. Mais importante do que conhecer o sânscrito védico é estar familiarizado aos termos yoguis e suas conotações, esta é a parte mais trabalhosa e pode levar anos de dedicação. As traduções do mencionado idioma para qualquer outra língua, principalmente as latinas, é um fato de verdadeiro pioneirismo.

O Gita, nome que lhe é mais comum aos íntimos, é parte do maior e um dos mais populares épicos indianos, composto de duzentos mil versos em média, intitulado o Maha-Bharat. Esta escritura está composta de DASHA PARVA, ou seja de Dez Partes. A parte que nos interessa no caso é esta aqui BHISHMA PARVA, a Sexta Parte, no seu terceiro capítulo encontramos este sob o título de BHAGAVAD-GITA, que por sua vez possui dezoito capítulos em si, não sei se deveríamos chamar de sub-capítulos.

É muito difícil encontrar alguma obra traduzida do Maha-Bharat que tenha em si o Guita completo, aliás, de que se tenha notícia, esta obra completa, nos seus dezoito livros, ou seja o Maha-Bharat completo foi traduzido em sua totalidade nos anos de 1834-1839 em Calcutá, a partir daí foram apresentadas muitas passagens desta obra primeva aqui e ali, repetidas vezes. Mas foi à partir dos anos sessenta no século vinte, que outras traduções apareceram,tendo por destaque a que foi realizada por KISARI MOHAN, publicada na Índia em 1975 por Munshiram Mancharlal. Outra tradução importante foi a efetuada recentemente pela Universidade de Chicago a cargo de J. Van Butenen.

Até os dias atuais,não existe nenhuma obra completa em outro idioma ocidental do Maha-Bharat, que não seja o inglês. Mérito de destaque vai aos alemães que se prepararam para tal empreita. Foi em 1808 que Frederic Schegel publicou um trabalho sobre o idioma sanskrit, com extratos do Ramayana e do Maha-Bharat, bem como do código de Manu. Entretanto nosso herói alemão Frederic Shlengel, morreu antes de concluir a sua tradução completa do Maha-Bharat. Está aqui lançado o desafio para o nosso idioma. Destacamos porém resumos feitos por B. DUPRAT para o idioma francês e para o italiano feita por CARLO FORNICHI, publicada em 1933.

Em português, resumos do Maha-Bharat começaram a aparecer na década de cinqüenta e foram oriundos da primeira obra realizada em Calcutá, que teve ali a sua última edição em 1933. Importante e relevante resumo foi de JULIO PARDILLA para o espanhol, editado em Barcelona no ano de 1984, composto de dois livros ou Tomos, num total de mais de mil e duzentas páginas, assim mesmo, não encontramos o Gita completo ali.

O Gita que temos em mãos, foi um trabalho que fiz como uma relevante prática yogui e principalmente porque me foi solicitado por meu Guru Paramhamsa Satyananda, o término desta obra, que ocorreu a 25 de janeiro de 1996, coincidiu com a comemoração dos vinte anos desde a única visita de PARAMHAMSAJI ao Brasil e com meus vinte anos de sannyasa e magistério da ciência do Yoga, o qual realizei em cinco idiomas em muitas partes do mundo, incluindo a Índia. A tradução do sânscrito me levou treze anos de trabalho, treze anos de pleno contentamento e inexpressável experiência espiritual de quem conhece o amor e benção de Shri Krishna, o mais perfeito dos yoguis. Agradeço a Ele a graça concedida por aceitar meus serviços e de me ter dado a oportunidade de completar esta tradução com vida suficiente para tal e com amor e dedicação consagrados com exclusividade. Conhecedor dos segredos das maravilhas e riquezas dos mundos e da soberba vida em si, esta prática de Yoga me trouxe muito mais do que qualquer experiência ou aquisição me forneceria e com extasiante elevação embriagante, aquisições estas que o mundo com seu roda moinho de momentos não é capaz de roubar ou ter acesso. O Gita é algo assim,contagiante! É uma corrente cósmica de felicidade, quem o lê ou lida com ele se contagia para sempre.

Convém ainda ressaltar que a língua portuguesa consta entre as dez mais faladas no mundo e merece uma boa tradução, ou melhor, boas traduções do Gita.

O Gita é um guia prático para o dia a dia, uma prática de yoga útil é ler um “stansa” (versículo) por dia, sempre. Ou ainda estuda-lo mais e mais, progressivamente. Tomaremos o Gita, desta forma, como um ponto de referência que irá indicar nossa evolução, apontar nossos atuais limites e as verdadeiras conquistas, sendo um elemento de auto-conhecimento por excelência. Na dificuldade de se estar num convívio mais assíduo com os discípulos, tendo em vista a transmissão de conhecimentos e formação espiritual que se adquire principalmente com o convívio junto ao Guru e/ou associação junto a yoguis experientes, o Gita será sempre um santo remédio para tal impedimento.

Existem muitas práticas para se efetuar com o Gita, como por exemplo, seus mantras, Gita Dhyanan; ou meditação cantando-o em sânscrito, etc.; todas, técnicas yoguis de alto gabarito.Mas isto é um caso a ser resolvido entre Guru e discípulo, relação esta que é a essência do Bhagavad-Gita em si, se a analisarmos devidamente.

Sob o ponto de vista de Bhakti Yoga, quando ouvimos a narração de algum sábio, divindade ou grande yogui, Mahatma, como se diz; estamos recebendo as bênçãos deste e ao mesmo tempo mantendo a mente voltada para o Supremo Ser, isto jamais pode ser considerado perda de tempo, pois a evolução existencial e seu progresso são ativados em todos os níveis, além do fato de elevar a mente e o estado de espírito. Todo o Bhagavad-Gita está em torno de Shri Krishna, Arjuna e o autor desta obra; Ved-Vyasa.

Assim como Shri Krishna revela, no transcorrer do Gita, Sua natureza e verdadeira identidade Suprema, Arjuna e outros também são encarnações divinas, não são pessoas comuns. Se estudarmos yoga mais a fundo e observarmos os fluxos vitais do corpo humano, que são denominados Nadis, equivalentes aos meridianos de acupuntura, os veremos catalogados nas escrituras yoguis tradicionais, como sendo setenta e dois mil Nadis no ser humano que coordenam junto aos chakras a vitalidade a nível físico, mental, emocional, espiritual e metafísico. [A existência dos Nadis e Chakras já foi constatado cientificamente no Japão por Dr. Hiroshi Motoyama e seu livro com estes estudos denomina-se “A teoria dos Chakras” , afortunadamente foi publicado em português.] Iremos constatar então que os nomes de muitos personagens do Maha-Bharat são os mesmos de muitos Nadis. Por um lado Krishna é a Consciência, o Atma, ou espírito e Arjuna é a manifestação do líder dos Devas, seres divinos, ou seja INDRA, que é a vitalidade, o PRANA que flui nos Nadis e a dinâmica do Gita e do Maha-Bharat é a vida em si, em seu caminho para unir-se à  origem, o Ser Sublime. Nisto temos as práticas de Yoga, que objetivam o conhecimento da vida, sua maravilhosa magia e encantos, em elevação, encantada com Shri Krishna.

Por outro lado, estudos de arqueologia e estória, na Índia, revelam que tudo no Maha-Bharat realmente existiu, os lugares dos acontecimentos ainda estão ali, são de conhecimento popular. O evento do Gita ocorreu a aproximadamente cinco mil anos atrás e foi um marco no tempo ainda mais preciso do que o atual ponto de referência do nascimento do Senhor Cristo. Assim como existem, nos movimentos dos corpos celestes, da terra e de outros planetas a marcação do tempo, por exemplo, as quatro estações, verão, primavera, etc., da mesma forma há movimentos mais complexos na dinâmica dos astros que marcam períodos característicos para a terra e ciclos, que em sânscrito, termo técnico yogui universal, são as chamadas Yugas, abordaremos este item no ponto deste “adendo” entitulado Shri Krishna Avatar. Ocorre que Shri Krishna é um excelente JYOTISHA, ou seja, versado em Astrologia, Astronomia e ciências advinhatórias, estes três formam o que em Yoga se conhece por JYOTISHA, com este conhecimento, quando em pleno combate na grande guerra que houve em Kuru-Kshetra, próximo a Delhi na Índia, em uma noite, à meia noite, Shri Krishna anuncia o início de um ciclo cósmico, ou seja a entrada de Kali Yuga, a Idade de Ferro e isto foi a aproximadamente cinco mil anos atrás e irá durar no total, quatrocentos e trinta e dois mil anos. Cada um dos quatro ciclos tem características muito definidas na vida humana da Terra e nos mundos em geral.

Enquanto a aproximadamente quinhentos anos atrás o europeu não sabia se a terra era quadrada ou redonda e precisou navegar muito para descobrir que era circular, na antiga e avançada civilização indiana já se sabia a milênios que a terra era como ela é, não só isto, mas a sua distância em relação ao Sol, tinham conhecimentos de constelações, galáxias, etc. Nos Puranas, escrituras yoguis clássicas que formam enorme compêndio literário e já traduzidos para o inglês, vemos onde JYOTISHA é mencionado, cálculos matemáticos de ordem astronômica, que até hoje se desconhece no ocidente.

Não foi feito aqui um comentário do Gita, limitei-me a traduzi-lo e apresentá-lo, temos um trabalho de introdução. É um outro trabalho o seu comentário, para uma próxima oportunidade, quem sabe. É importante ressaltar que todas as escrituras tradicionais yoguis, são de rica e inteligente simbologia arquetipica e uma lição de humanidade sublime, fato que marca alicerces de civilização universal, símbolo este que designa mais a própria humanidade e sua natureza essencial. Quando ativamos esta simbologia, agimos com a mente mais profunda, ou seja o subconsciente; damos vida a circuitos cósmicos vitais e dinâmicos, intrínsecos da natureza, de forma imperceptível. Notamos porém; claramente, os resultados em trezentos e sessenta graus nas nossas vidas e pós-vidas. Quando os yoguis ainda são imaturos para entenderem e assimilarem algumas realidades, os mestres lhes ensinam de maneira simbólica e é uma tática didática de mestre, de alto nível e não acadêmica, extremamente proveitosa para o discípulo. Tal tática consta aqui, por isto dispensa-se qualquer comentário sobre a obra.

 

 

O AUTOR

Dentre os grandes Yoguis e Sábios da terra da sabedoria, a nossa velha e sagrada Índia, quem recebeu o mérito de autor do Maha-Bharat e consequentemente do Bhagavad-Gita (pronuncia-se Bhagavad-Gita), foi Bhagavan Ved-Vyasa, o primeiro a pensar em compilar os Vedas de forma sistemática. É também o autor dos livros Puranas e muitas outras obras ou Granthas. Todos são textos de volumes respeitosos e de importância ímpar no c0mpêndio escrito da ciência yogui. Fazem parte da mais requintada relíquia da sabedoria e filosofia universal, muitos são registros preciosos das conquistas e estória da humanidade. Ved-Vyasa, ao expressar o seu trabalho, não o fez voltado apenas a um ou alguns países. Sempre lidando com os mais elevados valores universais do ser humano, ensinado-os, difundindo-os, imprimiu sua própria imortalidade por meio de suas obras e demonstrou ser a nossa memória ancestral coletiva destes ideais e atributos que divinizam a natureza de nossa espécie. Ao nos lembrar de Vyasa Deva, como também é conhecido, agradecemos eternamente à longínqua Índia que lhe serviu como berço materno.

Na Lua cheia de Julho, comemoramos o dia de Ved-Vyasa e de todos os Gurus, é dia de GURU-PURNIMA, tal dia é repleto de posições favoráveis dos astros, os mestres ficam acessíveis e abençoam seus discípulos, devotos, alunos, seguidores e simpatizantes, há uma forma adequada para fazê-lo. É um dia importante para yoguis do mundo inteiro nos dias atuais. Os dias e meses que se seguem após GURU-PURNIMA e VYASA-PUJA, ou seja invocação de Ved-Vyasa ou do Guru yogui, são ideais para se dar início a novas práticas ou disciplinas, pois favorecem o seu sucesso. A mencionada Lua cheia, é o dia propício para chegar-se à presença física de um autêntico Guru e receber iniciação espiritual, tais como MANTRA-DIKSHA, ou iniciação em mantra.

Ved-Vyasa era filho de um grande sábio de nome PARASHARA, o Maha-Bharat narra também sobre a vida de ambos. Ved-Vyasa meditou por muitos anos em contato com a natureza no Himalaya, percebeu que em KALI-YUGA a mente humana sofreria grande degeneração e estando por ser anunciada esta “era negra”, teve o amoroso cuidado de colocar em escrita para a posteridade a sabedoria universal, pois os homens já não mais teriam a capacidade de memorizar, ou decorar simplesmente, épicos de duzentos mil versos e obras magnânimas como antes ocorria. Era sem dúvida, necessário que alguém escrevesse. Mas quem poderia escrever tanto e com precisão absoluta? Com sua habilidade yogui invocou Brahma e ao estar em Sua presença, Brahma lhe recomendou que propiciasse o Senhor Ganesha, filho do Senhor Shiva, que preside sobre a correta compreensão das escrituras, e Lhe solicitasse para ser o escriba do Maha-Bharat, e portanto do Bhagavad Gita também. O sábio Vyasa meditou em Shri Ganesha que lhe apareceu prontamente, Vyasa o recebeu com o devido respeito, dizendo-lhe.

 - Senhor Ganesha, irei ditar a estória do Maha-Bharat e Lhe rogo para que possa, em Sua graça, estar satisfeito em escrevê-la.

Houve um diálogo entre Shri Ganesha e Vyasa, após o qual, o Senhor Ganesha, que possui a cabeça de um elefante, extraiu um de seus marfins e com ele pôs-se a escrever. Se observarmos as imagens representativas do Senhor Ganesha, veremos que está sempre retratado como se tivesse somente um marfim em sua boca. Assim é evidente que sua boca diz com esta atitude, a estória aqui narrada e o fato da narração do Bhagavad-Gita para todos.

Tudo ocorreu muito antes dos tempos da memória informatizada e até mesmo da imprensa gráfica, quando a memória dos sábios era o único registro do que hoje são textos, ou SHASTRAS, como os chamamos. Vyasa primeiro ensinou este épico a seu filho, o sábio yogui Suka. Posteriormente o transmitiu a muitos outros discípulos. Não fosse assim, o texto haveria se perdido das futuras gerações.

É dito tradicionalmente, que o grande NARADA contou a estória do Maha-Bharat e do Gita nele contido, para os seres divinos, enquanto Suka os ensinou aos gandharvas, rakshashas e yakshas, ou seja a espíritos e outras entidades mais sutis. É bem conhecido o fato de que o sábio VAISAMPAYANA, um dos principais discípulos de Vyasa revelou o épico para a humanidade e seu benefício. JANAMEJAYA, filho do grande rei PARIKSHIT, conduziu um importante YAGUIA, ou seja, sacrifício junto ao fogo, no qual VAISAMPAYANA, a pedido do rei narrou a estória. Em seguida, da mesma maneira como foi contada por VAISAMPAYANA, SUTA recitou-a na floresta de NAIMISA para uma assembléia de sábios que se achavam sob a liderança do Rishi SAUNAKA.

SUTA, dirigindo-se a esta assembléia disse:

 - Eu tive a extraordinária boa sorte de ouvir a estória do Maha-Bharat, composta por Ved Vyasa, que instrui sobre dignidade e elevação, como também outros itens importantes da vida humana e gostaria de narrar esta maravilha para vocês.

Ao ouvir estas palavras, os sábios ali presentes, com grande entusiasmo, acercaram-se à sua volta. SUTA então continuou.

 - Ouvi a estória principal do Maha-Bharat, o Bhagavad Gita e os episódios ali contidos, como foi-me revelado por VAISAMPAYANA durante o YAGUIA conduzido pelo rei JANAMEJAYA. Logo em seguida, fiz uma extensa peregrinação a vários locais sagrados e visitei também o campo de batalha KURUKSHETRA, onde ocorreu a grande batalha descrita no épico e agora venho ao encontro de todos vocês.

Ele então procedeu em contar toda a estória do Maha-Bharat para a grande assembléia.

 

 

 

SHRI KRISHNA  AVATAR

O aparecimento de uma expressão da Consciência Cósmica, ou do Ser Supremo como um ser humano, ocorre com todos os da espécime humana, cada um de nós, sem exceção, somos nada mais do que isto. Quando a nossa personalidade vira um veículo de manifestação desta realidade divina, pouco a pouco, mais divina e menos mundana, mais eterna e menos transitória, mais universal e menos limitada, mais feliz e menos incompleta; aí se diz que tal pessoa é um grande Ser, um Mahatma, um sábio, um yogui, um iluminado, mestre, etc. Ainda assim a intensidade de manifestação do Ser Absoluto sempre varia de um para o outro. Quando isto ocorre progressivamente, notamos graus de iluminação no yogui, que se intensifica a cada novo aprimoramento de sua disciplina e esforços.

Entretanto há casos em que a manifestação divina já aparece de maneira muito intensa e amadurecida logo a partir do momento do nascimento, ou até em seu período pré-natal ainda como um feto. Yoguis chamam tal pessoa de BALA-YOGUI, que já nasceu yogui. Há também o caso do aparecimento de uma manifestação, ou melhor nascimento de um aspecto do Ser Divino em pessoa. Não temos que considerar tal “pessoa” como um indivíduo qualquer, ou com valores meramente humanos, por mais que apareçam em circunstâncias humanas. Suas vidas, em tudo, expressam o transcendental e seus nascimentos físicos são de reflexos metafísicos e não uma aventura, romance, ficção ou qualquer conjunto efêmero de eventos. Não são, nem mesmo, heróis ou vencedores de causas nobres, também não são vanguardistas nem lideres políticos, muito menos grandes artistas, adivinhos ou desportistas. Em resumo, não os consideramos de forma efêmera e mundana.

No caso de Shri Krishna, o Guru Yogui do Bhagavad-Gita, temos o aparecimento de um AVATAR de VISHNU, o aspecto do Absoluto que é quem mantém a continuidade da existência até mesmo do próprio Criador, ou Brahma. Na Índia o nascimento de um AVATAR já é conhecido milhares de anos antes de seu aparecimento, o que nos livra felizmente do empecilho do charlatanismo de falsos messias e líderes espirituais enganosos, como ocorre principalmente no ocidente. Cálculos de JYOTISHA e astrologia nos indicam com precisão o aparecimento de AVATARES e BALA-YOGUIS também, em ambos os casos há marcas características nas linhas dos pés e mãos e muitos outros sinais designados nos livros que ensinam JYOTISHA, que não são poucos nem são novidades para o mundo. Shri Krishna é o AVATAR que revela o aparecimento do grau mais intenso de presença e concentração da energia divina do Ser Absoluto. Na minha tradição yogui, temos ao Senhor Shiva como nosso padroeiro e origem dos conhecimentos yoguis, técnicas, sabedoria e aparecimento de nossa tradição. Temos em SHIVA a figura do inigualável yogui, Guru e sábio, à Sua esposa e a Ele. Porém dentre os yoguis, jamais houve um que fosse dotado de uma manifestação mais rica, intensa e variada como o Senhor Krishna, que abraçando uma vida humana e personalidade riquíssima, atuou em todos os aspectos humanos, como nenhum outro homem, yogui, Guru ou Mahatma e ainda assim utilizou-se de todas as circunstâncias para impregná-las da mais soberba graça e sabedoria, amor e elevação. Tudo em Suas mãos se torna um recurso yogui, uma ciência, uma yoga específica e nada se apresenta como um impedimento ou adversidade. É a Luz absorvendo as trevas dos negativismos na nossa realidade humana, tão carente e sofrida por natureza, para todos nós.

Como já citei, há o evento cósmico do momento exato do aparecimento de um AVATAR e a astrologia não o ignora. Sinais propícios entram em comunhão no universo inteiro e em sintonia, a natureza reflete-os com seus encantos que se tornam pura poesia transcendental ao vivo, à cores e multi-dimensional. Galáxias e espaços insondáveis refletem suas magnitudes em constelações, que por sua vez, entram em direta sintonia com estrelas específicas que são especializadas em anunciar tais eventos incomuns, por intermédio de suas aparições visíveis aos olhos humanos. Grandes yoguis vêem tudo isto com seu olho da sabedoria ou o terceiro olho. Planetas participam do ato sublime em posições de gala em relação uns aos outros, os satélites, corpos celestes de todas as formas e magnitudes correspondem. Tal momento cósmico que se pronuncia como o aparecimento do AVATAR, deixa uma marca, uma impressão, um registro benéfico e transcendental para todo o sempre e bem aqui agora em nós mesmos.

Existe um tratado astronômico intitulado KHAMANIKYA, que descreve com precisão de detalhes a dinâmica exata das constelações do momento de manifestação de Shri Krishna. Ocorreu à meia noite, quando a Lua estava no oitavo dia do quarto minguante. O sol transitava no signo de Leão.

Vamos agora mergulhar em um estudo mais frio e racional nesta etapa de descrição e iremos encarar alguns números de razão astronômica.

O conceito AVATAR é algo que molda os alicerces da teologia hindu, bem como, da mitologia yogui. Segundo tal conceito, o Ser Absoluto manifesta-se de forma animal ou humana, representando a evolução da consciência ou do espírito encarnado e não possui qualquer semelhança com a teoria evolucionista de C. Darwin. O propósito desta manifestação, é o de propiciar a continuidade da evolução existencial da vida na Terra, eliminando seus empecilhos quando estes atingem proporções alarmantes. Talvez seja esta a imagem arquetípica que deu origem à fantasia mental que são os super heróis infantis. O aparecimento do AVATAR, nos induz a um estudo do movimento dos corpos celestes e a uma compreensão cósmica por excelência. Quando o Sol surge no ponto oriental do horizonte, move-se para o seu poente e vai-se embora da abóbada celeste, conclui o espaço de tempo de um dia, isto é um movimento dos corpos celestes apenas e mais nada. Este movimento, no entanto, cria a noção de tempo em nossas mentes. Nada mais lógico do que marcar o tempo e momentos específicos, pelos movimentos siderais. Com os estudos apropriados dos astros, os aparecimentos dos AVATARES são determinados com precisão no tocante a local e data.

De acordo ao Bhagwat Purana, Brahma, o Criador, é o efeito do período de criação predominante e da dissolução do universo. Há um período em que o universo se apresenta manifesto e por tempo equivalente, imanifesto. Isto é de pleno acordo ao conceito ocidental atual. Cada período de criação, ou KALPA, é igual a um dia de Brahma e cada tempo de imanifestação ou dissolução, PRALAYA, é o equivalente a uma noite na vida de Brahma.

Em cada Kalpa encontramos mil ciclos constituídos de quatro YUGAS, ou seja idades ou eras, cada um. Cada ciclo de quatro YUGAS é completado em quatro milhões trezentos e vinte mil anos. Os nomes das YUGAS são; SATYA, TRETA, DWAPARA e KALI. Na SATYA-YUGA, onde todas as virtudes humanas possuem força total e os males são desconhecidos, a duração é de um milhão setecentos e vinte e oito mil anos. A duração de TRETA-YUGA é de um milhão duzentos e noventa e seis mil anos e as virtudes humanas já perdem um quarto de sua potencialidade. A DWAPARA-YUGA é de oitocentos e sessenta e quatro mil anos e nela as virtudes são quebradas pela metade. KALI-YUGA dura apenas quatrocentos e trinta e dois mil anos e sobra apenas um quarto da força das virtudes e esta é encontrada no coração e é a força de vontade, o amor divino, bem como as demais qualidades do coração, sobressaindo-se a determinação e sua força. Assim um Kalpa é constituído de quatro mil YUGAS.

Cada Kalpa encontra-se dividido em quatorze MANVANTARAS, ou períodos específicos, cada qual tem a duração de setenta ciclos de quatro YUGAS, o título de MANU é dado a quem preside em cada um dos MANVATARAS. Portanto em cada KALPA, quatorze MANUS aparecem em sucessão, cada um presidindo um MANVANTARA.

Os AVATARES que são considerados mais significativos são dez e denominados DASHAVATAR, ou seja dez AVATARES. Eles iniciam sua manifestção primeiro como um peixe, depois um javali, em seguida vão evoluindo até a forma humana e o próximo já é de corpo humano e cabeça de leão. Daí em diante, os AVATARES são de aspecto humano e nobre no nascimento. Shri Krishna foi o oitavo AVATAR e o Senhor Buddha o nono. Virá ainda o décimo destes mais significativos e terá o nome de KALKI, virá para terminar KALI-YUGA e tomará a forma de um guerreiro, lutará contra os opressores do planeta e da humanidade que serão os governantes, após seu surgimento estaremos na melhor das épocas, SATYA-YUGA.

KALI-YUGA é por um lado a pior das eras, porém é a mais fácil de se conseguir a transcendência, a emancipação espiritual! Portanto, aqui temos em mãos, os ensinamentos e bênçãos de Shri Krishna Maha-Avatar na forma do Bhagavad-Gita.

 

 

 

APRESENTAÇÃO DE OUTRAS TRADUÇÕES
E COMENTÁRIOS DO BHAGAVAD-GITA

O Bhagavad-Gita, como escritura yogui, tradicionalmente é parte do estudo de VEDANTA e de Guiana Yoga. Há duas tradições muito antigas no que se refere ao estudo de VEDANTA, uma é composta do Gitopanishad, outro nome do Bhagavad-Gita, e outros Upanishads, dos quais, além do Gita, dez recebem maior destaque, nesta tradição há ainda um compêndio literário e tradições discipulares de milênios, bem como práticas e técnicas yoguis que lhes são próprias, esta é a tradição que outorga a exposição desta obra aqui presente e portanto, é dentro desta realidade, que serão mencionadas à seguir, outras apresentações do Bhagavad-Gita. Não pretendo fazer recurso do negativismo da arrogância, em determinar que a minha tradição é a única  dona da verdade, não a julgo melhor, pior e nem mesmo igual à nenhuma outra, tal crítica seria uma atitude por demais pequena frente a algo tão grandioso, do qual me posiciono como um mero veículo e como praticante de Yoga, ou um SADHAKA.

A outra tradição que estuda o Bhagavad-Gita e a ciência VEDANTA, não o faz pelos mesmos textos, tradições discipulares, valores e formas e o estudo Vedântico é efetuado pelo vasto compêndio do Shrimad Bhagavatan. Não faz parte desta forma de estudo a escritura tântrica intitulada “SHRIMAD DEVI BHAGAVATAN”.

Um dos motivos da presente tradução do Gita, vem do fato de que nenhuma das que li em português me satisfez para indicar seu estudo à meus alunos, discípulos, seguidores e compatriotas. Durante os muitos anos que vivi junto à meu Guru PARAMHAMSA SATYANANDA, durante a feliz convivência que tive a bênção de ter junto à muitos outros grande yoguis e mestres, estudei várias traduções em muitos idiomas, inclusive assisti a exposições e comentários feitos por autoridades conceituadíssimas. Peregrinei por locais onde o Gita menciona sua passagem, vivi e fiz SADHANA em VRINDAVAN, onde Shri Krishna deixou sua marca mais vívida no Sub-Continente asiático. Transcorridas estas últimas três décadas de estudo prático do Gita, apresento minhas recomendações em breve resumo a seguir:

Em primeiríssimo lugar consiga o seu Gita por indicação de seu instrutor, mestre, Guru ou professor de sua maior consideração, seu coração saberá lhe dizer quem ele é, quando esta chance ocorrer. Na minha opinião, domine antes outros idiomas, primeiro o inglês, este por sua vez é terrível para expressar os textos sânscritos, porém é o mais utilizado e repleto de bons trabalhos já feitos. O idioma português revelou-se um rico veículo de expressão para traduções direta do sânscrito védico, porem é pobre em obras de qualidade; até o momento, pelo menos.

O idioma HINDI (que se pronuncia RÍNDI) é rico em obras e muito expressivo, possui o mesmo alfabeto sânscrito, o DEVANAGARI, como é chamado.

Estes dois idiomas são os que mais aconselho. As vezes, por sorte, podemos encontrar em espanhol boas obras, a editora KYER de Buenos Aires, Argentina; possui respeitosa reputação em publicações vedânticas. Nos USA há uma livraria especializada, é a VEDANTA PRESS da Califórnia, onde não faltam bons trabalhos para o idioma inglês.

Em ingles posso indicar algumas traduções do Gita, como as que aqui se seguem- BHAGAVAD GITA: THE SONG OF GOD, de Swami Prabhavananda...-BHAGAVAD GITA, de Chidbhavananda...- BHAGAVAD GITA, de Sargeant....E principalmente GITABHASYA OF RAMANUJA.

O Bhagavad-Gita Basya é o que tem comentários do mais conceituado sábio indiano do assunto, que viveu a aproximadamente dois mil anos atrás e deu um rumo definitivo ao estudo de Vedanta na Índia, deixando obras Tântricas e Yoguis de valor incomparável. Tradução para o idioma inglês, encontramos uma excelente, elaborada por RAMAKRISHNA MISSION que tem sua sede em  DAKSHINISHUAR, muito próximo a Calcutá, no Estado de Bengal, ali obras em Vedanta se sentem em casa e há várias em inglês, todas excelentes.

Não há como deixar de indicar, ou mencionar sobre a cidade de GORAKPUR, THE GITA PRESS na Índia, que é especializada na publicação do Bhagavad-Gita, na minha simpatia este está em primeiro lugar, é o mais aceito Gita de toda Índia, fazem edições de bolso e publicações em mais de trinta e quatro línguas e bateram o recorde mundial de publicações do Gita.

Há inúmeros trabalhos em inglês e outros idiomas que merecem respeito, apenas citei os mais conhecidos e aprovados pela esmagadora maioria de estudiosos e eruditos. Existem comentários do Gita excelentes e riquíssimos, conhecidos e muitos desconhecidos, alguns até perdidos no curso do tempo e outros que ainda, afortunadamente, hão de vir e quem sabe por este grande Ser que aqui assimila agora esta apresentação.

No Brasil, o Bhagavad-Gita já foi apresentado e comentado diretamente do seu original na década de 80, pelo conhecido e conceituado Shri Swami TILAKJI, por ele em pessoa, Guru indiano que tinha conhecimento dos idiomas português, sânscrito, como muitos outros; yogui querido por nós no Brasil, meu amigo e Guru de muitos brasileiros. Swamiji TILAKJI, obteve MAHASAMADHI  na mesma década na Espanha, ou seja, ali deixou definitivamente o seu corpo. Foi o fundador de JNANA MANDIRAM, ou O Templo da Sabedoria, em Brasília e não sei se seus discípulos gravaram ou mesmo escreveram a apresentação feita pelo próprio em português.

Coloco a seu cargo a continuação deste trecho em buscar e indicar mais outras obras do Gita para todos nós e desde já, de coração, muito obrigado. E ao se lançar no estudo, não perca a objetividade, não nos importa outra coisa senão manter a mente no Ser Sublime, para isto nos ocupamos, sempre e continuamente. Esteja consciente.

 

 

 

CAPÍTULO I

hari om tat sat

A YOGA DO DESALENTO DE ARJUNA.

O Rei Dhratarashtra disse:

1 - Sanjaya, o que fazem os meus filhos e os filhos de Pandu, em assembléia em Kurukshetra; o campo sagrado de batalha? Compelidos a guerra! E Sanjaya, dotado de visão divina, narrava o início da batalha ao rei Dhratarashtra, que era cego e possuía seu exército e reino envolvidos no combate a ter início, responde ao rei:

2 - Neste momento, vendo o exército dos Pandavas em preparo para combate e aproximando-se de Dronacharya, o príncipe Duryodhana falou-lhe com estas palavras:

3 - Contemplo Mestre, o majestoso exército dos filhos de Pandu alinhados para a batalha pelo seu talentoso aluno, Dhrishitadyumna, o filho de Drupada.

4 - Há nesta armada heróis excelentemente armados com seus arcos e de proeza militar igual a de Bhima e Arjuna, tais como Satyaki e Virata bem como o Maharathi (grande carro de guerra) de Drupada;

5 - Dhrishitaketu, Chekitana e o valente rei de Kashi e Purujit, Kuntibhoja e Saibya o melhor dos homens;

6 - E o grande Yudhamanyu, o valente Uttamaya, Abhimanyu; o Filho de Subhadra, os cinco Filhos de Draupadi, todos em Maharathis (grandes carros de guerra).

7 - Oh! melhor dos Brahmans, conheça também quem são os principais combatentes ao nosso lado, os generais de meu exército. Para sua informação, os menciono a seguir:

8 - A sua própria pessoa, Bhisma, Karna e Kripa; que é sempre vitorioso em luta, bem como o são Aswatthama, Vikarna e Bhurishrava; o Filho de Somadatta.

9 - E muitos outros heróis, equipados com vários armamentos e mísseis e que apoiam suas vidas à minha e todos escolados e experientes em assuntos de guerra.

10 - Este nosso exército, completamente protegido por Bhisma, é invencível, enquanto o oponente, guardado de todas as maneiras por Bhima; é fácil de ser derrotado.

11 - Portanto à postos, todos em suas respectivas posições em todas as frentes, protejem Bhisma, em particular, por todos os lados.

12 - O grande e velho homem da raça dos Kauravas, o glorioso tio avô deles; Bhisma, rejubilando Duryodhana, rugiu terrivelmente como um leão e fez soar sua concha (instrumento sonoro equivalente a função do clarim em manobras bélicas).

13 - Logo então, conchas, tambores de diversos tipos e sons, clarinetas, trombetas, repentinamente soaram ao mesmo tempo e o barulho foi tumultuoso.

14 - Então, estabelecido em uma carruagem gloriosa puxada por cavalos brancos o Senhor Krishna e Arjuna soaram suas conchas celestiais.

15 - Shri Krishna soou sua concha denominada Panchajanya; Arjuna, sua concha entitulada Devadatta; ao passo que Bhima, homem de feitos incríveis, soou sua magnífica concha Paundra.

16 - O rei Yudhishthira; Filho de Kunti, soou sua concha Anantavijaya; enquanto Nakula e Sahadeva soaram as deles de nomes Sughosha e Manipush Paka, respectivamente.

17 - E o rei de Kashi, o exímio arqueiro e Shikhandi, o Maharathi (grande carro guerreiro), Dhishitadyumna, Virata e o invencível Satyaki; fizeram o mesmo.

18 - OH senhor da Terra, Drupada, bem como os cinco filhos de Draupadi e o bem armado Abhimanyu; Filho de Subhadra, todos eles soaram com ênfase as suas respectivas conchas.

19 - O terrível som vibrou os corações dos Filhos do rei Dhritarashtra, ecoando pelos céus e  Terra.

20-21 - Agora, Oh senhor da Terra, vendo os seus Filhos alinhados contra ele, enquanto mísseis estavam já prontos para serem lançados; Arjuna, Filho de Pandu, empunhou seu arco e então transmitiu as seguintes palavras para Shri Krishna: Krishna, coloque minha carruagem entre os dois exércitos. - E mantenha-o ali até que eu tenha observado cuidadosamente estes guerreiros preparados para a batalha e tenha visto com quem irei travar o combate.

23 - Examinarei os aliados de Duryodhana, de mente demoníaca, que aqui se encontram em assembléia nesta guerra prontos para a luta!

24-25 - Sanjaya disse: Oh rei, assim atendendo a solicitação de Arjuna, Shri Krishna colocou a magnífica carruagem entre os dois exércitos em frente a Bhisma, Drona e todos os reis e disse: Arjuna, contemple esses Kauravas aqui em assembléia.

26-29 - Agora, estacionado ali, Arjuna viu em ambos os exércitos seus tios e tios avós, tios por parte materna, irmãos e primos, filhos e netos, amigos, sogros e seus bem feitores. Vendo todos estes relacionamentos ali presentes, foi possuído de extrema compaixão e emitiu estas palavras com profunda tristeza. Arjuna disse: Krishna, diante da visão destes entes queridos preparados e aguardando ansiosos o momento de combate, meus membros estremecem, meu queixo cai; decididamente minha chama sapeca e sacode e o cabelo eriçado, está em pé.

30 - O arco Gandiva cai de minhas mãos, minha pele queima em toda parte, com a minha mente perturbada, não consigo nem mesmo ficar em pé.

31 - E, Keshava (Krishna), vejo sinais de mau agouro, não percebo nenhuma vantagem, nem bondade em matar meus entes queridos e familiares em batalha.

32 - Krishna, não estou cobiçando vitória, nem reinado, nem prazeres. Govinda (Krishna), que valor tem para nós o reinado, luxurias ou até mesmo a vida?

33 - 34 - Aqueles pelos quais nós cobiçamos o trono, as luxurias e os prazeres, - professores, tios e até mesmo tios-avôs, tios por parte de mãe, sogros, netos, cunhados e outras relações, estão aqui agrupados e alinhados no campo de batalha apoiados por suas vidas e fortunas.

35 - Krishna, eu não quero matá-los, mesmo que eles possam matar-me, nem que fosse para governar os três mundos (espiritual, físico e mental), quanto mais por essa Terra.

36 - Krishna, que prazer há em liquidar os Filhos do rei Dhritarashtra? Apenas destruição seria o que nos perseguiria como resultado por matar estes desesperados.

37 - Portanto, Krishna, não cabe a nós matar nossos amigos, os Filhos do rei Dhritarashtra. Pois, como nós ficaremos felizes por matar nossos entes queridos?

38-39 - Mesmo que estas pessoas, com as mentes cegas pela cobiça, não percebam o mal da destruição de sua própria raça e o negativismo desencadeado por inimizade pelos amigos, Krishna, nós que podemos ver claramente o dano envolvido em destruir nossa própria família, porque não pensamos em sair deste crime?

40 - Antiquíssimas tradições de família desaparecem com a destruição de uma família e a virtude tendo sido perdida, o mal se instala em toda a família.

41 - Com a preponderância do vício, Krishna, as mulheres da família tornam-se corruptas; com a corrupção das mulheres, Varshneya (Krishna, literalmente - o descendente de Vrishi), decorre a mistura das camadas sociais.

42 - A mistura das diversas camadas sociais destroi a raça causando sua miscigenação e instabilidade sócio-cultural e termina por conduzir toda a raça à sua própria extinção e desalento, ao caos. Desprovidos de suas oferendas de água e arroz, o nome da raça também desaparece.

43 - Em meio a estas destruições todas e miscigenação social, os conhecimentos, tradições seculares e costumes das famílias dos destruidores da raça, se extinguem.

44 - Krishna nós ouvimos que os homens que perderam suas tradições de família se reúnem no inferno por período indefinido de tempo.

45 - Alas! Mesmo sendo possuidores de inteligência, nós voltamos as nossas mentes para cometer tamanho erro, pela cobiça de sentar em um trono e gozar o fato de ter matado todos aqueles que nos são caros.

46 - Seria melhor para mim se os filhos do rei Dhritarashtra, bem armados, me matassem em batalha enquanto eu estivesse desarmado e sem opor resistência.

Sanjaya disse:

47 - Arjuna com a sua mente agitada e abatida por depressão em meio ao campo de batalha, tendo assim falado despojou-se de seu arco e flechas e colocou-se no canto mais escondido de sua carruagem.

Assim, no Upanishad cantado pelo Senhor, a ciência de Brahma (iluminação), a escritura sobre Yoga, o diálogo entre Shri Krishna e Arjuna, termina o seu primeiro capítulo, intitulado “A YOGA DO DESALENTO DE ARJUNA”.

 

OM TAT SAT

Comentário sobre o Capítulo n.t. (nota do tradutor)

Observem a ordem dos capítulos e seu contexto em toda a obra.

O primeiro capítulo, a Yoga do Desespero, é onde inicia a prática de Yoga. Em meio a batalha sagrada da vida com o peso de todo conflito sobre os ombros, em uma verdadeira agonia de guerra.

De acordo a este ponto de ensinamento, Yoga inicia em nossos momentos mais cruciais de desespero e caos mental, depressão e stress.

Note bem que o problema é a mente.

Volto a elucidar que na “Yoga do Desalento” o maior inimigo do homem é o problema de sua própria mente.

O problema é a mente!

Yoga é consciência, iniciamos por conscientizar nosso inimigo, nossos limites antes de superá-los.

Aí começa Yoga e conscientização.

 

 

 

CAPÍTULO II

hari om tat sat

“SANKHYA YOGA, A YOGA DA SABEDORIA”

1 - Shri Krishna então, endereçou as seguintes palavras a Arjuna, que estava dominado pela piedade, com lágrimas nos olhos, agitado e cheio de mágoa.

Shri Bhagavan disse:

2 - Arjuna, como foi que esta loucura tomou conta de sua mente numa hora tão peculiar como esta? Nobres almas não se afetam desta maneira, agindo assim você não conquistará nem o Céu nem a fama.

3 - Não se submeta à covardia Arjuna; você se tornaria doente, livre-se desta timidez insignificante. Oh eliminador de inimigos, levante-se!

Arjuna disse:

4 - Krishna, como posso matar Bhishma e Drona no campo de batalha com flechas? Ambos estão em posição de reverência, Oh destruidor de inimigos.

5 - É preferível viver de esmolas neste mundo, do que matar estes nobres já idosos, pois se os matarmos nós apenas gozaremos de prazeres manchados de sangue, na forma de riqueza e gratificações para os sentidos.

6 - Não sei o que é preferível: Lutar ou não. Nem sei se iremos ganhar ou se eles nos vencerão. Os filhos de Dhrtarashtra estão com as tropas formada contra nós.

7 - Com o meu próprio ser estando corrompido pelos vícios da timidez e minha mente relutante em relação à minha obrigação, eu Lhe pergunto; diga-me qual a melhor opção? Sou seu discípulo. Rogo que me instrua, estou buscando refúgio em ti!

8 - Pois mesmo obtendo-se soberania indisputada, reinado afluente nesta terra e domínio sobre os deuses; não vejo nada que possa levar para longe o pesar que está secando os meus sentidos.

Sanjaia disse:

9 - Oh rei, tendo portanto falado com Shri Krishna, Arjuna novamente disse a Ele: “Não lutarei”! E se silenciou.

10 - Então Oh Dhrtarashtra; Shri Krishna, como que sorrindo, dirigiu as seguintes palavras para Arjuna bem entre os dois exércitos alinhados.

Shri Bhagavan disse:

11 - Arjuna, você se aflige com o que não merece lágrimas e ainda fala como os estudados; os sábios não se entristecem com os mortos nem com os vivos.

12 - Na verdade, nunca houve o tempo em que Eu não existisse ou quando você e estes reis também não. Nem é real o fato de que no futuro deixemos de existir.

13 - Da mesma forma que a infância a juventude e a idade adulta são atribuídas à alma através deste corpo. O homem sábio não se ilude com isto.

14 - Oh filho de Kunti, os contatos entre os sentidos e os objetos de sua experiência, que fazem surgir as sensações de calor e frio, prazer e dor, etc., são transitórios e efêmeros; portanto Arjuna, não os considere como importantes.

15 - Arjuna, os sábios para quem dor e prazer são iguais e não são atormentados por estes contatos, se tornam, desta forma, eleitos para a imortalidade.

16 - O irreal não tem existência e o real nunca deixou de ser, a realidade de ambos tem sido assim percebida pelos que vêem a Verdade.

17 - Saiba que a substância pelo qual tudo isto é ocupado é imperecível; ninguém é capaz de fazer acontecer a destruição desta essência indestrutível.

18 - Todos estes corpos pertencentes ao Ser imperceptível e eterno, diz-se serem perecíveis, portanto Arjuna lute!

19 - São ambos ignorantes; aqueles que acham que o Ser, ou seja, a alma, é capaz de matar, bem como aqueles que a consideram morta; pois na verdade, a alma não morre nem mata.

20 - A alma nunca nasce e não morre, nem passa a ser somente ao vir a existir. Pois nunca nasceu, é eterna, é perpétua e primordial e mesmo que o corpo morra, o Ser não morre.

21 - Arjuna, como irá o homem que sabe que o Ser é imperecível, eterno e livre de nascimento e apodrecimento, causar a morte a alguém, ou mesmo matar alguém?

22 - Da mesma maneira que uma pessoa se livra das roupas usadas e consegue outras novas, a alma em corpo, rejeita os corpos usados e entra em outros novos.

23 - As armas não a podem cortar e nem o fogo queimar. A água não a pode encharcar e nem o vento soprar.

24 - Pois alma é impossível de ser cortada, é a prova de fogo, é impermeável para a água e também não seca. A alma é eterna, onipresente, inalterável, constante e interminável.

25 - Esta alma é imanifesta, inconcebível e é considerada imutável. Portanto, conhecendo-a desta forma, você não deveria ter pesar.

26 - E Arjuna, mesmo se você considerasse a alma sempre nascendo e morrendo constantemente, você não deveria sofrer assim.

27 - Pois neste caso a morte daquele que nasce é certa e o renascimento de quem morre é inevitável. Portanto, não lhe cabe se magoar sobre um evento inevitável.

28 - Arjuna, todos os seres eram imanifestos antes de nascer e se tornarão imanifestos quando morrerem, eles são manifestos apenas em um estágio intermediário, Qual ocasião então, para lamentações?

29 - Quase ninguém percebe esta alma como maravilhosa, poucos, da mesma forma, falam sobre ela como maravilhosa e raros ouvem falar que é maravilhosa; enquanto existem outros que conhecem-na sem nunca terem ouvido falar dela.

30 - Arjuna, esta alma residindo no corpo de todos nunca pode ser morta, por isto não lhe compete se entristecer por nenhum ser existente.

31 - Além disto considerando o seu próprio dever, você não deveria hesitar; pois não há nada mais bem vindo para um homem da classe guerreira do que uma guerra justa.

32 - Arjuna, apenas as pessoas de sorte entre os guerreiros, conseguem uma oportunidade insolicitada para a guerra, que é uma porta aberta para o céu.

33 - Agora, se você não agir em tal guerra honrada e abandonar o seu dever e perder sua reputação, você cairá em erro.

34 - As pessoas despejarão infinitas infâmias sobre você e infâmias sobre um homem com estima popular é pior do que a morte.

35 - E os grandes guerreiros, que o consideravam tanto, agora te desconsiderarão, achando que você desistiu da batalha por medo.

36 - E seus inimigos, disparando o seu poder, falarão muitas palavras indesejáveis e o que pode ser mais angustioso do que isto?

37 - Mesmo morrendo na batalha você atingirá o céu, ou sendo vitorioso gozará de soberania na terra. Arjuna, então levante-se, determinado para lutar!

38 - Tratando da mesma forma o prazer e a dor, ganho ou perda, a vitória e a derrota, prepare-se para a luta; assim lutando não incorrerá em erro.

39 - Arjuna, esta atitude da mente, foi apresentada do ponto de vista de SANKHYA YOGA, a Yoga da sabedoria. Agora ouça o mesmo, apresentado, sob o ponto de vista da Yoga da Ação, KARMA YOGA. Equipado com esta atitude mental, será capaz de se livrar completamente das algemas oriundas do jogo de ações e reações denominado KARMA.

40 - No caminho da ação impessoal de KARMA YOGA, não há perda de esforço e nem há o medo do resultado contrário. Até mesmo pouca prática desta disciplina protege a pessoa de grandes medos.

41 - Arjuna, neste caminho abençoado, o intelecto fica determinado e direcionado para um só propósito, ao passo que a mente do indeciso, do homem ignorante que é movido à custa dos desejos, está dispersado em varias direções e infinitamente diversificada.

42-43-44 - Arjuna, aqueles que estão obssecados pelo desejo e devotos ao último dos vedas, que consideram o céu como o objetivo supremo e argumentam que não há nada além do céu, não são sábios. Eles recitam palavras floreadas, recomendando ações de vários tipos para aquisição de prazeres e prosperidade com renascimento como seu fruto. Aqueles cujas mentes são levadas por estas palavras e que estão profundamente apegados aos prazeres e prosperidade do mundo, não podem atingir uma mente determinada, forte e concentrada no Ser.

45 - Arjuna, os Vedas, assim versam sobre as três Gunas, ou qualidades da natureza e suas evoluções em forma de prazeres mundanos, assim como as formas de aquisição destes prazeres; seja indiferente à estes prazeres e seus meios, se elevando para além dos pares opostos como prazer e dor, etc., estabeleça-se na existência eterna do Ser, absolutamente indiferente aos suprimentos das vontades e da preservação do que já foi adquirido, com a mente totalmente sob controle.

46 - À uma pessoa que já atingiu a iluminação, os Vedas (escrituras antigas versando sabedoria) tem o mesmo uso que um pequeno reservatório de água em um local alagado por todos os lados.

47 - Sob o ponto de vista da YOGA DA AÇÃO, ou Karma Yoga, o seu direito é de apenas agir, trabalhar, mas nunca sobre os frutos gerados. Não deixe os frutos da ação serem o seu objetivo, nem se deixe apegar à inatividade.

48 - Arjuna, faça todas as ações relacionadas ao YOGA abandonando os apegos e indiferente ao sucesso ou o fracasso; equanimidade é  YOGA.

49 - A ação com um propósito egoísta é muito inferior a esta yoga na forma de equanimidade mental. Busque refúgio nesta tranqüilidade da mente Arjuna; pois pobres são aqueles que pretendem o fruto das ações.

50 - Dotado com equanimidade a pessoa experimenta na vida o bem e o mal. Por isto, esforce-se com esta YOGA DA EQUANIMIDADE. A habilidade na ação está em praticar esta YOGA.

51 - Pois o homem sábio, dotado de equanimidade, renunciando o fruto das ações e livre das amarras do nascimento, atinge o supremo estado de contentamento

52 - Quando sua mente atravessar o lamaçal da ilusão, você então crescerá indiferente ao que foi escutado e o que ainda está para se escutar sobre este mundo ou o próximo.

53 - Quando sua mente, confusa por ouvir afirmações conflituosas, permanecer firme e estabelecida em meditação no Ser, você então atingirá união com o Ser.

Arjuna diz:

54 - Krishna, qual é o sinal de uma alma, com compreensão do Ser, de mente estável e estabelecida em Samadhi, ou seja perfeita estabilidade e tranqüilidade mental? Como  um homem de mente estável fala, como ele sente, como anda?

Shri Bhagavan responde:

55 - Arjuna, quando alguém abandona completamente todos os desejos da mente e está satisfeito com a constante experiência do Ser, através do Ser, então é considerado de mente estável.

56 - O sábio cuja mente não se perturba nas tristezas, cuja sede por prazeres desapareceu completamente e que é livre de paixões, medo e ira é considerado de mente estável.

57 - Aquele que é desapegado de tudo, ao se deparar com o bem e o mal nem se regozija e nem se recua; é tido como de mente estável.

58 - Como a tartaruga, que recua e esconde seus membros de todas as direções, desligue os sentidos dos objetos dos sentidos e torne-se de mente estável (alusão à prática de meditação).

59 - Os objetos dos sentidos cessam para quem não se alegra com seus sentidos, mas o sabor por eles persiste. Este gosto também desaparece no caso do homem de mente estável quando ele vê o Supremo.

60 - Turbulento por natureza, os sentidos até mesmo do sábio, que pratica auto disciplina yogui, forçosamente carrega sua mente, Arjuna.

61 - Portanto, havendo controlado todos eles e concentrando sua mente, deve-se sentar para meditar, dedicando seu coração e seu ser para Mim. Pois aquele, cujos sentidos estão controlados, a mente se tornou estável.

62 - O homem habitando os objetos dos sentidos, desenvolve apego por eles; do apego surge o desejo e do desejo não realizado surge o ódio e insatisfação.

63 - Do ódio e insatisfação, aparece a paixão; da paixão, a confusão de memória; da confusão de memória, a perda da razão; e da perda da razão vai-se à ruína completa.

64 - Porém o praticante de auto- disciplina, mesmo desfrutando dos objetos dos sentidos, que estão disciplinados e livres de gostar e rejeitar, atinge tranqüilidade mental.

65 - Ao atingir tal serenidade mental, todas as suas tristezas chegam ao fim e o intelecto de tal pessoa de mente tranqüila, logo se desligando de todos os lados, torna-se firmemente estabelecido no Ser Sublime.

66 - Aquele que não disciplinou sua mente e sentidos, não consegue ter uma razão determinante e a pessoa assim tão indisciplinada não consegue ter fé, ou acreditar no que faz. O homem descrente e inseguro não tem paz e como pode haver paz para uma pessoa que não tem tranqüilidade mental?

67 - Da mesma forma que o vento carrega o barco sobre as águas, assim também os sentidos desgovernados levam a mente que está apegada a eles.

68 - Portanto, Arjuna, aquele cujos sentidos estão completamente disciplinados com relação aos objetos, possui mente estável.

69 - Aquilo que é noite para todos os seres, naquele estado de contentamento supremo e sabedoria divina, o yogui com a consciência do Ser, permanece desperto. E aquilo, que sempre muda, a satisfação mundana transitória, na qual todos os demais se mantém acordados, é noite para os que vêem.

70 - Assim como as águas de diferentes rios vão para o mar, que apesar de cheio por todos os lados permanece inalterado, da mesma forma, aquele em que todas as alegrias desembocam, atinge paz e não aquele que anseia os prazeres.

71 - Ele, que renuncia a todos os prazeres e se move livre de apegos, egoísmos e sede de prazer, atinge a paz.

72 - Arjuna, tal é o estado de um ser com percepção e consciência do Ser, tendo atingido tal estado, ele ultrapassou a ilusão. E estabelecido neste estado, até o último instante, atinge a felicidade estável e perfeita com o contentamento em Brahma.

Assim, no Upanishad, cantado por Krishna, a ciência de Brahma, a escritura sobre yoga, o diálogo entre Guru e discípulo, termina o segundo capítulo intitulado “SANKHYA YOGA, A YOGA DA SABEDORIA”.

 

 

 

CAPÍTULO III:

hari om tat sat

“KARMA YOGA, ou A YOGA DA AÇÃO”

Arjuna perguntou:

1 - Krishna, se o Senhor considera a Sabedoria como sendo superior a Ação, porque então me pede para efetuar algo tão horrível, Keshava (Krishna)?

2 - Suas palavras estão embaraçando minha mente com estes jogos de expressões semelhantes. Portanto diga-me decisivamente aquela única disciplina pela qual o bem mais elevado possa ser obtido. Shri Bhagavan (Krishna) lhe respondeu:

3 - Arjuna, neste mundo foram enunciados por Mim no passado, dois tipos de Sadhana (disciplina espiritual). No caso do Sankhya Yogui, a Sadhana procede-se pelo caminho da Sabedoria, enquanto no caso do Karma yogui, pelo caminho da Ação.

4 - O homem não consegue libertar-se de suas ações (culminação do caminho da Ação) sem efetuar alguma ação, nem mesmo consegue ele conquistar perfeição (culminação do caminho da Sabedoria) por mera renúncia às ações.

5 - Com toda certeza, ninguém consegue permanecer inativo nem mesmo por um momento, todos são inevitavelmente impelidos a agirem por qualidades inerentes à própria natureza.

6 - Aquele que com uma atitude exterior, refreia os órgãos dos sentidos (olfato, paladar, visão, etc.) e das ações (mãos, boca, etc.) e sentando-se para meditar continua mentalmente ativo com os objetos dos sentidos (o que se vê, se toca, se sente, o aroma, etc.), este homem de intelecto diluído é denominado um hipócrita.

7 - Por outro lado, aquele que controlando os órgãos dos sentidos e das ações por meio da mente e permanecendo desapegado (sem deixar que a mente seja profundamente afetada), tomando assim da Yoga da Ação (Karma Yoga) através destes órgãos Arjuna; este yogui ninguém supera.

8 - Portanto, execute a sua tarefa permitida; pois a ação é superior a inatividade. Desistindo da ação, você não poderia nem mesmo manter vivo o corpo.

9 - O homem é aprisionado pelas algemas do Karma (ação e suas reações), apenas quando se entretém com ações que não sejam aqueles trabalhos efetuados com a finalidade de sacrifício (dedicação ao Supremo). Portanto Arjuna, execute eficientemente a sua função livre de apego, com a finalidade única e exclusiva de sacrifício.

10 - Tendo criado a humanidade com o espírito de sacrifício no início da criação, o Criador Brahma disse-lhes: “Multipliquem-se por meio disto (sacrifício) e com isto consigam o regozijo que buscam.

11 - Nutram os deuses por meio disto (sacrifício); e deixem que eles os alimentem. Assim ajudando-se uns aos outros desinteressadamente (com o intuito exclusivo de sacrifício), vocês irão atingir o mais elevado bem.

12 - Nutridos pelo sacrifício os deuses irão sem falta, dar-lhes sem mesmo ter de pedir, todas as regalias e regozijo que desejarem. Aqueles que desfrutam dos presentes divinos recebidos, sem dar nada em retorno, é sem nenhuma sombra de dúvida um ladrão”.

13 - O virtuoso que se nutre das sobras dos sacrifícios, é absolvido de todos os seus negativismos ou sombras. Aquelas pessoas que agem negativamente, que cozinham seus alimentos com o mero intuito de nutrirem os seus corpos, apenas ingerem o negativismo.

14-15 - Todos os seres evoluíram a partir do alimento; a produção de alimento depende da chuva; a chuva é proveniente do sacrifício e sacrifício por sua vez está baseado na ação. Saiba que a ação possui a sua origem nos Vedas e que os Vedas encontram a sua procedência no indestrutível (Essência Primordial); portanto o infinito onipresente está sempre presente nos sacrifícios.

16 - Arjuna, aquele que não segue a roda da criação que assim se encontra em movimento neste mundo (por exemplo, abstendo-se das ações cotidianas), cheio de negativismo e sensualidade este, vive em vão.

17 - Entretanto quem busca seu entretenimento apenas no Ser e sente-se gratificado com o Ser, encontra-se contido e contente no Ser; este não possui outra responsabilidade nem tarefa senão esta.

18 - Neste mundo tal “grande alma” (Maha-Atma; Mahatma) não tem nenhuma utilidade para qualquer coisa que seja feita nem mesmo é útil para qualquer coisa que não tenha sido feita; tampouco possui dependência pessoal de qualquer tipo de criatura.

19 - Portanto sempre com eficiência, execute suas obrigações e tarefas sem apego. Trabalhando sem apego o homem atinge o Supremo.

20 - Foi apenas por meio da ação (sem apego) que Janaka e outros sábios atingiram perfeição. Mantendo sempre um olho voltado para a manutenção da ordem no mundo, você deve recorrer a ação.

21 - Porque seja lá o que for que um grande homem faça, aquela mesma coisa os outros também fazem, seja qual for a situação que ele monte, a generalidade dos homens a seguem.

22 - Arjuna, não há nada nos três mundos para Mim que ainda esteja por ser feito nem mesmo há algo que valha a pena ser atingido ou que seja inatingível por Mim mas mesmo assim continuo a trabalhar.

23 - Em qualquer momento se Eu despreocupadamente parasse de agir, grande mal sobrecairia sobre o mundo porque Arjuna, os seres humanos seguem o Meu caminho em todas as matérias.

24 - Se Eu não efetuar nenhuma ação, estes mundos irão desaparecer ai então Eu serei o autor da confusão entre todas as classes sociais e o destruidor de todas estas pessoas.

25 - Arjuna, da mesma maneira que age o ignorante com apego, desta mesma forma deve atuar o sábio, buscando a manutenção da ordem no mundo; entretanto com desapego.

26 - Um sábio estabelecido em mim, não deve confundir a mente dos ignorantes que são apegados às ações, mas deve inspirá-los a efetuarem todas as suas obrigações através de exemplo próprio.

27 - Todas as ações são levadas a cabo por meio das oscilações e modos da Natureza (Prakriti, Matéria Primordial). O ignorante cuja mente encontra-se desintegrada pelo egoísmo, considera a si próprio como sendo o agente das ações.

28 - Entretanto, aquele que conhece a realidade das respectivas esferas das Gunas (os modos de prakriti, a Natureza) e das ações, sustentando a percepção de que são as Gunas (na forma dos sentidos, da mente, etc.) que movem entre as Gunas (objetos de percepção dos sentidos), não se afeta nem se apega a elas Arjuna.

29 - Aqueles que estão completamente diluídos pelas Gunas (modalidades) de Prakriti, permanecem apegados e afetados àquelas Gunas e ações; o homem de sabedoria perfeita não deve perturbar a mente daqueles pobres coitados de sabedoria insuficiente.

30 - Portanto, dedicando todas as ações para Mim, com a sua mente fixa em Mim, o Ser de todos os que são, foram e virão a ser, livre de qualquer expectativa e do sentimento de posse e curado de sua febre mental, lute!

31 - Até mesmo aqueles que com uma mente devotada e sem objeções frívolas, sempre seguem esta Minha doutrina, se libertam dos efeitos aprisionantes de todas as ações.

32 - Por outro lado, aqueles que encontram falhas com esta Minha doutrina e não a seguem, conheça-os como sendo destituídos em matéria de sabedoria, sem sentido e perdidos.

33 - Todos os seres seguem a sua natureza; até mesmo o sábio se comporta de acordo à sua própria natureza. No que poderia ajudar as restrições?

34 - Atração e repulsão encontram-se em todos os objetos percebidos pelos sentidos. O homem não deve nunca permanecer neste domínio, porque eles são os principais bloqueios no caminho que trilha.

35 - As obrigações próprias de cada um, mesmo que sejam sem mérito algum, são mais satisfatórias do que as obrigações de terceiros bem executadas. Mesmo a morte alcançada no transcorrer de realizações das obrigações respectivas de cada qual, traz bênçãos. Entretanto executar a ação de outros é temeroso.

36 - Arjuna indagou: Agora Krishna, o que impele um homem ao erro, mesmo que seja involuntariamente, como se tivesse sido tomado por alguma força?

37 - Shri Bhagavan (Shri Krishna) esclareceu: É o desejo, é um páreo duro, proveniente do elemento de Rajas, insaciável e que é atraído por coisas rudimentares; conheça-o como sendo o inimigo neste caso.

38 - Assim como as chamas do Fogo encontram-se envolvidas pela fumaça, o espelho pela poeira e o embrião pelo líquido aminiótico, da mesma maneira a Sabedoria é envolvida pelo desejo.

39 - Assim Arjuna, a Sabedoria encontra-se coberta por este eterno inimigo do sábio; o Fogo insaciável na Forma de desejo.

40 - Os sentidos (olfato, paladar, visão, tato e audição), a mente e o intelecto, possuem a reputação de ser a pousada deste inimigo; por meio deles envolve-se e oculta-se a Sabedoria, ao mesmo tempo em que dilui nisto o espírito presente no corpo.

41 - Por isto Arjuna, primeiro controlando os sentidos, elimine este enfraquecido desejo que obscurece Guiana (Sabedoria do Absoluto Imanifesto ou Brahma) e Viguiana (Sabedoria do Absoluto como Divindade manifesta).

42 - Os sentidos são tidos como mais poderosos e elevados do que o corpo; mas mais forte e mais elevado ainda do que os sentidos é a mente. Mais poderoso do que a mente é o intelecto e mais elevado e poderoso do que o intelecto é o Ser, como pura consciência e existência.

43 - Assim Arjuna, conhecendo aquilo que é mais elevado do que o intelecto e subjugando a mente pela razão (ação do intelecto), elimine este inimigo na forma de Desejo, o qual é duro de ser ultrapassado.

 

 

  Desta maneira, no Upanishad cantado pelo Senhor, que é a ciência de Brahma, a escritura sobre Yoga, o diálogo ente o Senhor Krishna e Arjuna, finaliza o terceiro capítulo intitulado “KARMA-YOGA, OU A YOGA DA AÇÃO”.

 

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